A irritação socialista com Cavaco

Nos cálculos da elite dirigente dos socialistas acreditava-se ao mesmo tempo em várias coisas estúpidas. Em primeiro lugar, acreditava-se que Cavaco seria mais dócil com o "espírito reformista", que atafulhava as cabeças "pensantes" do PS, do que Manuel Alegre. Em segundo lugar, acreditava-se que o desconchavo do PSD seria permanente. Em terceiro lugar, acreditava-se que o tempo de Cavaco tinha passado e que a subtileza da máquina de propaganda socialista seria o suficiente para impor respeito a um Cavaco tido por pouco mais do que um labrego.
Mas Cavaco, desde que saiu de S. Bento, tem uma agenda própria e tem uma virtude política que é de sublinhar: a paciência. Esperou pacientemente que passassem os 10 anos de Jorge Sampaio. Esperou, depois de eleito, que a arrogância da tropa socratista fosse tornando Sócrates em personagem detestável. Esperou, com não menos paciência, que o PSD arrumasse a casa segundo os seus, de Cavaco, desígnios. Agora, o tempo e o espírito do momento jogam a seu favor. Por que razão se haveria de calar? Soares calou-se quando Cavaco era primeiro-ministro?
Não sei o que é mais de espantar, se a irritação presente com o Presidente, se a estupidez originária que levou ao sub-reptício apoio da direcção do PS a Cavaco. Era claro que Cavaco não ia para Belém brincar às casinhas. Ele queria ordenar o país segundo a sua visão, sem ter de aturar a máquina partidária do PSD, que o aborrece de morte. Por outro lado, Cavaco queria e quer ajustar as contas consigo mesmo. Ele sabe que os seus mandatos como primeiro-ministro, independentemente do foguetório e do incenso, foram muito piores do que por aí se diz. Ele sabe que é responsável por muito do pior que aconteceu em Portugal depois da entrada na CEE. Seja como for, Sócrates está à beira de descobrir que é um menino do coro deslumbrado com os seus fatos armani e os seus electronic toys ao pé do velho Cavaco Silva.
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