27/06/09

Metamorfoses XLVI

Giacinto Scelsi – Hymnos

tinha as vazias mãos suspensas
e cantava voz dorida e rouca um salmo
a fé perdera-se às primeiras metáforas
e durante muito tempo baixara a cabeça

a vergonha uma flor imperiosa
desenhara na fronte uma cruz de saliva
e sob o seu peso a cabeça pendia
cobrindo o leve estertor do peito

que destino poderia dar às frases
que da garganta irrompiam
traçavam nos lábios um relâmpago
e estrondeavam pelas ruas desertas

encolhia os ombros sem desejo de saber
e à memória chegavam tormentos passados
o granizo contra a janela
a noite desfeita pelo uivo da madrugada

então cantava no desconsolo do rio
ou no incêndio que consome a vida
desfaz em cinza a candeia da carne
e purifica cada palavra que da boca cai

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