31/01/08

Papel que se rasga - 3. O acto branco

O acto branco,
a chaga lívida,
o papel que se rasga,
se o suor semeia
argila em teu rosto.

Se fosses de sal,
acender-te-ia uma vela
para iluminar o musgo
que te cobre a mão.

Mas olho-te e apenas
vejo a madeira de onde
arranco as tábuas
para cobrir de negro
o negro coração.

[JCM. Papel que se rasga. 1978]

As bastonadas do bastonário

Marinho Pinto não agrada a uma certa casta de advogados, gente moderada e discreta, batida nas manhas que apodrecem a democracia em Portugal. Ele veio para agitar as águas. O problema é que as forças que se movem no silêncio, aqueles a quem ele putativamente acusa, estão há muito instaladas onde interessa, isto é, onde podem controlar os estragos. Não é gente que brinque em serviço. No entanto, Marinho Pinto está a dar uma oportunidade à democracia portuguesa. Há no país sentimentos muito desagradáveis relativamente ao regime e não tardará que se comece a pedir pão e cacete. O melhor seria ficar pelo bastão que Marinho Pinto ergue. Que as bastonadas desencadeiem uma acção de limpeza.

A decapitação

Na entrevista de hoje, Marinho Pinto fala na relação do processo Casa Pia com a decapitação da direcção socialista de Ferro Rodrigues. Imaginemos que é verdade, imaginemos que o aparelho de justiça foi usado para um golpe político. Quem tinha a ganhar com o caso? O problema é que havia muita gente que poderia perder alguma coisa com Ferro Rodrigues à frente do partido e, posteriormente, do país. Seja como for, a decapitação foi altamente rentável.

A maçã dos polifenóis

Cá para mim só quero maçãs Bravo Esmolfe. Em Lisboa chamam-lhe pêro, mas está-se mesmo a ver que aquilo são maçãs e não me convencem do contrário. E se não for essa, que seja a Malápio Fino ou a Malápio da Serra, ou mesmo a Pêro Pipo. Dizem que têm muita fibra e polifenóis, adoro polifenóis, que nunca mais acabam e, como se sabe, fibras e polifenóis previnem o cancro e as doenças cardiovasculares. Não há nada como as maçãs da Beira, segundo um estudo científico (ver Lusa). Gosto quase tanto de estudos científicos como de polifenóis. Só espero que a cereja do Fundão e a melancia da Covilhã e o vinho do Dão também tenham muitos polifenóis e muitos estudos científicos. Também subscreveria uma petição para determinar a quantidade de fibra, de polifenóis e de estudos científicos da laranja do Pafarrão, que não é da Beira, mas daqui ao pé de casa e é das melhores que há. Não se lhe poderia chamar laranja Bravo Esmolfe ou mesmo laranja Pêro Pipo?

Sobre o espírito liberal

O comércio é talvez a actividade que fundamenta o espírito liberal europeu. Antes da emergência da indústria moderna, são os mercadores que lançam o alicerce onde a ideologia liberal ganhou fundamento. Mas o prestígio da actividade é, na história do Ocidente, muito recente. Se se olhar para o espelho da religião, descobre-se, com facilidade, a raiz do velho espírito antiburguês e antiliberal ocidental.

Quem não conhece a história dos vendilhões do templo corridos a chicote por Cristo. Mas este espírito não sopra apenas da vertente judaico-cristã da nossa cultura. Também da vertente greco-latina sopra um espírito pouco simpático para o comércio. Hermes, Mercúrio na versão romana, era ao mesmo tempo o deus do mercado, protector dos comerciantes e dos ladrões. Nada destas coisas acontecem por acaso e são reveladores de um determinado espírito.

O que eu acho mais curioso é certa combinação, numa mesma individualidade, de um espírito liberal e de um espírito tradicionalista, como se ambas as coisas se pudessem casar. Se se atentar na blogosfera nacional, descobrimos um exército dedicado de liberais, a maior parte tradicionalistas e monárquicos, sempre prontos a denunciar o espírito antiliberal dos que vivem ajoujados à ideologia do socialismo. Eu que não vivo tal ajoujamento, fico espantado com tão grande limitação do conhecimento histórico.

As ideologias socialistas (falo no plural, pois elas são múltiplas) são apenas a espuma de uma atitude histórica muito anterior ao nascimento do liberalismo e do socialismo. Essa atitude é inerente aos fundamentos da nossa cultura e liga-se a uma crítica cerrada ao espírito burguês. Esta crítica pode ter uma origem aristocrática, ou sacerdotal, ou proletária, mas o motivo é sempre o mesmo: o egoísmo que superintende à mentalidade liberal-burguesa. O conflito centra-se entre um ideal de serviço (presente no 1.º, 2.º e 4.º estados) e o pragmatismo egoísta do 3.º estado.

Os liberais sofrem de um défice de compreensão histórica. A ideia de tábua-rasa, aplicada por John Locke à natureza da mente antes da experiência sensível nela inscrever as ideias, acabou por contaminar o espírito liberal. Faz-se tábua rasa de todo o passado histórico, como se o homem tivesse nascido com o Iluminismo. Não nasceu. Quando damos demasiada ênfase aos acontecimentos de momento, ficamos incapazes de perceber a raiz de muitas atitudes e a sabedoria que nelas se esconde.

Reforma, a palavra mágica

Agora que o ministro Correia de Campos foi demitido, apareceu um coro de gente compungida pela partida de um ministro tão reformador. Há palavras que se tornaram mágicas. Por exemplo, modernizar. Quando uma palavra se torna mágica ninguém pensa naquilo que ela designa, mas no efeito que ela produz ao ser pronunciada. A palavra reforma é, também, uma palavra mágica. Não sou contra o facto de se fazerem reformas. Mas sempre que uma reforma está em curso ou em vias de acontecer, há duas perguntas que se devem fazer. Reformar para quê? Eu, como professor, tenho assistido a imensas reformas na educação, nem calculam. Para que serviram, incluindo a actual? Para aumentar a confusão no sistema e piorar o serviço prestado pela escola. Não vale a pena ter ministros cheios de hormonas reformistas, se a coisa reformada fica substancialmente pior.

Mas esta pergunta ainda provém de um estrato mental onde prepondera a inocência. Há uma segunda pergunta fundamental: as reformas servem a quem? Por que uma reforma não serve a todos ao mesmo tempo. Há quem ganhe e há quem perca. E muitas vezes certas reformas, cujos resultados são maus para muita gente, servem a alguns. É por isso, para mascarar a injustiça que a reforma introduz, que se tornou a palavra reforma numa palavra mágica. Pronuncia-se «reforma» e «reformista» como se isso fosse sinónimo de «bem» e de «acção boa». Não é.

Um sol ardente

Um sol ardente cai sobre o mundo, dissipa sombras, elimina os restos que a noite esqueceu na dobra da madrugada. Iluminados, os homens caminham para o seu destino como se o tivessem. Bom dia.

Cicatrizes I

30/01/08

Papel que se rasga - 2. Na demorada trégua do leito

Na demorada trégua do leito,
tudo se abre à transparência:
a lava fugaz do desejo,
as pardas manhãs de domingo,
a matéria tão escura da morte.

Sobre o linho do lençol,
há uma mancha de água.
Ao abrir-se, vêm estrelas,
a erva rasa do corpo
e um anúncio de deuses,
ali mesmo, na demorada
trégua onde me deito.

[JCM. Papel que se rasga. 1978]

As comemorações do regicídio

Portugal tem muito pouco que discutir, prova de que não existem problemas. O que move corações é esse real problema das comemorações do regicídio e a presença do exército da República nessas celebrações fomentadas por monárquicos saudosos de curvar a espinha perante S. Majestade. O regicídio é uma data que não merece qualquer tipo de comemoração oficial e que a República portuguesa está impossibilitada de decretar data de luto nacional. Todos os regimes políticos têm um pecado original. O da República é o assassinato de D. Carlos. Mas a monarquia nacional começa também com um crime de sublevação contra o legítimo detentor do poder, dir-se-ia um crime de traição, e uma revolta contra o poder materno, aliás como a dinastia dos Braganças. Isto não torna os regimes menos legítimos. Muitas vezes o crime é motivo de orgulho nacional, pois é nele, no sangue que corre, que a comunidade se funda. Na origem do poder está sempre presente o crime. É da natureza da coisa.

É também despropositada a tentativa de branquear a imagem política de D. Carlos, um manobrador nato, e a natureza do regime, supostamente liberal, instituído em 1834. D. Carlos é uma personalidade, do ponto de vista humano, bastante simpática. Mas o incensado regime liberal monárquico – veja-se o artigo de Rui Ramos no Público, de hoje – não passa de uma trama de arranjos e cunhas, de tráfico de influências, de manipulação grosseira de eleições e de manipulação não menos grosseira das instituições por parte do Rei e dos chefes políticos, cada um procurando sobreviver, no meio de um país pobre e paralítico. O assassinato dos dois Braganças foi um crime hediondo, como o seria de outros chefes políticos. Mas isso não faz de D. Carlos um dos grandes da história de Portugal e não obriga as instituições da República a autoflagelarem-se e a servirem de suporte à causa monárquica. Basta um silêncio respeitoso.

Selecção de alunos na escola pública

Como se pode enviesar a realidade através da ciência ou da pseudociência? Quer um exemplo? Os chamados estudos sobre a selecção de alunos nas escolas públicas, da autoria de dois sociólogos do ISCTE (ver no Público). É um facto que há escolas que fazem selecção de alunos. Quem não conhece um caso perto de si? Também é verdade que, em muitas escolas, as turmas acabam por se dividir segundo critérios que espelham a estrutura social. No entanto, a causa real não está na questão social. O problema é outro.

Imagine o leitor que é pai de um filho aplicado que quer estudar. Imagine, ainda, que esse seu filho tem múltiplos colegas de turma que, como ele, querem estudar. Imagine, mais uma vez, que caem dentro da turma quatro ou cinco alunos que não partilham os interesses académicos dos restantes colegas e têm por actividade preferida boicotar sistematicamente as aulas, impedir que se trabalhe, criar uma situação de indisciplina generalizada. Pode crer que não são precisos mais de três a quatro alunos para o conseguir.

Imagine ainda, o leitor, que não pertence às classes médias e altas, mas que vive do seu trabalho por conta de outrem, com sacrifício. O que é que pretende para o seu filho? Que ele esteja integrado numa turma onde possa trabalhar ou que todas as turmas sejam uma mistura entre alunos que querem trabalhar e alunos que preferem boicotar as aulas? É este o problema.

Estes estudos têm uma finalidade política interessante: legitimam mudanças na lei. Mas não percamos a capacidade de imaginar e pensemos na seguinte situação: todas as turmas das escolas públicas passam a ser uma mistura entre alunos que querem trabalhar e alunos que querem boicotar as aulas. Acabou qualquer tipo de selecção. O que é que acontece? Os pais com dinheiro pegam nos seus filhos e colocam-nos onde não há misturas. Mas os pais que não têm dinheiro e cujos filhos querem trabalhar levam-nos para onde?

Veja-se como, em nome da igualdade, se destrói a escola pública, se protege as elites económicas e se aniquila a vida a milhares de alunos que querem estudar, mas não podem ir para o ensino particular, e têm de suportar os comportamentos mais nefastos dos colegas. É isto que vai suceder na escola pública portuguesa, como aconteceu nos outros lados. Aliás é isso que já sucede muitas vezes. O que me impressiona é que, neste admirável mundo novo projectado pelo sociologês, ninguém cora de vergonha.

Uma bola de fogo

Uma bola de fogo no céu. O divino astro rompe a ténue cortina de nuvens e ergue-se, orgulhoso de tanta luz, sobre nós, como se a escuridão que nos envolve pudesse, por instantes, ser suspensa. Bom dia.

Igreja da Santíssima Trindade - XXIII

29/01/08

Papel que se rasga - 1. Principia a noite

Principia a noite
sobre um rumor
de gente pelas vielas
e quando a luz se vai
tece-se na desvalida
memória um combate
de palavras sussurradas,
uma falésia de sílabas
que pelos lábios cai.

Frágil jogo
sob a chuva que vem
e na ondulação
traz uma dádiva,
as mãos abertas,
os lábios gretados,
as silvas que a tarde secou.

Um fruto solta-se da terra
e anoitece ao cair da tua
para a minha boca.

[JCM. Papel que se rasga. 1978]

De Marquesa de Alorna a Papel que se rasga

Depois de duas semanas com uma poetisa do século XVIII, a Marquesa de Alorna, os próximos 10 dias são dedicados ao ciclo «Papel que se rasga». Estes textos provém do longínquo ano de 1978 e foram ficando a amadurecer, correcção aqui, correcção ali. De certa forma, como quase todos os textos que vou apresentando, são palimpsestos, possuem várias camadas de escrita, na tentativa fútil de os salvar. O blogue serve como escoadouro das águas pluviais...

Wim Mertens - Struggle for pleasure

O ministro mais insuportável

Qual o ministro que menos suporto? Não se pense que é a senhora da Educação. Não é. Não se pense que sãos os truões políticos do governo, gente como Mário Lino ou Manuel Pinho, não são. O ministro cuja figura é para mim absolutamente insuportável é o da Justiça, Alberto Costa. É como se o asco estético me revelasse uma verdade política.

A remodelação

Sócrates remodelou de forma rápida. Livrou-se de uma ministra politicamente destrambelhada de uma pasta irrelevante e do ministro da saúde. O clamor popular, neste caso, era já tão alto que havia que encontrar um tampão para os próximos meses. Interessante é também quem ficou. Será que o destrambelhamento político do ministro da economia é muito diferente do da sua colega da cultura? Não, mas... E qual o significado da manutenção da gente que tutela a educação? Que, apesar da péssima imagem da ministra, a destruição da profissão docente vai continuar. O sangue ainda não chega. A escola pública ainda ensina alguma coisa e é preciso assegurar que ela não faça qualquer tipo de sombra aos colégios privados.

Uma leve neblina

Uma leve neblina desce dos céus e cobre as ruas com a sua seda húmida e translúcida. No horizonte, porém, anuncia-se o sol que a tudo dissipará. Bom dia.

Igreja da Santíssima Trindade - XXII

28/01/08

Marquesa de Alorna - XIV "Bem como se perturba a clara fonte"

Bem como se perturba a clara fonte
Na agitação contínua da corrente,
A minha alma sossego não consente,
Por mais que nos meus ais ânsias desconte.

De cuidado em cuidado, monte em monte
Me leva este pesar que o peito sente;
Sempre diviso aflita, descontente,
Os princípios da luz pelo horizonte.

De que vem este mal? Um mal tão claro
Vem de um vago sentir que na alma pesa…
Amor! Serás comigo sempre avaro?

Amor em mim é filho da tristeza!
Eu sinto o coração ao desamparo…!
Pune, oh Deus, pelas leis da natureza!

Uma triste miséria - II

Ainda a reportagem da SIC sobre os novos emigrantes portugueses. Um deles, um rapaz de vinte e poucos anos, abandonou a escola aos 14 anos, antes de ter completado o 8.º anos. Está arrependido? Não, pelo contrário. A namorada licenciada em Contabilidade e Gestão está a servir à mesa num restaurante, aliás como muitos conhecidos dele com cursos vocacionados para a docência. Esta é a verdade sobre o papel da educação em Portugal e não as elucubrações do engenheiro Sócrates e dessas personagens que dão pelo nome de Maria de Lurdes Rodrigues ou Valter Lemos. As poucas palavras daquele rapaz explicam mais e melhor as razões do insucesso escolar do que tudo o que venha das gentes da 5 de Outubro. As pessoas não são parvas. Uma triste miséria.

Uma triste miséria - I

Reportagem na SIC sobre a nova emigração portuguesa. Agora é a construção civil espanhola, que segundo dizem está em crise, a absorver a mão-de-obra portuguesa. Para quem ainda tivesse ilusões, a realidade aí está para mostrar que o problema não é de regime político. Os portugueses emigraram na Monarquia, na República, no Estado Novo. Os portugueses emigram no regime democrático. Um dos emigrantes, que ganha mais do dobro do que ganharia em Portugal, explica por que motivo os trabalhadores são muito mais rentáveis lá do que cá: as condições de trabalho proporcionados pelas empresas. Portugal é um destino funesto para os portugueses: a pobreza apegou-se a pele e não há detergente que a lave. Uma triste miséria.

Alastra o sol

Alastra o sol pela manhã, alastra como se fosse uma epidemia, uma dor contagiosa que a tudo toca, aos homens, às coisas, às árvores, a quem dá e depois rouba o império da sombra. Bom dia.

Igreja da Santíssima Trindade - XXI

27/01/08

Marquesa de Alorna - XIII "Retratar a tristeza em vão procura"

Retratar a tristeza em vão procura
Quem na vida um só pesar não sente,
Porque sempre vestígios de contente
Hão-de apar’cer por baixo da pintura.

Porém eu, infeliz, que a desventura
O mínimo prazer me não consente,
Em dizendo o que sinto, a mim somente
Parece que compete esta figura.

Sinto o bárbaro efeito das mudanças,
Dos pesares o mais cruel pesar,
Sinto do que perdi tristes lembranças;

Condenam-me a chorar e a não chorar,
Sinto a perda total das esperanças,
E sinto-me morrer sem acabar.

Índia, a maior democracia do mundo

Acabei de ver, na RTP 2, o último episódio da série da BBC, A História da Índia, escrita e apresentada por Michael Wood. Vi diversos episódios, sempre com bastante interesse. Este olhar permitiu-me perceber uma Índia já muito longe dos estereótipos ocidentais. A Índia ensimesmada na contemplação, a Índia cujo vigor dionisíaco teria conduzido à inanidade búdica, na perspectiva do Nietzsche de a Origem da Tragédia, é agora uma nação pujante demográfica, social, económica e politicamente. Mas tudo é feito sem abjurar a sua tradição profunda, sem perder a riqueza do hinduísmo e do budismo. Isto, mais uma vez, leva-me a reflectir sobre a relação entre a religião e a política. Não é apenas o cristianismo que contém germes que permitem construir sociedades democráticas. A Índia é a maior democracia do mundo. É-o não apenas devido à colonização inglesa, mas à própria cultura indiana que, apesar de ser uma cultura fundada sobre o regime de castas, encontrou nos ensinamentos das suas religiões a força simbólica suficiente para construir uma sociedade política plural. Veja-se o naufrágio do vizinho Paquistão, também ele parte integrante da Índia enquanto colónia inglesa. O que fez com que Índia e Paquistão tivessem seguido caminhos tão diferentes? A cultura, a dimensão simbólica, a natureza da religião. Enquanto o Islão não encontrar ou reforçar a dimensão da benevolência, ele será um problema para o mundo, mas também para os muçulmanos.

Sobre o plágio nas escolas - 2

Esta história do plágio nas escolas (ver comentário mais abaixo) não é de agora. Ela é vista, há muito, como coisa sem importância, senão mesmo natural. Tinha começado a dar aulas há pouco tempo, ainda não havia Internet, Wikipedia e Google, e, numa conversa com uma pessoa com formação superior, de uma honestidade pessoal isenta de mancha, uma pessoa a quem, durante toda a sua vida, associei a virtude da probidade, ouvi com surpresa a seguinte história: «Não percebo, dizia ela, como é que o professor de filosofia da minha filha lhe deu uma nota tão baixa num trabalho sobre Giordano Bruno. Ela tirou-o todo da enciclopédia, o tipo – o professor – deve achar que sabe mais do que o autor.» Nem é preciso comentar. O problema é antigo e é uma das vertentes da cultura escolar dos alunos portugueses que mais atenção deveria merecer.

Plágio ou «copianço» no ensino português

No Público, de hoje, há um artigo interessante sobre o plágio com recurso à Internet. Este fenómeno é bem conhecido por quem é professor. Do artigo ressalta, claramente, o perigo que isso representa para a formação dos alunos. Mas o que me deixa perplexo são frases como as seguintes: «Mas as crianças não fazem por mal, salvaguardam as docentes. "Eles nem sabem o significado de plágio", diz Vitória de Sousa. "Não há noção dos direitos de autor ou que se estão a apropriar dos trabalhos de outros", acrescenta Pedro Rosário, do Departamento de Psicologia da Universidade do Minho.» Ou como estas: «Mesmo os alunos do secundário não têm noção de que plagiam, aponta Jorge Baptista, de Biologia.»

De facto, os alunos não dominam o conceito de plágio, nem a legislação referente aos direitos de autor. Mas este, sendo um problema, não é o primeiro nem o fundamental. Os alunos sabem que não fazem o trabalho, sabem que copiam, sabem que estão a fazer batota. Não há aluno nenhum, mesmo do ensino básico, que não saiba que está a fazer mal. Esta retórica reflecte já a cultura absurda que foi introduzida na formação de professores. O problema é que nas escolas portuguesas a fraude escolar (copiar nos testes, copiar os trabalhos dos outros, etc.) deixou de interessar a quem quer que seja. O plágio ou a cópia para obter nota faz parte da cultura dos alunos. A posição dos professores universitários é de facto muito mais sensata. Como um deles disse, o castigo deste tipo de atitude deveria ser desproporcionado, para que o comportamento fosse banido do ensino. Mas quem, nas escolas e no Ministério da Educação, percebe isso?

Coimbra e o seu “A Taberna”

Ontem, uma viagem a Coimbra. Não para visitar isto ou aquilo, mas para passear, pela manhã, na baixa, ver o movimento, sentar-me numa esplanada, passar pela feira de velharias, a céu aberto, comer um bolo na Briosa, ver as livrarias, comprar música na Almedina ou olhar as águas do Mondego. Já não o fazia há muito, mas desta vez senti um prazer especial ao perder-me pelas pequenas ruas, percorrer os becos (como está tudo tão arranjado!), respirar o ar de um Portugal que já é muito diferente deste daqui. Mesmo numa cidade universitária, a severidade das gentes é muito maior do que aqui em baixo. Será porque, por aqui, somos mouros, como ouvi alguém dizer na feira de velharias? Tenho um sentimento duplo perante a cidade. Por um lado, como estudei em Lisboa, sinto o mundo universitário de Coimbra como estranho, provinciano e acanhado; por outro, gosto imenso da cidade, da forma como se organiza, das gentes com que me cruzo na rua. E gosto de tal forma que, de cidade provinciana que o meu preconceito me segreda, a vejo transformada numa espécie de cidade estrangeira, talvez uma cidade do norte de Espanha ou do sul de França. A cidade está belíssima.

Para completar o prazer, a visita obrigatória a “A Taberna” (Rua dos Combatentes da Grande Guerra – 86). Desde o pão às sobremesas, tudo é de excelente qualidade. Tem um serviço eficiente, simpático e discreto, a cozinha está à vista, o forno de lenha é um verdadeiro trunfo. Sempre que por lá passei senti-me compensado. Ontem, não foi excepção. São múltiplos os pratos da cozinha tradicional (ontem, optei por uma excelente posta de Trás-os-Montes, na brasa), por norma servidos com uma multiplicidade de acompanhamentos, apresentados individualmente, batata a murro, batatinha assada, pimentos e cebolinha assadas, grelos e arroz, tudo de excelente qualidade. Para mais informação ver, por exemplo, aqui. E assim fica uma pessoa ainda mais reconfortada com a cidade de Coimbra.

Continuam os dias de sol

Continuam os dias de sol, as manhãs brilham como as águas puras de um rio ou o polido espelho em que a luz se revê. Bom dia.

Igreja da Santíssima Trindade - XX

26/01/08

Marquesa de Alorna - XII "Bem pode sobre o cândido Oriente"

Bem pode sobre o cândido Oriente
Soltar Febo os cabelos douradores,
Que quem vive como eu, vê sempre as flores
Tintas da negra cor do mal que sente.

Para mim não há prado florescente,
Esgotando o prazer, passam seus dias;
Onde acariciado tu serias
Por quem nem sabe o nome às desventuras.

Ao som de harmoniosos instrumentos,
No peito, que é de pérolas ornado,
Criarás mil suaves sentimentos;

Mas em mim, que sou vítima do fado?!...
Cercada dos mais ásperos tormentos,
Achas uma alma só — e um só cuidado.

Das Märchen, de Emmanuel Nunes

Assisti, ontem, no Cine Teatro Virgínia, de Torres Novas, à estreia da ópera de Emmanuel Nunes. Sobre a leitura da obra remeto para o Letra de Forma, de Augusto M. Seabra (aqui e aqui), embora não partilhe de todos os pontos de vista apresentados pelo autor, nomeadamente no que se refere à dimensão cénica. Mas posso estar completamente equivocado devido ao desvio introduzido pela filmagem. Quem esteve no S. Carlos esteve no espaço teatral, quem esteve numa sala de cinema esteve a ver televisão num ecrã gigante.

Julgo que há um ponto que merece reflexão e que é colocado por Seabra: o da relação da obra de arte, nomeadamente a musical, com a recepção pública, ou melhor, o carácter dialógico da obra de arte. O risco de muitas obras de arte de vanguarda é o de cortarem a relação com o receptor, ensimesmando-se num solipsismo exacerbado e pleno de hubris, que por vezes apenas esconde novas formas de academismo. Como não possuo formação musical, não emito opinião sobre a matéria musical da ópera.

Parece-me, no entanto, que a experiência da temporalidade proposta na obra é problemática. O tratamento narrativo funciona ao contrário da economia narrativa. Esta contrai o tempo real num tempo da história. O tratamento dado ao tempo, por E. Nunes, entenda-se tempo mediado pela matéria musical, foi o de amplificar o tempo de leitura (a «história» que suporta a ópera é «O Conto da Serpente Verde», de Goethe, e possui cerca de 50 páginas, na edição portuguesa das obras escolhidas de Goethe, da Relógio de Água), como se a consciência se absorvesse na temporalidade e, na captação em «câmara lenta» da história que se expõe na musicalidade que dela emana, chegasse a uma consciência de si. Esta consciência de si resulta duma metamorfose a que o espectador está sujeito pela visão/audição da obra. Há metáforas fortes que remetem para a dimensão temporal: o rio e a serpente. Isto significa que o acesso à consciência de si, através da consciência do tempo, dificilmente se poderá fazer pela luz da razão. É então a faculdade da imaginação que é posta como dínamo da metamorfose, aliás o que é anunciado no prólogo. O rio, a serpente, a música, eis o tempo que passa. A consciência apossa-se de si pela dilação do tempo, mas essa dilação é obra da imaginação, que suspende o tempo de acção humana e natural e instaura um tempo lento, tão lento quanto a consciência necessita para se reconhecer.

Porque tudo isto é problemático? É problemático porque desafia o espectador/auditor para um jogo tão tenso que este corre o risco de naufragar no rio e não encontrar a ponte que liga as margens, isto é, que liga a razão e a imaginação, deixando-o vogar à deriva ou, muitas vezes, com pouca vontade de fazer a viagem: sentar-se e deixar-se arrebatar pela aventura.

Por fim, uma palavra para a iniciativa de ver ópera transmitida via satélite, com o fim de divulgar o género musical. Eu fiquei grato por ter o Virgínia à disposição e também pela qualidade da transmissão. O problema centra-se no conflito que se desenha entra a política «dinamização» de novos públicos e os efeitos negativos que isso pode ter. Na primeira parte, estariam mais de 100 ou 150 pessoas. Na segunda parte, restavam talvez umas 20. As pessoas deveriam perceber a priori o tipo de espectáculo com que se iriam confrontar. A obra exige que o espectador tenha sido «preparado» por um longo treino na audição da vanguarda musical.

Começou o fim-de-semana

Começou o fim-de-semana ensolarado. Convida a sair para o sol de inverno e caminhar nos campos,como se a primavera estivesse a chegar. Bom dia.

Igreja da Santíssima Trindade - XIX

25/01/08

Marquesa de Alorna - XI "Esperanças de um bem tão contingente"

Esperanças de um bem tão contingente,
Com que fim me andais sempre atormentando?
Se inútil é que eu viva suspirando,
Porque me não deixais viver contente?

Ora fingis distante, ora presente
O motivo do mal que estou chorando;
Fingi-me, se podeis, ao menos quando
Hei-de viver feliz, sendo indif’rente.

Se tanto vos aflige o meu sossego
Que o perturbais por modo tão tirano,
Matai-me, que a morrer eu não me nego.

Mas se viva, o destino deshumano
Me quer, fugi; que eu triste já me entrego
Ao descarnado e duro desengano.

João Domingos Bomtempo - Sinfonia Nº 2 (Minueto - Allegro)

O reconhecimento dos professores e o seu papel político

O reconhecimento do papel político dos professores está expresso na sondagem mundial da Gallup sobre a profissão que merece mais confiança e à qual as pessoas dariam mais poder. Em Portugal, e na Europa ocidental em geral, a profissão que merece maior confiança é a dos professores. Em Portugal, também se atribuiria mais poder aos professores. Na Europa, essa atribuição seria em primeiro lugar para os intelectuais e a seguir para os professores (cf. Público). No mundo, os professores só são batidos pelos líderes religiosos, em África.

Estes dados são muito interessantes pois evidenciam uma coisa que não se vê: o importante papel político do professor. Papel político? Expliquemo-nos. Por norma, vê-se a política apenas a partir de três pontos de vistas: o das elites políticas (as que exercem a função da criação da lei e da tomada de decisão); o do poder judicial (que assegura a paz público pela aplicação da lei); o das forças policiais e militares (que asseguram a ordem interna e a defesa contra as ameaças externas).

Mas todos estes poderes (político, judicial, militar e policial) só existem porque existe uma comunidade que quer ser soberana e quer viver em conjunto. Então qual o papel dos professores? Nas sociedades modernas, são eles que criam continuamente a comunidade política, que constroem um clima de querer viver em comum, que educam as novas gerações para a cidadania. Aos professores a sociedade confia-lhes não a educação pessoal dos novos membros, mas a construção do cidadão e a manutenção do espírito que assegura que uma comunidade política continue a querer sê-lo. Esta construção faz-se não por manipulações partidárias, mas pelo ensino da língua pátria, da história, das ciências, da filosofia, das artes e das técnicas. Um aluno, numa escola, torna-se português ao aprender a ler, a escrever, a contar, a pensar em português e no âmbito dos valores portugueses.

Os políticos dirigem uma nação soberana, as polícias e os juízes asseguram a ordem e a paz públicas, os militares defendem essa soberania. Os professores, porém, fazem mais do que tudo isso: criam o desejo de soberania, criam os mecanismos de consenso social que nos faz querer ser membros de uma comunidade, criam, em cada dia que passa, essa comunidade. Foi isto que os portugueses, e a generalidade dos povos, reconheceram.

É muito curioso que mesmo depois de três anos de ataque impiedoso e ignóbil, por parte do actual governo, aos professores, estes sejam a profissão que maior confiança merece. É muito interessante pensar porque é que os agentes políticos que menos confiança merecem dos povos (os actores políticos) tratam de forma tão aviltante o grupo social mais confiável. É interessante também perguntar porque nunca os professores viram reconhecido o seu importante papel na construção da soberania de um povo.

Não conheço, julgo que não há, investigação empírica sobre o assunto. Avanço, porém, uma tese: A deontologia do professor obriga a tratar todos os alunos como iguais, diferenciando-os não pela origem social ou outra, mas pelo desempenho, enquanto os grupos políticos respondem a interesses particulares e, apesar da retórica sobre a igualdade perante a lei, as suas decisões acabam sempre por servir uma parte da comunidade contra as outras. A deontologia docente é o contraponto da praxis dos decisores políticos.

É no professorado que se encontra de facto o ideal de comunidade. É ele que, muitas vezes sem o saber, o transporta e o transmite, todos os dias, na sala de aula. Não deixa de ser interessante que os cidadãos reconheçam este facto e que os governantes o neguem sistematicamente. É interessante também considerar que portugueses dariam mais poder aos professores, enquanto o actual governo o diminui todos os dias.

Mas não será essa atitude perante o professorado a exacta imagem da pouca consideração que a classe política governante tem pela comunidade como um todo? Foi isso também que os portugueses reconheceram não apenas quando disseram que os professores são a profissão mais confiável e a quem dariam mais poder, mas que os políticos são a menos e, por isso, menos merecem o poder que têm.

Jornal Torrejano, 25 de Janeiro de 2008

Nova edição do Jornal Torrejano on-line. Na primeira página, o destaque vai para as palavras de Arnaldo Santos, comandante dos Bombeiros, sobre a dificuldade de atrair jovens para o voluntariado. Referência também para as bodas de ouro dos «Camponeses» de Riachos. Refira-se, ainda, a transmissão em directo e com legendas em português, às 20 horas, no Cine Teatro Virgínia, da estreia, no S. Carlos, da ópera Das Märchen de Emmanuel Nunes.

Não falta opinião na opinião desta semana. Para começar, o explosivo cartoon de Hélder Dias. Depois, A mesa de José Ricardo Costa, A lei é dura, especialmente para alguns de Santana-Maia Leonardo, Os trapos de Jorge Salgado Simões (espera-se que seja a confirmação do regresso), Outro pântano, de José Gil Serôdio (uma estreia na opinião, ainda por cima familiar), Metáforas da caça de Ivone Mendes (outro retorno), Nove anos com o JT de José Trincão Marques (travestido de Fernando Faria Pereira), David não apareceu de Carlos Henriques e A cultura da exigência deste blogger de triste figura.

Acabou-se, por hoje. Para a semana, haverá mais, se houver.

Nasce turvo o dia

Nasce turvo o dia, o céu vem juncado de nuvens que a luz solar vai matizando de cinza e sangue, por vezes de um amarelo fugidio, e tudo se funde na luz embaciada a que se chama aurora. Bom dia.

Igreja da Santíssima Trindade - XVIII

24/01/08

Marquesa de Alorna - X "Piério, tu que logras a ventura"

Piério, tu que logras a ventura
De ver benigna a face do Sob’rano,
Compadece-te lá do acerbo dano
Que nos cerca, a-pesar-da fé mais pura.

Não turbes dos prazeres a doçura,
Mas tira saudável desengano
De ver fugir um ano e outro ano,
Enquanto nos persegue a sorte escura.

Vê com quanta incoerência os bens reparte
Fortuna, que injusta oprime o todo,
Bem que respeite em ti a melhor parte;

Aceita o seu favor de qualquer modo,
Mas não te fies dela de tal arte
Que te esqueça que o bem terreno é lodo.

Sobre a modernidade

Torne-se um pouco mais visível, neste blogue, a troca de ideias com o Zé Manel Pereira (ver ali), do Canhotices. Há um assunto que me interessa particularmente que é o da modernidade e do seu hipotético fim. O que quero eu dizer com isto? Que o processo civilizacional que começou no pós-renascimento, com a filosofia cartesiana e a ciência moderna, que ganhou substância no pensamento do iluminismo, nomeadamente com Kant, que encontrou na revolução industrial a sua energia, que supôs, tanto na versão liberal como na marxista, uma emancipação racional, ainda que diferenciada, do homem, pode ter chegado a um ocaso. Há sintomas desse ocaso? Há. Tanto o individualismo, nascido do subjectivismo cartesiano e do liberalismo empirista de Locke, como a ciência e a economia apresentam sinais de profundas contradições.

Por exemplo, o crescimento dos direitos e da afirmação dos indivíduos está a conduzir a situações em que os indivíduos libertados da tutela social se encontram agora abandonados e nesse sentimento de abandono cresce um outro sentimento: o de uma vida desprovida de sentido e, por isso, irracional.

Por seu turno, a economia nascida com a revolução industrial gerou um conjunto de contradições (não apenas as sociais e económicas analisadas por Marx), nomeadamente uma contradição naquilo que foi considerado como um stock de matérias-primas para o homem, isto é, a natureza. O desenvolvimento indefinido da economia implica a existência de um stock infinito sempre disponível. Ora a natureza, esse fundamento material da economia, nem é infinita, nem parece disposta a aceitar sem vingança a sua redução a um mero stock à disposição do capricho do homem.

Por fim, a própria ciência apresenta também contradições interessantes. A ciência é uma actividade de investigação racional da realidade. No entanto, a sua afirmação e expansão foi feita sempre na base de um programa ideológico: a ciência seria um auxiliar libertador e emancipador do homem das tutelas que a ignorância e a servidão à natureza impunham. Ora as ciências empírico-analíticas, como por exemplo a Física, a Química e a Biologia, libertaram um conhecimento tal que ele pôs à disposição um poder que, a cada momento, parece querer abater-se e esmagar o próprio homem. Mas não são apenas as ciências empírico-analíticas que levantam este problema. Também as ciências humanas e sociais, nomeadamente a sociologia e a psicologia, têm contribuído para o crescimento das formas de dominação e de esmagamento do homem. O carácter emancipatório que alimentou a legitimação da actividade científica é hoje absolutamente problemático.

Em todos estes processos, todos de carácter racional, há uma coisa em comum: a razão a dado momento do devir dos processos mostra um fundo irracional. Esta irracionalidade não é a mesma que habitaria os sentimentos de fé medievais ou outro tipo de superstições. É uma irracionalidade gerada pelos próprios mecanismos da razão, de uma razão que, ao mesmo tempo, se fragmenta (razão científica, razão económica, razão social, razão psicológica) e se absolutiza. As contradições apontadas atrás, são apenas encarnações de uma contradição que habita os processos racionais e a própria razão.

Vale ainda a pena olhar para o fenómeno no âmbito da política. A experiência do socialismo, já consumada, mostrou o mesmo fenómeno: a emancipação do homem gerou sociedades onde a liberdade foi aniquilada, como se a emancipação não implicasse, na sua natureza, a própria liberdade. Mas a experiência pela qual agora passamos, a do liberalismo, não é diferente da do socialismo real: a consideração liberal de que todos os homens são seres racionais e se movem por interesses racionais está a mostrar também os seus limites extremos: o interesse racional de alguns é que outros não sejam considerados homens, isto é, que sejam escravos e logo não possuam interesses racionais. Assim como a lógica emancipatória do socialismo acabou, ao eliminar a liberdade, na contradição consigo mesma, também a lógica do liberalismo, ao não limitar o interesse, está a criar condições para uma efectiva eliminação da liberdade e uma desrealização do homem enquanto ser racional(aliás, muito desta análise foi feita por Marx).

Para concluir, o conjunto de contradições que foram geradas pelos tempos modernos, contradições que se agudizam continuamente, apontam claramente para o ocaso da modernidade. Também os conceitos que utilizámos para viver e pensar essa realidade ainda viva estão moribundos. Penso que o conceito de socialismo está morto e o mesmo começa a passar-se com o de liberalismo. Aquilo que talvez seja o mais difícil é a criação de novos conceitos, não conceitos que expliquem o que se passou, mas conceitos que captem o caminho a seguir, que lancem as bases do que se há-de desenvolver. Por exemplo, como pensar a política após a morte do socialismo e do liberalismo? Como conjugar o ideal de liberdade, da tradição liberal, com o ideal de justiça social, da tradição socialista? Neste âmbito, a minha perspectiva é a do abandono da submissão da política à economia, submissão presente tanto nos liberais como em Marx. Há que fazer implodir o conceito de economia-política. Avanço uma tese, provavelmente sem qualquer originalidade: o carácter distópico do socialismo real e do liberalismo reside na submissão dos imperativos políticos aos imperativos económicos. Mas isto é ainda e só uma tese sobre o passado histórico. Não é o conceito vivo que permite pensar aquilo que, por não ter sido pensado, dá que pensar.

Enfim, entusiasmei-me e isto já vai demasiado longo para um blogue.

A política italiana

A demissão de Romano Prodi, se conduzir à convocação de novas eleições, poderá ter como consequência o retorno de Silvio Berlusconi ao poder. É essa, pelo menos, a indicação das sondagens e o temor dos partidos de esquerda e centro-esquerda. A política italiana sempre foi intrigante, e num duplo sentido: intrigante naquilo que ela tem de mistério e intrigante naquilo que tem de intriga. Por exemplo, como pode a direita ter como sua figura de referência Silvio Berlusconi? E como pode a esquerda, perante este cenário, apresentar-se tão dividida e inconsistente? Mas no carácter burlesco da política italiana talvez se descubra a natureza de toda a política europeia.

Iva Bittová

Fred Frith & Evelyn Glennie - A Little Prayer (Glennie)

Veio o dia

Veio o dia sobre as ruas da cidade. Há uma luz cariada que rompe um manto salitrado de nuvens. Lentamente, a quietude da noite dá lugar à confusa azáfama da manhã. Bom dia.

Igreja da Santíssima Trindade - XVII

23/01/08

Marquesa de Alorna - IX "Saudade"

A uma flor chamam Saudade,
Que é primor da natureza;
Mas a que nasce em meu peito
E’ produção da tristeza.

Enquanto a saraiva, os Notos
Destes gelados países
Açoutam as plantas, cresce,
Lança profundas raízes;

Mas se um dia, transplantada,
Outro terreno buscar,
Alívio terá meu peito,
E a Saudade há-de murchar.

Uma questão de fé

Alguém duvida que os professores perderam e que perderão ainda mais, independentemente das suas razões? Esta fotografia revela mais do que as palavras e as acções da ministra da educação. Quando olhamos, o que vemos? Um universitário imbuído de razões? Não. Um político habitado por estratégias para assegurar o poder? Também não. O que vemos? Vemos alguém marcado pela chama da fé. Há uma fé ardente que habita esta mulher que governa a educação em Portugal. Como todos sabem, quando alguém é habitado pela fé, não há razões, por mais claras e distintas, que abram uma clareira de dúvida nesse espírito tomado pelo sopro do fogo divino. Durante estes anos, não há um momento sequer em que tenha escutado e ponderado as razões adversas. Só a fé pode fazer marchar contra a opinião e a experiência da generalidade dos professores. Só um sentimento de pureza inviolável marcado pela crença na predestinação alimenta uma a vontade inabalável de vergar e humilhar até à última gota todo um grupo social.

Esta fotografia, de Paulo Ricca do Público, fez mais pela minha compreensão do fenómeno «ministra educação» do que a observação e análise da sua acção. A frieza exterior e o fogo interior fazem lembrar os grandes heréticos, homens e mulheres portadores de uma visão pura e que estão dispostos a tudo para a impor ao mundo, uma visão em que a realidade suja e promíscua não tem qualquer peso. Quem conhece um pouco de história da Europa ou leu John Locke, sabe o que acontece quando a fé tem o braço do poder por trás. Não haverá qualquer concessão. Sob o império da força legítima, os professores acabarão pura e simplesmente destroçados, a profissão ficará completa e totalmente degradada, não haverá qualquer concessão para com os descrentes da nova religião, nem sequer o agnosticismo será permitido. Pelas escolas há gente que começa já a sentir o cheiro do fumo que se eleva das fogueiras que ainda não estão a arder. Em breve, virão os autos-de-fé. Quando uma personagem dotada de fé chega ao poder, nem precisa de mexer um dedo, os pequenos torquemadas aparecerão dispostos a purificar o ambiente.

Pequenas manchas vermelhas

Pequenas manchas vermelhas nos céus anunciam um dia de sol. Na rua, já começou a azáfama: carros que passam a roncar sonolentes, pessoas que se esquivam para o primeiro café da manhã. Bom dia.

Igreja da Santíssima Trindade - XVI

22/01/08

Marquesa de Alorna - VIII "Tu, Deusa tutelar da solidão"

Tu, Deusa tutelar da solidão,
Amável sombra, oh melancolia,
Aproxima-te, rouba-me a alegria
Que turba a suavidade ao coração.

Não prives o meu peito, não,
Da tua triste e doce companhia,
Que suspira por ti um e outro dia
Quem de amar-te só faz consolação.

E não pode a que vive suspirante
Viver entre o tumulto muito espaço,
Sem que faça o seu mal mais penetrante.

Atende, oh Ninfa, o rogo que te faço:
Não demores mais tempo o doce instante,
Os dias tristes, que eu tão triste passo.

Sobre a magna questão de vivermos em «fascismo»

Num «post» de Nuno Castro, no O Blogue Qualquer, já com alguns dias, há uma reflexão sobre artigos de Vasco Graça Moura, António Barreto e Baptista Bastos, sobre a lei do tabaco e as actividades da ASAE. Há uma demarcação das posições desses autores, nomeadamente da ideia de que «vivemos em fascismo». Não é bem isso o que me interessa. O que me interessa é o seguinte:

«A minha opinião [de Nuno Castro] é que caminhamos para um fascismo “doce”, suave, mas não pelo governo Sócrates; antes é a sociedade portuguesa que paulatinamente envereda por aquilo que Boaventura designou de fascismo societal. É importante ter isto em mente, porque a desculpa mais fácil e mais confortável é assacar as responsabilidades deste “fascismo doce” ao governo Sócrates. A meu ver, não cabe a este as culpas de uma tal situação; ou pelo menos é absurdo atribuir-lhe a causa de uma noção totalizante como é a de fascismo. A haver causas encontram-se na sociedade portuguesa, resultado de uma multiplicidade de factores, que estão, a meu ver, ainda por descortinar e expor

Se de facto não vivemos em fascismo, também não me parece que caminhemos para um fascismo “doce” ou para um fascismo societal (palavra horrível). A utilização de um conceito como fascismo pode ter uma repercussão afectiva, mas não ajuda a pensar a realidade. Se há uma coisa que marca o fascismo (ou os fascismos) é o seu carácter político revolucionário (veja-se os vários tipos de “camisas” que se ligam ao fenómeno). Mas este carácter revolucionário visava o futuro de uma forma enviesada: através da restauração de certos valores provenientes de um passado mítico (veja-se a cenografia dos fascismos italiano e alemão, ou mesmo da trupe de Primo de Rivera, aqui ao lado). Diria que os regimes totalitários, neles incluindo, ainda que de forma diferenciada, o comunismo, são estranhos regimes que combinam as aquisições da técnica e da estética modernas com uma ideologia restauracionista pré-moderna e pré-iluminista. O que torna estes regimes totalitários é a necessidade de metamorfose orgânica: metamorfosear o corpo moderno num corpo não moderno.

É evidente que não caminhamos, em Portugal, para nenhuma forma de fascismo, seja doce, seja amargo. Nenhum projecto revolucionário existe, nem tão pouco qualquer ânsia de retorno a um passado mítico pré-moderno. O regime é reformista e visa a modernização contínua da sociedade, a sua submissão aos mecanismos sociais herdados do iluminismo, na sua versão liberal. Relativamente à sociedade portuguesa também me parece deslocado o conceito de fascismo societal. Em 50 anos, a sociedade portuguesa passou pela experiência de um regime político autoritário, pela experiência revolucionária da segunda metade da década de 70, pela experiência de uma União Europeia que já não é a actual, ainda marcada pelo pacto social-democrata e, por fim, pela experiência de uma sociedade globalizada e economicamente liberal. Pessoas com 50 anos viveram intensamente todas estas experiências.

É provável que certas manifestações de conformismo social, alguma incapacidade da sociedade fazer frente aos desígnios das elites, alguma incapacidade crítica, sejam um reflexo de uma experiência tão multifacetada e, pela sua complexidade e intensidade, geradora de atordoamento proveniente de orientações sociais tão contraditórias. Utilizar o termo fascismo não ajuda a perceber o fenómeno e induz em erro. Porque aquilo que está em jogo é a recepção pelos portugueses dos imperativos da modernidade, num momento em que esta parece despedir-se da cena do mundo. É provável que a forma como os portugueses estejam a lidar com os processos sociais em curso seja diferente da dos nossos parceiros europeus, mas esses processos são idênticos e a impotência que se sente em Portugal é, certamente, sentida por muitos europeus não portugueses. É no jogo entre a força abstracta e destituída de rosto que impõe sem alternativas o curso do mundo e a impotência sentida pelos homens que reside o problema que dá que pensar. Mas utilizar um conceito como o de fascismo contribui muito pouco para esclarecer o que se passa. Há quem utilize o conceito de «barbárie doce», mas também este é pouco pregnante. Porquê? Porque o que está em jogo não é a barbárie mas a civilização. Porquê o nosso desgosto perante o avanço ininterrupto das forças civilizadoras? Eis o que dá que pensar.

Desafinado - Stan Getz In The UK

No horizonte

No horizonte, um traço vermelho anuncia o sol a vir. Na quietude da manhã, suspeita-se de um dia sem chuva nem frio. Imagina-se já o barulho dos pássaros da Primavera. Bom dia.

Igreja da Santíssima Trindade - XV

21/01/08

Marquesa de Alorna - VII "Porque se ama, ou se não gosta"

Porque se ama, ou se não gosta,
Inda está mal definido;
O acaso, o fado, a estrela
Forjam armas a Cupido.

Se com desdéns recompensa
Zelina meu vivo ardor,
Não tenho de que queixar-me,
Não depende dela amor.

Por ela morro; e não pago
De Alcina os ais com os meus.
Ninguém a razão me indague,
Procure o enigma nos Céus.

O pós-Ocidente

“Assim, em última análise, o «post» da pós-Modernidade revela-se como o «post» de uma idade pós-ocidental que ainda se busca a si própria. É um «depois» que sacode as grades do presente e dá expressão a uma claustrofobia dos tempos do fim.” Quando Peter Sloterdijk escreveu estas palavras (A Mobilização Infinita, p. 218) ainda o muro de Berlim não tinha caído. Eram, porém, já claros os indícios de que o Ocidente deixara de ser o centro da história.

O período que vai de 1917 a 1989, devido à pressão exercida pela ideologia marxista em vigor numa parte substancial do planeta, tem uma natureza equívoca. Equivocidade essa intensificada pelo facto de o comunismo pretender ser uma saída da história e o socialismo real pretender ser uma história que quer deixar de o ser. Ora esta relação conturbada do marxismo com a história, essa perspectiva pré-moderna e pagã que foge à linearidade mortal da história, foi, após a queda do muro e de imediato, abraçada pelo liberalismo triunfante, que não via, nem vê, nada para além da sua própria vitória e a submissão do mundo à utopia do mercado livre.

Aquilo que se passou de 89 para cá, apenas confirmou a intuição irónica de Sloterdijk. Mesmo que os EUA ainda sejam, e por muitos anos, a principal potência militar do mundo, a verdade é que vivemos claramente numa «claustrofobia dos tempos do fim», vivemos, ao mesmo tempo, no aurora de um mundo que não conhecemos, que não sabemos designar. Mas o ponteiro da história volta-se decididamente para Oriente. O domínio dos EUA representa apenas o tempo da agonia do Ocidente.

Mas o que será esse pós-Ocidente? Não pode ser outra coisa senão o Oriente. Aqui há duas alternativas. Ou o Oriente que triunfa se funda nas tradições de razoabilidade que, da China à Índia, passando pelo Japão, sempre existiram, ou o Oriente é o Médio-Oriente e a tradição do Islão. A herança ocidental, pois é já disto que se trata, apesar de ser constituída por uma parte substancial recebida do Islão, parece ser melhor recebida e trabalhada no Extremo-Oriente. Nestas últimas décadas, as culturas orientais têm dado provas de uma grande capacidade plástica para, sem alterar os seus valores fundamentais, absorverem a cultura ocidental.

Seja como for, a verdade é que entre a Europa e esse mítico Oriente há uma barreira, o mundo inquieto do Islão. O que é perturbante não é a possibilidade de a nossa civilização sobreviver. Sobreviverá nesse Oriente extremo. O que é perturbante é imaginar que a Europa possa não sobreviver, apesar da sua cultura se ter propagado e entranhado, em parte, no Oriente. A demografia, o cansaço, a velhice não auguram nada de bom perante vizinhos tão jovens e irrequietos.

O futuro da Caixa Nacional de Pensões

Não sei se já repararam, mas a idade da reforma para as novas gerações já passou para os 68 anos. Depois da retórica da sociedade do lazer (era o tempo em que o comunismo representava uma ameaça séria), agora é a retórica de uma sociedade em que se vai morrer a trabalhar. Alguém que comece a trabalhar após concluir o ensino secundário, aos 18 anos, vai ter uma carreira contributiva, se tiver a sorte de ter sempre trabalho, de 50 anos. Se for homem, após a reforma, a sua esperança de vida é de cerca de 4 anos, se for mulher, é de cerca de 10 a 12 anos. Não tardará muito que a idade da reforma passará para os 70 anos. Quando a idade da reforma ultrapassar a esperança média de vida, a Caixa Nacional de Pensões terá um futuro assegurado e glorioso.

O Islão e a violência

Durante uma festa religiosa em Caxemira eclodiram, mais uma vez, cenas de grande violência entre muçulmanos xiitas e sunitas. É possível estabelecer uma relação, a este nível, entre o Islão e o Cristianismo? Até certo ponto. Também entre cristãos a violência foi enorme, nomeadamente nos acontecimentos pós-Reforma luterana. Um resquício desses acontecimentos é a situação na Irlanda do Norte. Mas no cristianismo, devido à sua própria natureza apolítica, foi possível escutar palavras como as de Locke (cf. Carta sobre a Tolerância). No Islão, porém, não há uma separação entre a religião e a política. A consequência é a guerra que existe, desde a morte do Profeta, entre sunitas e xiitas. É esse potencial de violência, nunca efectivamente reconciliada, que dinamiza também a violência do Islão para com o mundo exterior. O Islão terá grande dificuldade de viver em paz com os outros enquanto não conseguir viver em paz consigo mesmo. Mas para o Islão viver em paz consigo mesmo seria necessário, como ensina John Locke, distinguir claramente a esfera religiosa, de natureza subjectiva, da esfera política e jurídica, de natureza colectiva. Ora nem os textos nem as tradições parecem autorizar tal esperança. O conflito com mais de 1300 anos prolongar-se-á infectando continuamente o Islão e tornando-o cada vez mais um foco de instabilidade geopolítica.

Sol sobre a neblina

Sol sobre a neblina da manhã. A luz chega branca e inunda a cidade como se trouxesse já, em suas asas, a Primavera. Bom dia.

Igreja da Santíssima Trindade - XIV

20/01/08

Marquesa de Alorna - VI "Eu cantarei um dia da tristeza"

Eu cantarei um dia da tristeza
Por uns termos tão ternos e saudosos,
Que deixem aos alegres invejosos
De chorarem o mal que lhes não pesa.

Abrandarei das penhas a dureza,
Exalando suspiros tão queixosos,
Que jamais os rochedos cavernosos
Os repitam da mesma natureza.

Serras, penhascos, troncos, arvoredos,
Ave, fonte, montanha, flor, corrente,
Comigo hão-de chorar de amor enredos.

Mas ah! Que adoro uma alma que não sente!
Guarda, Amor, os teus pérfidos segredos,
Que eu derramo os meus ais inutilmente.

Jorge Almeida Fernandes - Habermas e Ratzinger

É útil voltar atrás, ao debate de 2004 entre Ratzinger, então cardeal, e o filósofo alemão Jürgen Habermas, um "ateu metódico". Para este, o debate com a Igreja é incontornável na questão dos valores. O cristianismo, diz, é o fundamento último da liberdade, dos direitos humanos, da civilização ocidental: "Não dispomos de opções alternativas. Continuamos a alimentarmo-nos desta fonte. Tudo o resto é palavreado pós-moderno." Perante o rolo compressor da globalização, os Estados liberais devem salvaguardar "os seus recursos culturais e morais, dos quais a religião faz parte". Habermas citou o filósofo político E.W. Bockenforde. "A Igreja não deve intervir directamente no domínio do Estado, na legislação ou nos poderes executivo e judicial. Mas é preciso lembrar que, previamente à ética de facto preconizada pelo Estado para os cidadãos, existe um ethos pré-político. O Estado secularizado deve submeter-se às normas que o precedem. (...) A Igreja tem o direito e o dever de se referir às normas fundamentais que decorrem da própria essência do ser humano." [Público, de hoje. Negrito nosso.]

Luís Valadares Tavares - Escola fácil igual a vida difícil

Os problemas resolvem-se, se eu assumir que há um problema. Iniciativas como as Novas Oportunidades são boas, se houver um clima de exigência maior. Costumo dizer aos meus alunos: escola fácil igual a vida difícil, escola difícil igual a vida fácil. A escola não deve ser fácil. A escola deve ser acolhedora, mas muito exigente, difícil. A escola tem de preparar as pessoas para a sociedade moderna. Mas no nosso país tem havido ideias muito erradas em relação a isto. Ainda há pouco tempo havia quem defendesse que os níveis de exigência deveriam ser definidos na escola, resultantes da interacção entre professores e alunos. Isto é uma patetice. Os níveis de exigência são os necessários para eles se prepararem para a competição global em que vão viver. (Entrevista ao Público, de hoje)

Corre o Domingo

Corre o Domingo pesado e tranquilo, banhado por uma luz branca. O céu azul é um mar raiado de espuma, água celeste a inundar ruas e avenidas, a mostrar o corpo despido das árvores de verão. Bom dia.