13/01/08

Pacheco Pereira e o clube dos velhos do Restelo

Não há nada mais pungente que a velhice que não percebe o fim que se aproxima a galope. Quando isso acontece e acontece muitas vezes, o espectáculo tem um estranho sentido para o espectador, um sentido marcado pela vergonha e, ao mesmo tempo, pela comoção: há qualquer coisa que se revela na sua brutalidade, a finitude humana, o que nos comove sempre, como seres finitos que somos, e, concomitantemente, sentimos vergonha pelo espectáculo do protesto contra a inevitabilidade dessa finitude, um protesto que rouba dignidade e apouca aquele que protesta.

Tudo isto vem a propósito do artigo, no Público de ontem, de José Pacheco Pereira, com o significativo título «Os velhos do Restelo contra a West Coast of Europe» (ler o texto no Abrupto). Pacheco Pereira fala de múltiplas águas que correm num sentido comum: o do ataque à liberdade e independência pessoais. Pacheco Pereira elege-se para um restrito clube de que fariam parte também António Barreto e Pulido Valente, clube esse que estaria a ser alvo de malévolas maquinações com vista a diminuir a sua autoridade, e logo a eles que foram campeões da liberdade e da independência.

É possível que existam tais maquinações, é possível que o governo e os actuais gestores do PSD não gostem do clube, é possível que muitos «jovens» comentadores os vejam como «velhos do Restelo». Estou de acordo com a maior parte das coisas que escreve Pacheco Pereira e sei que vai chegar a hora – antes, já chegou – em que as gerações «educadas» pelas reformas da educação vão tomar o poder – político e comunicacional – e impor a sua imensa ignorância e inaudita pesporrência. Tudo isso é verdade, mas…

Há um momento em que as novas gerações querem ocupar o lugar que acham que é o delas e não hesitam, até por uma questão de maior potência hormonal, em correr a pontapé, se preciso for, aqueles que lhe ocupam as cátedras na esfera pública. É um facto que o Bloco Central, de uma forma ou de outra, pretende controlar os estragos que a liberdade e a independência possam produzir, mas Pacheco Pereira não se equivoque. Os estragos que a opinião publicada pode fazer não são tão grandes quanto se suspeita. No fundo, aquilo que ele e os do clube escrevem é partilhado também e apenas por outro clube restrito, o dos leitores de jornais. Parece que são muitos, mas não são.

A questão fundamental é que o tempo de Pacheco Pereira, António Barreto e Pulido Valente já acabou. Não vale a pena esbracejar contra o deus que devora os seus próprios filhos. Os que vêm aí serão menos independentes, menos cultos e mais arrogantes? Talvez, mas é o tempo deles. E não terão sido pessoas como o Pacheco Pereira, António Barreto, Pulido Valente, que forneceram o modelo? Está a chegar, mais uma vez, o momento edipiano da comédia político-comunicacional portuguesa: os filhos preparam-se para matar os pais. Nada de particularmente novo. Para os novos, os sagrados valores dos pais não valem um suspiro, quanto mais uma lamúria. Platão advogava a filosofia como aprendizagem do «morrer e estar morto». Há uma hora na vida em que não resta outra coisa. Foi isso que salvou a honra de Sócrates na altura da execução.

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