12/06/09

Reaccionário tecnológico

Sou um reaccionário tecnológico. Não pelo facto de o aparelho de televisão que possuo ser já de outra era, mas pelo simples motivo de apenas possuir quatro canais de televisão. Ainda não aderi, pelo menos na actual encarnação, ao cabo ou ao satélite. Resta-me a escolha entre os canais de sinal aberto, que, para dizer a verdade, mais valiam que também fossem em sinal fechado.

Raramente vejo TV, mas cada vez que me sento e faço um zapping miserável pelos quatro canais, só me dá vontade de fechar o aparelho e nunca mais o abrir. O canal dois, talvez por falta de sorte a minha, sempre que passo por lá há-de estar um leão a comer uma gazela, um jacaré a tomar a refeição, um leopardo com a boca suja de sangue. Não é que eu tenha alguma coisa contra. Se eles têm fome, terão de comer, mas cansa ver tantos programas de gastronomia. Deve haver por lá outras coisas, mas nunca as apanho.

Os outros três canais generalistas parecem-me um poço de boçalidades. Tenho a difusa impressão de que, de manhã à noite, cada canal só transmite um programa. Acho que nas programações lhe dão títulos diversos, e é possível que pessoas diferentes, ou aparentemente diferentes, apresentem o programa em diversas horas do dia, mas não juro. Por exemplo, não consigo diferenciar uma telenovela de um programa da manhã para a terceira idade, ou de um jogo de futebol, de um concurso ou mesmo de um telejornal. Tenho feito até algumas experiências curiosas. Tento surpreender as televisões em diversas horas do dia, para provar a mim mesmo que não tenho razão. Mas não consigo. Seja a que horas for estão sempre a dar o mesmo programa.

O curioso desta coisa do zapping é que, no outro dia, até pensei que o comando estava sem pilha ou tinha entregue a alma ao criador. Eu carregava nos botões dos canais e era sempre a mesma coisa que aparecia. As caras não eram exactamente iguais, mas os programas sim. Descobri então que os três canais generalistas em Portugal transmitem todos a mesma coisa durante as 24 horas de cada dia, se é que um dia televisivo tem 24 horas.

Por isso estou cada vez mais um reaccionário tecnológico. Cada vez que me falam em aderir ao cabo ou ao satélite, eu só penso o que seria ter dezenas de canais à disposição para ver só um programa durante todos os dias da vida. E não adiro. Compro um livro ou filme com o dinheiro da televisão e entrego-me a minha reaccionarice tecnológica, mostrando bem que não pertenço à elite moderna do engenheiro Sócrates, Deo gratia.

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