A adoração do Menino pelos Reis Magos
A partir da experiência de colocar, durante a quadra natalícia, posts com pintura alusiva ao Natal e festas adjacentes, descobri, embora as fontes utilizadas sejam muito escassas (refiro o excelente museu virtual espanhol Ciudad de la Pintura – “la mayor pinacoteca virtual”, de onde extraí os quadros apresentados), que a representação da adoração do Menino pelos Reis Magos encontra o seu apogeu na arte do Renascimento. Melhor, vai do final do Gótico e transição para o Renascimento até ao final do Renascimento e ao Maneirismo. A partir do Barroco, o interesse pela temática é cada vez menor, encontrando-se muito pouco presente na pintura do século XX.
Esta “descoberta” levou-me à seguinte questão: Porquê este interesse da pintura renascentista pela cena da adoração dos Magos? Ao olhar para as reproduções dos quadros, aquilo que me chamou a atenção foi a sensação de se estar perante uma autocontemplação. O que os quadros apresentam não é tanto a fábula dos Reis Magos, mas uma época que se vê ela própria como uma infância, o Renascimento. Não é o menino-Deus que é adorado, mas o homem que se dobra perante si próprio e se descobre como uma promessa a realizar. O cristianismo continha esta possibilidade absolutamente ateia: a figura do menino é o símbolo do homem do futuro e orienta as ek-stases temporais para esse mesmo futuro: o passado e o próprio presente veneram essa promessa que o futuro realizará.
Nas múltiplas cenas da adoração dos Magos (e a magia não é um dos interesses menores desse Renascimento), Deus encontra-se já evacuado e o homem, com os seus múltiplos interesses, prepara-se para tomar conta da cena do mundo. É aqui (entre o fim da Idade Média e o início da Idade Moderna) que começa a morte de Deus. É um período de longa agonia, mas de uma agonia que não gera dor. Em muitos dos quadros existe uma alegria exuberante, para não falar da exuberância material que se disfarça por detrás de representações de um estábulo arruinado. A maioria daqueles quadros, desde as personagens até aos edifícios, passando pelas vestes, fala apenas e só da época em que foram pintados (talvez não pudessem fazer outra coisa). Fala de uma época que celebra a vitória do homem sobre Deus na adoração de Menino-Jesus. Todo o poder (político e sacerdotal, é isso que representam os Reis Magos) se dobra agora perante a promessa do homem do futuro. A adoração do menino é a marca de um tempo que se julga a si mesmo como o início de grandes coisas, onde Deus deixou de contar e o único protagonista da história vai ser o homem que, enquanto menino, ali é adorado.
O que atormenta, porém, é o que vem depois. O que significará, a partir dos tempos modernos, o contínuo e cada vez mais acentuado desinteresse da pintura pela cena da adoração do menino pelos Reis Magos? Aqui recordo-me daquele quadro de Van Gogh, onde apenas umas botas velhas sem o seu dono são representadas. Será lá, dentro delas, do sítio de onde já saiu o homem, que se esconde Deus?
Esta “descoberta” levou-me à seguinte questão: Porquê este interesse da pintura renascentista pela cena da adoração dos Magos? Ao olhar para as reproduções dos quadros, aquilo que me chamou a atenção foi a sensação de se estar perante uma autocontemplação. O que os quadros apresentam não é tanto a fábula dos Reis Magos, mas uma época que se vê ela própria como uma infância, o Renascimento. Não é o menino-Deus que é adorado, mas o homem que se dobra perante si próprio e se descobre como uma promessa a realizar. O cristianismo continha esta possibilidade absolutamente ateia: a figura do menino é o símbolo do homem do futuro e orienta as ek-stases temporais para esse mesmo futuro: o passado e o próprio presente veneram essa promessa que o futuro realizará.
Nas múltiplas cenas da adoração dos Magos (e a magia não é um dos interesses menores desse Renascimento), Deus encontra-se já evacuado e o homem, com os seus múltiplos interesses, prepara-se para tomar conta da cena do mundo. É aqui (entre o fim da Idade Média e o início da Idade Moderna) que começa a morte de Deus. É um período de longa agonia, mas de uma agonia que não gera dor. Em muitos dos quadros existe uma alegria exuberante, para não falar da exuberância material que se disfarça por detrás de representações de um estábulo arruinado. A maioria daqueles quadros, desde as personagens até aos edifícios, passando pelas vestes, fala apenas e só da época em que foram pintados (talvez não pudessem fazer outra coisa). Fala de uma época que celebra a vitória do homem sobre Deus na adoração de Menino-Jesus. Todo o poder (político e sacerdotal, é isso que representam os Reis Magos) se dobra agora perante a promessa do homem do futuro. A adoração do menino é a marca de um tempo que se julga a si mesmo como o início de grandes coisas, onde Deus deixou de contar e o único protagonista da história vai ser o homem que, enquanto menino, ali é adorado.
O que atormenta, porém, é o que vem depois. O que significará, a partir dos tempos modernos, o contínuo e cada vez mais acentuado desinteresse da pintura pela cena da adoração do menino pelos Reis Magos? Aqui recordo-me daquele quadro de Van Gogh, onde apenas umas botas velhas sem o seu dono são representadas. Será lá, dentro delas, do sítio de onde já saiu o homem, que se esconde Deus?
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