19/01/08

Peter Sloterdijk - O fim da fé na educação

A velha social-democracia tinha lançado a palavra de ordem «saber é poder» como uma receita prática e razoável. Ao fazer isto, ela não pensava grande coisa. Ela queria dizer que seria necessário aprender qualquer coisa sólida para ter, mais tarde, uma vida melhor. Uma fé pequeno-burguesa na escola tinha ditado esta máxima. Esta fé está hoje (1981) em decomposição. É apenas nos nossos jovens médicos cínicos que uma trajectória clara conduz dos estudos ao conforto. Quase todos os outros correm os risco de fazer os seus estudos para nada. Quem não procura o poder também não quererá o saber que lhe corresponde, nem as malhas que este tece; recusar os dois é, secretamente, não ser mais cidadão desta civilização. Muita gente não está disposta a acreditar que se deve primeiramente «aprender qualquer coisa» para ter mais tarde uma vida melhor. Vê-se desenvolver nessas pessoas, parece-me, um pressentimento que entre os cínicos antigos era uma certeza: que se deve primeiramente ter uma vida melhor para poder aprender qualquer coisa razoável. A socialização pela formação, tal como ela se pratica neste país (Alemanha – RFA), é estupidificação a priori, após a qual é dificilmente imaginável que uma aprendizagem ofereça ainda uma oportunidade para que as coisas melhorem um dia. A inversão entre viver e aprender está no ar: o fim da fé na educação, o fim da escolástica europeia. Eis o que inquieta, ao mesmo tempo, conservadores e pragmáticos, espreitadores (voyeurs) do declínio e bem-pensantes. No fundo, ninguém acredita mais que aquilo que aprendemos hoje possa resolver os «fenómenos» (problemas) de amanhã; ao contrário, é quase certo que aquilo que aprendemos hoje é de natureza a fazê-los nascer.

Peter Sloterdijk (1987). Critique de la Raison Cynique. Christian Bourgois éditeur, pp. 10/11.

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