Alastra o sol pela manhã, alastra como se fosse uma epidemia, uma dor contagiosa que a tudo toca, aos homens, às coisas, às árvores, a quem dá e depois rouba o império da sombra. Bom dia.
1 comentário:
Anónimo
disse...
Aplaudem-se mega-construções, assobia-se à cultura. Numa atitude snob grita-se a alto e bom som para inglês ver: vamos ser eruditos! Investem-se milhões, gastam-se fundos, criam-se outros ainda e tapa-se o sol com a peneira. E para quê? As pessoas de bem têm de ir a exposições, falam-se de obras de arte que ficam bem com os cortinados. Reduz-se a obra de um artista ao espaço decorativo. Porque afinal, e é bom não esquecer: é bem sermos pseudo-eruditos. Então passa-se tudo por uma pseudónia sociedade. Onde o que conta, não é o que podemos fazer para melhorar, para avançar. Contam as aparências. Há quase uma infantilidade na sociedade, e digo quase, porque o que a infância tem de melhor é a liberdade para mostrar o que realmente somos. Crescemos e tornamo-nos cuidadosos no que somos. Impõe-se padrões e conceitos dos quais não podemos fugir. E infantil ao mesmo tempo, porque depois do primeiro entusiasmo com o brinquedo novo guarda-se ao pé dos outros, que em outros tempos foram o sorriso da criança. E a cultura? O cinema, a fotografia, a pintura e todas as outras artes? São enxotadas para o canto, não vá despertar o bicho pensador da sociedade. Esse monstro que assusta a quem lá do alto ordena. Debrucemo-nos novamente para futilidade das construções, para os efémeros acessos de loucura intelectual. Efémeros, não encontro outra palavra melhor para os descrever. Lançam-se ideias ao vento: vamos construir um cinema, vamos apoiar o cinema alternativo! Aplaude-se mais uma vez, enche-se uma sala desses pseudo eruditos que minam os que realmente pensam. E cria-se um cinema! Depois de festas, e algumas idas a uma sala, onde o que conta não é a comercialização de um corpo feminino -aquele mesmo corpo que preenche uma tela branca e que na realidade com ou sem imagem a tela continua branca. Depois de umas secções de cinema, no real sentido de cinema, já dói a cabeça da sociedade de tentar perceber as falas sem sentido, e o porque daquela pessoa da frente não ter comprado um quadro a condizer com os cortinados. E a sociedade pensa: que falta de gosto! E tudo se torna uma maçada, uma inacreditável descultura cultural. E lá parte a sociedade para outra demanda pseudo qualquer coisa. Porque qualquer coisa serve, do samba à valsa, da arte à decoração, do realmente bom ao realmente mau. A pequena sociedade lá vai, saltando de espaço em espaço, de descultura em descultura, de dor de cabeça em dor de cabeça, do nada para o absolutamente nada. Aquele cinema que era o brinquedo tão querido pelo petit e que os pais lhe deram, provavelmente por descargo de consciência, para que se mostre a criança que se dá o que ela quer, mas que realmente não o é, é posto na prateleira da falta de memória. E que um dia mais tarde é deitado fora.
Escarnecido, abandonado, sofrer mil vezes no tempo. Nada ter, nada poder, nada ser, eis o meu esplendor. (Angelus Silesius, Cherubinisher Wandersmann, II, 244)
1 comentário:
Aplaudem-se mega-construções, assobia-se à cultura. Numa atitude snob grita-se a alto e bom som para inglês ver: vamos ser eruditos! Investem-se milhões, gastam-se fundos, criam-se outros ainda e tapa-se o sol com a peneira. E para quê?
As pessoas de bem têm de ir a exposições, falam-se de obras de arte que ficam bem com os cortinados. Reduz-se a obra de um artista ao espaço decorativo. Porque afinal, e é bom não esquecer: é bem sermos pseudo-eruditos. Então passa-se tudo por uma pseudónia sociedade. Onde o que conta, não é o que podemos fazer para melhorar, para avançar. Contam as aparências. Há quase uma infantilidade na sociedade, e digo quase, porque o que a infância tem de melhor é a liberdade para mostrar o que realmente somos. Crescemos e tornamo-nos cuidadosos no que somos. Impõe-se padrões e conceitos dos quais não podemos fugir. E infantil ao mesmo tempo, porque depois do primeiro entusiasmo com o brinquedo novo guarda-se ao pé dos outros, que em outros tempos foram o sorriso da criança.
E a cultura? O cinema, a fotografia, a pintura e todas as outras artes? São enxotadas para o canto, não vá despertar o bicho pensador da sociedade. Esse monstro que assusta a quem lá do alto ordena.
Debrucemo-nos novamente para futilidade das construções, para os efémeros acessos de loucura intelectual. Efémeros, não encontro outra palavra melhor para os descrever. Lançam-se ideias ao vento: vamos construir um cinema, vamos apoiar o cinema alternativo! Aplaude-se mais uma vez, enche-se uma sala desses pseudo eruditos que minam os que realmente pensam. E cria-se um cinema! Depois de festas, e algumas idas a uma sala, onde o que conta não é a comercialização de um corpo feminino -aquele mesmo corpo que preenche uma tela branca e que na realidade com ou sem imagem a tela continua branca. Depois de umas secções de cinema, no real sentido de cinema, já dói a cabeça da sociedade de tentar perceber as falas sem sentido, e o porque daquela pessoa da frente não ter comprado um quadro a condizer com os cortinados. E a sociedade pensa: que falta de gosto! E tudo se torna uma maçada, uma inacreditável descultura cultural. E lá parte a sociedade para outra demanda pseudo qualquer coisa. Porque qualquer coisa serve, do samba à valsa, da arte à decoração, do realmente bom ao realmente mau. A pequena sociedade lá vai, saltando de espaço em espaço, de descultura em descultura, de dor de cabeça em dor de cabeça, do nada para o absolutamente nada. Aquele cinema que era o brinquedo tão querido pelo petit e que os pais lhe deram, provavelmente por descargo de consciência, para que se mostre a criança que se dá o que ela quer, mas que realmente não o é, é posto na prateleira da falta de memória. E que um dia mais tarde é deitado fora.
Enviar um comentário