10/06/09

Um dia triste


O 10 de Junho é um dia triste, civicamente triste. Não é como o "4th of July" dos americanos ou o "14 Juillet" dos franceses. Os dias de festa cívica são sempre tristes em Portugal. Mesmo o 25 de Abril caminha para lá. Dentro de alguns anos, quando murchar a descida da Avenida da Liberdade e mais uma ou outra manifestação do género, o 25 de Abril não será mais do que uma cerimónia onde o poder se comemora a si mesmo. Em parte, já é assim.

Vejamos os nosso feriados cívicos, para além do 25 de Abril. O 1.º de Dezembro, o 5 de Outubro, o 10 de Junho, todos eles pertencem à casta política, estão longe de estar enraizados no coração do povo. Este é o retrato efectivo da relação cívica que existe em Portugal. Os portugueses não sentem nenhum impulso especial para comemorar o laço de cidadania que os une. Por que razão?

Talvez sejamos um povo demasiado antigo e com uma longa história, estamos de tal modo habituados à nossa portugalidade que nem vale a pena comemorá-la. Ela é um dado inquestionável. Esta é uma explicação pertinente. Mas isso também seria válido para os franceses. Eles encontraram, porém, no 14 Juillet um dia de festa da nação francesa, um dia que é o da liberdade mas também um dia de afirmação da cidadania francesa.

Há talvez outra explicação, uma explicação menos cordata. Apesar de cerca de 9 séculos de história, Portugal não deixa de ser sentido pelos portugueses, ainda que de forma inconsciente e subterrânea, como qualquer coisa artificial. A criação de Portugal não tem a sua génese num povo português que lutou para ter um Estado e ser um reino independente. Portugal nasceu do desejo de uma elite política que queria um reino, um Estado e um povo para dirigir. O povo português foi uma criação do Estado português e não o contrário. Esta tese explica bem por que motivo as nossas festas cívicas não são populares, mas uma forma da elite política se comemorar e reconhecer a si mesma. Por isso, o povo fica de fora. Por isso, todas as nossas festas cívicas são tristes. Por isso, 0 10 de Junho é um dia triste, civicamente falando, um dia em que o Presidente da República condecora alguns cidadãos "ilustres" e fala para os partidos políticos, fingindo que fala para o povo. Mas não fala. Ninguém quer saber. Ninguém se emociona com Camões, com a Pátria com as comunidades portuguesas, com os cidadão "ilustres" ou com o Presidente da República.

1 comentário:

José Ricardo Costa disse...

"A criação de Portugal não tem a sua génese num povo português que lutou para ter um Estado e ser um reino independente. Portugal nasceu do desejo de uma elite política que queria um reino, um Estado e um povo para dirigir. O povo português foi uma criação do Estado português e não o contrário."

Bem, daqui ao iberismo vai um passo. Não tivesse sido essa elite política e hoje seríamos naturalmente espanhóis embora culturalmente lusitanos, como há os culturalmente galegos, catalães e andaluzes. O mundo passava bem sem as linhas do rectângulo.

Já agora, entre Cervantes e Camões, continuo a preferir o primeiro.

JR