18/02/09

O carnaval escolar



Será possível dar a perceber à opinião pública o grau extremo de degradação a que chegou a educação em Portugal? Não estou a falar sequer da qualidade de ensino ou da inanidade do currículo nacional, nem das ideias mirabolantes que ocorrem sistemáticamente na cabeça dos governantes educativos. Estou a falar do espírito que preside à escola em Portugal. Nada melhor para perceber isto do que a revolta dos pais de Paredes de Coura contra os professores e do apoio dado pela DREN a esses pais (aqui).

Consta que os professores do agrupamento de escolas de Paredes de Coura, tendo em conta o muito trabalho a que estão submetidos, decidiram suspender a realização de algumas actividades extra-curriculares. Entre elas a da realização de um desfile de Carnaval. Isto gerou a indignação dos pais. Leia-se o seguinte:«Eduardo Bastos lembrou aos professores que os alunos serão os "únicos prejudicados" com esta forma de protesto dos professores. os Encarregados de educação vão reunir hoje à noite para decidir que medidas tomar para "convencer" os professores a recuarem no cancelamento do desfile de Carnaval. »

Mas a não realização de um desfile de Carnaval prejudica os alunos, enquanto alunos, em quê? Faz parte do currículo nacional o desfile do Carnaval? É isto que preocupa os pais? É para isto que os pais são metidos na escola? Já ninguém tem a noção do ridículo?

Senão estivéssemos, por outro lado, perante o delírio mais extremo, como poderíamos explicar isto: «A Direcção Regional de Educação do Norte (DREN) determinou hoje a realização do desfile de Carnaval dos alunos do Agrupamento de Escolas de Paredes de Coura apesar de os professores não terem decidido se acatarão a ordem da DREN.» O Ministério da Educação agora serve para obrigar à realização de desfiles de Carnaval? Ninguém tem vergonha?

Mas os professores não são menos responsáveis pelo estado a que se chegou. Foram eles que habituaram os pais a este tipo de folclore. Foram eles que, muitas vezes, substituiram, com o apoio e o gáudio do Ministério da Educação, a escola como centro de saber pela escola como centro de animação e actividades folclóricas. Foram eles que alimentaram, muitas vezes ingenuamente, o monstro que agora os devora.

A plebe democrática, como todas as plebes, preocupa-se com o pão e o circo. Está na sua natureza. Ao Ministério da Educação e aos professores tinha-lhes competido mostrar que a escola era um sítio de aprendizagem, um centro de transmissão de saber e não um espaço lúdico para entretenimento da criançada.

Este acontecimento de Paredes de Coura é o retrato fiel da situação a que se chegou em Portugal. O niilismo que tomou conta das instituições tornou-se agressivo. Os professores estão estupefactos. Mas já é tarde. Quem semeia ventos colhe tempestades. A essência da escola portuguesa não está já, e há muito tempo, na sala de aula, mas no desfile carnavalesco. Uma mascarada abjecta.

1 comentário:

Anónimo disse...

Pão e circo bastarão para reproduzir eleitores o menos esclarecido possível.
Para muitos pais a diferença entre a academia e o concurso televisivo de exibição de talentos caseiros é uma afronta à liberdade