02/04/07

VII - Tenore solo e orchestra "...se il cielo fosse carta"

Ali na varanda as corridas janelas ainda acesas
se mãos as percorrem. O ritmo quebrado dos dias
a morte, a aleivosia, o espírito escancarado, o espinho
se encrava, a garganta incendiada, o ondulado ritmo das noites,
a vida, a lealdade, o fechado espírito, o cravo se espinha,
o incêndio da garganta. Voltemos às enumerações,
às correntes circulares, de um mundo a outro mesmo retorna.

Se descrevo ainda é porque já não descrevo
apenas impressões, cadência insinuada que se desfaz,
a Terra a correr na ponta dos olhos. Como compões a melancolia?
Olhas, soletras sílaba a sílaba, deixas a entoação
tomar conta, o vento, o sopro interior,
as casas de Verão há muito fechadas. Começas a contagem
pelos dedos e o mar nunca terá fim.

Quando se rouba uma expressão, são infinitas variações
uma letra aqui, o acento tónico ali, as dunas a uivar
como gaivotas atravessadas pela dor. Poderei?
Poderás se o teu ofício te esquecer, se os saltos
rasos te caírem e os sapatos alteados
levar-te-ão para lá. Depois, retornam as enumerações
as cantigas que a memória de velhas foi esquecendo.

[Jorge Carreira Maia, 12 Poemas sob Il Canto Sospeso, de Luigi Nono]

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