01/06/08

Conversas

Prepara-se para partir a primavera. Da rua chega uma luz calorosa e branca que ilumina as flores sobre a bancada. Sentados, extáticos, dois vultos batidos pela violência dos raios solares conversam. Uma conversa sussurrada, quebrada por longos silêncios, onde os olhares ficam presos às pequenas coisas de todos os dias. Pela a mesa, um jarro de água e um copo vazio. Às vezes, a mais nova olha para o chão e cicia ‘se ao menos pudesse sair desta cadeira, desta casa, desta rua…’, e deixa frase inacabada como se a esperança pudesse entrar por ali. A outra não responde, fixa o olhar nas cortinas que cobrem o sol e cede ao peso de uma ruga funda que lhe cavalga a testa. Ofegante, alisa com rispidez o negro do vestido, depois inclina a cabeça, olha as mãos e ali fica debruçada sobre o buraco vazio onde outrora habitou um coração.

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