14/05/07

Divórcio unilateral

O Bloco de Esquerda apresentou uma proposta de lei que permitiria o divórcio apenas por decisão de um cônjuge. A ideia, aliás interessante, é desvincular o divórcio da culpa. Hoje se alguém se quer divorciar, e não houver acordo para o triste desenlace, o que pretende a separação tem de culpar o outro de alguma coisa que permita um divórcio litigioso.

As reacções estão a ser interessantes. O PCP, na imprensa de hoje, ainda não sabia bem qual a posição que iria tomar. O PS é contra. Segundo o Jornal de Notícias, Osvaldo de Castro teria afirmado “É complicado prever, juridicamente, o direito de um cônjuge a, de forma abrupta, dizer que vai embora porque se desapaixonou”. O PSD, através de António Montalvão Machado, afirma que “o casamento não é um contrato qualquer. Pode ser terminado por via litigiosa, mas não por via unilateral” e acrescentou que a proposta do BE “permite uma enorme injustiça. Que defesa, que protecção merece o outro cônjuge?”

A questão, porém, é pertinente. Como pode uma pessoa desligar-se de outra de que a única coisa que tem a dizer é que, lamentavelmente, deixou de gostar dela e que, apesar dela ser excelente, quer ir tratar da vidinha por outro lado? Terá de inventar uma tortura psicológica? Terá de instruir o advogado dizendo que só de ver o parceiro sente uma agonia e corre o risco de ficar traumatizado? Isto faz mais sentido do que a proposta do BE?

É um facto que a introdução da culpa num processo de divórcio é bastante mais interessante. Dá tema para telenovela local, prolonga o conflito, por vezes, ad nauseam, contribui para o aumento das contas bancárias dos advogados, mas, tirando estas nobres motivações, serve para quê? É verdade que uma lei que permitisse um divórcio unilateral teria de ser bem pensada para não o tornar numa mera arma de arremesso durante um arrufo do casal.

Mas há uma coisa que é clara: para haver casamento, são precisos dois. Para acabar o casamento basta um não querer. Montalvão Machado fala em proteger o outro cônjuge. Mas de quê? E como? Obrigando o cônjuge "desamante" a reencher-se de amor pelo cônjuge "desamado"?

1 comentário:

jlf disse...

Gostei dessa das "nobres motivações"...
Muito oportuna. Falo sério.
E a reflexão que faz logo de seguida é muito pertinente.
Talvez, também, por isso, Montalvão M (quero lá saber qual o partido do sr!?) tome aquela posição.
Claro que nem ele, nem ninguém de senso, quererá que seja afirmativa a resposta à sua última e acutilante interrogação!