António Manuel Couto Viana - A Saudade dos Deuses
Acreditais nos deuses mais humanos
Que têm carne e sangue, em vez de pão e vinho,
E o pâmpano viçoso, em vez do agudo espinho,
Cingindo as lisas frontes de soberanos.
Acreditais nos deuses vingativos
Que vos mancham de lodo a túnica impoluta
E em taças de hidromel vos servem fel, cicuta
— O prémio dos cativos.
Acreditais em vós, que sois divinos
Donos das vossas chagas e prazeres.
Trocais a fria sombra dos deveres
Pelas flores, pelos hinos.
Buscais na vossa face a cor e a luz;
No espelho do regato o amor perfeito;
Mas tendes por destino e derradeiro leito
Os braços duma cruz.
1 comentário:
Belo poema e reflexão cheia de sabedoria. Uma exortação para (re)pensarmos a nossa forma de estar na vida. Mensagem ideal para os "grandes" e presunçosos deste mundo...
Os que se consideram "divinos" esquecem-se que não há ser mais pequeno do que aquele que se julga grande. Os que procuram "hinos" e desprezam os deveres não sabem que não há vida mais árida do que aquela que mergulha as suas raízes no culto das vénias, honras, riquezas e poder.
Esses pretensos deuses não sabem que o Homem será tanto maior quanto mais assumir a sua frágil e maravilhosa condição humana. No reconhecimento das suas fragilidades residirá a sua força e grandeza.
Alice N.
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