Sobre pintura e desenho de Gustav Klimt - Trinta e nove
39 - Gustav Klimt - Schloss Kammer on the Attersee III [Palácio de Kammer, no Lago de Atter III]
Trinta e nove
Um espaço inacessível a quem não se torna imponderável
e se ergue ao meio-dia como se a gravidade não existisse
e tudo fosse um enorme e único vazio. São assim as frases
com as quais abandonas a harmonia e entras
na liça onde tudo se submerge. De onde vem a água, perguntas
nesses instantes em que as sombras se reflectem
no campo lavrado, lago assim lhe chamam. A casa atrai-me
e deixo que os pés me levem, como se asas fossem, para lá
da fronteira e reencontro o mundo, o mundo da infância, dizem-me,
recoberto de silêncio e flores aprumadas pelo ofício
do divino jardineiro. Ao longe, havia uma serra, não a ferocidade
das grandes montanhas, cinzelada no calcário,
de onde sopravam ventos a amainar as tardes de calor,
a cobrir de pó as giestas, a orvalhar as rosas, se as havia.
Quando um olhar atento cai e encontra uma face,
é a tua face que se aproxima na distância, inacessível
distância que a tudo cobre com a sua voz de alcateia,
ou o pulsar exacto das mãos que escavam as nuvens,
brancas nuvens aos céus ocultam. Daquelas janelas, depois
de teres entrado pela porta invisível, espreitaste o mundo
e esperaste que as estações do ano passassem e tu com elas,
a contar primaveras, à espera de um beijo sobre a face
e um ramo de rosas para cerzir a inacessível distância
e calar a alcateia que havia na tua voz, quando uivavas
de cio, se os ventos da serra não vinham amainar
os calores de Julho, o ano sempre os traz, e os homens
não resistiam aos ferozes decretos da gravidade.
e se ergue ao meio-dia como se a gravidade não existisse
e tudo fosse um enorme e único vazio. São assim as frases
com as quais abandonas a harmonia e entras
na liça onde tudo se submerge. De onde vem a água, perguntas
nesses instantes em que as sombras se reflectem
no campo lavrado, lago assim lhe chamam. A casa atrai-me
e deixo que os pés me levem, como se asas fossem, para lá
da fronteira e reencontro o mundo, o mundo da infância, dizem-me,
recoberto de silêncio e flores aprumadas pelo ofício
do divino jardineiro. Ao longe, havia uma serra, não a ferocidade
das grandes montanhas, cinzelada no calcário,
de onde sopravam ventos a amainar as tardes de calor,
a cobrir de pó as giestas, a orvalhar as rosas, se as havia.
Quando um olhar atento cai e encontra uma face,
é a tua face que se aproxima na distância, inacessível
distância que a tudo cobre com a sua voz de alcateia,
ou o pulsar exacto das mãos que escavam as nuvens,
brancas nuvens aos céus ocultam. Daquelas janelas, depois
de teres entrado pela porta invisível, espreitaste o mundo
e esperaste que as estações do ano passassem e tu com elas,
a contar primaveras, à espera de um beijo sobre a face
e um ramo de rosas para cerzir a inacessível distância
e calar a alcateia que havia na tua voz, quando uivavas
de cio, se os ventos da serra não vinham amainar
os calores de Julho, o ano sempre os traz, e os homens
não resistiam aos ferozes decretos da gravidade.
Jorge Carreira Maia, Sobre pintura e desenho de Gustav Klimt, 2008
Sem comentários:
Enviar um comentário