13/03/07

O retorno da tradição

Bento XVI parece apostado em voltar à tradição. Sobriedade litúrgica, reintrodução do Canto Gregoriano, possivelmente o retorno da missa em Latim. Faz sentido? Do ponto de vista estético faz todo sentido. A liturgia católica tinha-se tornado absolutamente insuportável: um sentimentalismo xaroposo. Mas, por exemplo, a questão do Latim será pertinente, mesmo como sinal contra os tempos?

O que se está a passar, na Igreja Católica, mostra, mesmo que ninguém o queira dizer, a absoluta falência do Vaticano II. A expectativa de João XXIII e de Paulo VI de fazerem frente à erosão da fé através da abertura ao mundo foi completamente gorada. As igrejas que estavam cheias esvaziaram-se, as novas gerações afastaram-se se não da fé, pelo menos da prática e do seguimento dos preceitos. Ao modernizar-se, a Igreja contrariou a sua natureza não-moderna, não subjectivista, não individualista e parece agora em vias de naufragar num mundo cujo espírito lhe é, por essência, adverso.

A tentação é retornar aos fundamentos da tradição. Será isso possível, num mundo absolutamente voltado para a volúpia do futuro? O problema da Igreja não é diferente daquele que se abate sobre as nossas sociedades: a modernização contínua das sociedades e das suas instituições está a destruir os fundamentos dessas mesmas sociedades e instituições. Elas estão presas num círculo a que parecem condenadas a soçobrar: modernizam-se para persistir, mas a modernização arrasta para a destruição os fundamentos e sem esses fundamentos sociedades e instituições não podem subsistir.

Será ainda possível elaborar uma síntese entre a tradição (herdada dos clássicos e dos medievais) e a razão moderna iluminista? Uma síntese que permita um diálogo entre o presente, o passado, depósito da autoridade, e a expectativa de haver um futuro onde a humanidade exista? Não será já demasiado tarde e a restauração de Bento XVI não passará de uma tentativa de parar o vento com uma peneira?

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