27/02/10
O fechamento em si
Mas o que de mais tenebroso pude assistir foi à intervenção do próprio Estado, através do sistema educativo, na propagação do narcisismo, do autismo, da absorção das crianças e dos jovens em si mesmos. O que é notável neste processo de destruição da vida pública não é o zelo das famílias e o apostolado de certos psicólogos e psiquiatras. O notável é o próprio Estado, que deveria estar preocupado com esta tendência de auto-absorção dos cidadãos, ter sido a principal alavanca do ensimesmamento a que se assiste. A destruição da vida pública nasce pela iniciativa dos responsáveis políticos, como se uma pulsão de morte os habitasse. Não vou perder tempo com exemplos, pois são tantos que o leitor sempre encontrará vários para ilustrar estas afirmações.
Um destino singular
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A canonização de uma insubmissa
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26/02/10
Ketil Bjornstad - Prelude 13
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O espírito de união nacional
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Um espectáculo extraordinário
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Jornal Torrejano, 26 de Fevereiro de 2010
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Marcadores: Jornal Torrejano
25/02/10
Andreas Scholl - Flow my tears (John Dowland)
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Marcadores: Música
Previsibilidades e revoluções
Afinal aquela velha história de Kant, provavelmente um mito urbano da Konigsberg do século XVIII, que contava que as donas de casa acertavam o relógio pela passagem do filósofo, pois ele fazia sempre o mesmo passeio à mesma hora, não é assim tão extraordinária. Pelo contrário. Um estudo na revista Science prova que 93% das movimentações humanas no espaço são previsíveis. Sejam pessoas que fazem centenas de quilómetros diários, sejam aquelas que apenas percorrem algumas centenas de metros, todas têm em comum o facto dos seus percursos serem previsíveis.
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24/02/10
Reforma aos 67 anos
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23/02/10
Salvação
É bem lamentável que esta bela metáfora cristã, «a salvação», seja tão usada e por consequência tão desprezada. Tornou-se um insípido sinónimo de «piedade» e perdeu a sua significação profunda. A «salvação» ultrapassa, aliás, as simples conveniências morais. É um termo que implica um profundo respeito pela realidade metafísica do homem, reflecte o interesse que Deus lhe dá, o amor e o cuidado que Ele tem com o ser íntimo do homem, Seu filho, com tudo o que nele há de divino. Não é apenas a natureza humana que é «salva» pela misericórdia divina, mas sobretudo a pessoa humana. O objecto de salvação é único, insubstituível, incomunicável: é o si mesmo. E este verdadeiro eu interior deve ser retirado, como uma pérola, do fundo do mar, e salvo da confusão, da vacuidade, da imersão no que é vulgar, heteróclito, banal, sórdido, efémero. [Thomas Merton (1963). Semences de contemplation. Paris: Seuil, pp. 36/7]
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22/02/10
Hiromi's Sonicbloom - Deep into the Night
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A questão é entrar
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21/02/10
The Astounding Eyes of Rita
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20/02/10
Justyna Steczkowska & Tomasz Stańko - Egzekutor
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Marcadores: Música
A presença da realidade assusta-nos
Esta imagem grandiosa de D. João II, apesar dos espinhos de que sempre se revestiu a sua evocação para alguns, remonta ao século XVI e às crónicas de Rui de Pina e de Garcia de Resende, tal como, aliás, a ideia de um tempo dourado, insistentemente retomada pela posteridade próxima e distante. No entanto, a ponderação crítica do que hoje se conhece sobre o tema obriga, naturalmente, a matizar a imagem corrente dos anos de ouro do reino de Portugal. Em boa medida, como antes se sublinhou, o pioneirismo da expansão portuguesa para territórios remotos explica-se pela pobreza relativa do reino e pela distância face aos centros de poder da Europa da época. O pequeno território ibérico, que nunca chegou a ser verdadeiramente uma grande potência, teve sobretudo margem de manobra no fim do século XV e no princípio do século XVI, isto é, nos anos anteriores à estabilização de potências europeias de uma outra escala, como foram as grandes monarquias dos Valois, em França, e dos Habsburgo, senhores de territórios por toda a Europa. [Nuno Gonçalo Monteiro, (2009). "Idade Moderna (Séculos XV-XVIII)", in Rui Ramos, Bernardo Vasconcelos e Sousa e Nuno Gonçalo Monteiro, História de Portugal. Lisboa: A Esfera dos Livros, pp. 199-200]
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Em primeiro lugar, refira-se o confronto entre o processo de mitificação do reinado de D. João II, (1455-1495) iniciado já pelos cronistas Rui de Pina (1440-1522) e Garcia de Resende (1470-1536), e a história crítica, a qual se sente obrigada "a matizar a imagem corrente dos anos de ouro do reino de Portugal." Esta imagem dilatada da nossa realidade, uma espécie de idade de ouro à qual se reporta continuamente o sentimento de decadência nacional, é um produto onírico. A sua construção não provém da análise racional dos factos mas de processos fundados na imaginação criadora que recria e engrandece a realidade que sempre foi mais ou menos diminuta ("O pequeno território ibérico, que nunca chegou a ser verdadeiramente uma grande potência").
Para além da importância efectiva de D. João II e da «viragem significativa» que representou o seu reinado, importa realçar como a reflexão sobre um momento decisivo da história nacional é, desde logo, uma des-realização do real e a produção de um sonho, sonho esse que acaba por ser o padrão contra o qual as gerações seguintes vão ser obrigadas a confrontar-se e a medir-se. A uma imagem hiperbólica do reinado de D. João II, a que se aliavam e continuaram a aliar outras imagens hiperbólicas de reinados anteriores, imagens referentes a um passado irrecuperável e não testemunhável, contrapunha-se e contrapõe-se a realidade efectiva, com a sua pequenez, a miséria geral, as elites prepotentes, egoístas e mais ou menos incultas, o estado de dependência e de impotência da maioria da população. A clivagem entre a imaginação sonâmbula do passado e o peso de cada um dos presentes, que se foram vivendo no devir da história, conduziu a uma patologia da vontade.
O ideal que se persegue em Portugal é de tal maneira elevado que a vontade, impotente para o realizar, se sente fragilizada. Nessa fragilidade, ela apenas encontra forças para subsistir, subsistência essa tão bem caracterizada na expressão popular "a gente desenrasca-se". Ninguém sabe, porém, que o ideal é o produto do delírio da razão. As próprias elites, mesmo se aparentemente cultas, acabam por ser o veículo fundamental desse delírio. Veja-se, por exemplo, as ilusões que perpassam na cabeça das elites políticas, das centrais às municipais, e que se consubstanciam em obras faraónicas e desenquadradas das reais necessidades do país e dos concelhos. No fundo, a vaidade dos indivíduos encontra um sólido álibi numa mitologia nacional construída desde há muito. Para além destas elites, que realizam os seus delírios com o dinheiro vindo dos impostos pagos pelos outros e, no caso actual, da União Europeia, a sociedade vive esmagada pelo sonho e incapaz de recentrar a sua vontade em formas de vida realizáveis e à medida das possibilidades de cada momento.
Os portugueses são vítimas de um excesso de imaginação, de uma imaginação presa ao passado. Como essa imaginação não é confrontada com o princípio da razão, ela é incapaz de olhar o presente e fazer dele a matéria da vida. A presença da realidade só pode, então, assustar-nos.
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Equívocos e soarismos
O artigo de Vasco Pulido Valente, no Público de hoje, diz o essencial sobre o equívoco da candidatura de Fernando Nobre à Presidência da República. Vale a pena ler. Sublinho apenas um aspecto. Mesmo contra sua vontade, a candidatura de Fernando Nobre pode servir a um certo soarismo, eu diria ao soarismo tout-court, para fazer eleger novamente Cavaco à Presidência. Contrariamente ao que se pensa, Cavaco Silva chegou à Presidência por decisão de Mário Soares. A candidatura deste às últimas eleições nunca serviu para outra coisa senão para fazer eleger Cavaco e evitar que Manuel Alegre tivesse alguma hipótese de chegar a Belém. Ou alguém imagina que um homem tão experiente como Mário Soares tivesse alguma ilusão sobre as suas possibilidades de vitória? Foi Soares quem colocou Cavaco em Belém. E não vejo razão alguma para que o mesmo Mário Soares, no silêncio da sua consciência e na silenciosa análise que faz da situação política, não queira que Cavaco lá continue. O resto, isto é, aquilo que se diz que cada um (Soares e Cavaco) diz do outro - o pior possível - não passa, mesmo que seja verdade, de mexericos. Soares sempre se achou dono do regime e assim se comporta velando por ele. E Cavaco é muito mais seguro para o regime que Alegre. Por isso, Soares fará tudo para que Alegre não seja o candidato oficial do PS. Veremos se terá espaço de manobra para não ter de apoiar, da boca para fora, a candidatura do seu velho camarada de partido.
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19/02/10
Valentin Silvestrov: silent songs
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Vontade de vomitar
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Marcadores: Sociedade
Começou
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Jornal Torrejano, 19 de Fevereiro de 2010
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Livros no domínio público (Brasil)
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18/02/10
3. libertinagem e conversão
Para concluir a leitura de Justine, de Marquês de Sade, retomo, aplicando-a a um discurso complexo como um romance, a teoria dos speech acts de J. L. Austin, depois prolongada por John Searle. Esta teoria distingue entre actos locucionários, actos ilocucionários e actos perlocucionários. Muito resumidamente, actos locucionários são os actos de enunciação. Neste caso, por analogia, corresponde ao texto produzido por Sade. Os ilocucionários referem-se ao que fazemos quando dizemos alguma coisa. Posso prometer, avisar, constatar uma certa realidade ou facto, narrar um conjunto de peripécias. Do ponto de vista ilocucionário, a Justine é a narrativa de um conjunto de peripécias em torno da personagem. De certa forma, a dimensão ilocucionária foi analisada nos dois posts anteriores.
Falta a dimensão perlocucionária. Esta refere-se àquilo que o auditório de uma comunicação é levado a fazer pela conjugação das acções locucionária e ilocucionária. Dito de outra maneira, o que pode ser levado a fazer aquele que lê este texto? Aqui retomo uma ideia inicial. Ler o texto como se não soubéssemos mais nada dele a não ser aquilo que ele diz, como se não soubéssemos nem quem foi o seu autor nem qual o desenvolvimento das suas ideias. O texto supostamente libertino que temos à frente pode gerar dois tipos de reacções. Aqueles que se identificam com a lei do mais forte e podem considerá-lo como um manual escolar que instrui na via libertina. Estes serão uma minoria, pois o ser humano, na sua globalidade, é uma mistura de animal e de ser racional e moral. A consciência moral, aquele que Kant supunha presente em todos os homens, sente, porém, perante a narrativa de Sade um asco crescente pelas praxis libertinas.
O carácter totalitário, o despotismo, o homicídio, o estrupo, o aviltamento do mais fraco, tudo isso presente nos quadros que Justine narra, acabam por constituir um choque para a consciência moral e ter um efeito contrário à ideologia libertina, uma espécie de vacina. Ler a Justine pode ter mesmo um efeito religioso. O universo irreligioso narrado é tão repugnante que conduz espontaneamente à atitude contrária, como efeito perlocucionário. Se não se soubesse quem era o autor e o desenvolvimentos posterior da sua obra, desconfiaríamos que se estava perante um livro apolegético do cristianismo. O próprio Sade, no texto, prevê isso, pois a irmã de Justine, uma libertina soft, ao ouvir a narrativa das peripécias pelas quais passa a irmã, e após a morte desta fulminada por um raio, converte-se e entra para um mosteiro. Mesmo que este final possa ter sido estratégico, no sentido de fazer passar um mundo libertino sob a capa de um caminho de conversão, a verdade é que o texto de Sade, mesmo sem esse fim, tem um potencial de conversão religiosa e moral que não é aquele a que habitualmente ligamos as obras de aristocrata francês.
Postado por Jorge Carreira Maia à(s) 23:23 0 comentários
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Saberá com quem se está a meter?
Postado por Jorge Carreira Maia à(s) 17:23 0 comentários
17/02/10
Avaliação da experiência Kindle 2
Manuseamento. O Kindle manuseia-se bastante bem, é leve, permite a leitura nas mais diversas situações. A princípio estranha-se o “virar” da página. A tendência é repetir o gesto mecânico inerente aos livros em papel, mas rapidamente nos habituamos a carregar nos botões (PREV PAGE e NEXT PAGE) ergonomicamente situados. A desvantagem reside em ser mais difícil e moroso saltar páginas. Há acesso a um menu que permite ir para um índice, mas muitos dos e-books disponíveis gratuitamente não possuem o índice operativo, isto é, que permite clicar na indicação do capítulo e aparecer no local onde o capítulo se inicia. Nos livros comprados (foram dois) para Kindle, na Amazon, os índices funcionam. Também noutros e-Books gratuitos esses índices funcionam, mas não em todos. O menu permite também ir para determinada localização (location) do livro, mas é necessário saber para onde se quer ir. A sensação ao tacto do aparelho não é desagradável, mas não é papel. É fria e metálica. É também escorregadia, por isso recomendo a compra de uma capa de cabedal. Torna o Kindle mais pesado, mas protege o ecrã e evita que o aparelho escorregue das mãos. Já apanhei, por sorte, o meu no ar, quando experimentava ler sem capa protectora. O miniteclado para introduzir notas e fazer pesquisa é trabalhável. Não estamos a falar de um computador, mas de um livro que permite fazer anotações nele e a partir dele.
Leitura. Incomparavelmente melhor e menos cansativa do que num bom monitor de computador, apesar do ecrã ser pequeno. Tem a vantagem de apresentar seis tamanhos de caracteres à escolha, que vão desde os caracteres para os que vêem bem de mais até aos que precisam de caracteres bem grandes por verem bem de menos. Permite também escolher o número de palavras por linha. Além disto, que para mim é muito mas que encontro no computador, refira-se a qualidade do ePaper e da eInk. De facto, a relação entre o preto dos caracteres e a cor de fundo (que não sei designar) do “papel” é bastante agradável. Não há contrastes que firam a vista. A leitura é, na minha óptica, melhor no Kindle que em papel. Esta é uma grande arma deste tipo de aparelhos relativamente ao iPad, por exemplo. Não sendo retro-iluminado, o Kindle comporta-se como um livro normal. Precisa de luz exterior para ser lido. Ao desaparecer aquele brilho dos monitores de computador a vista é poupada.
Livros disponíveis. Na Amazon.com há mais de 300 mil livros à venda para Kindle, livros com codificação própria e só legíveis no Kindle. Essencialmente em inglês, mas abrangendo um leque alargado de interesses. Há outros sites que vendem também livros que o Kindle lê. Como disse num post anterior, existem milhares de livros gratuitos que o Kindle lê. Os nossos próprios textos podem ser transformados em ebooks lidos pelo Kindle. Mas o universo de livros disponíveis, nas várias línguas, irá crescer exponencialmente nos próximos anos. Os livros em PDF apresentam algumas dificuldades de leitura. Não é possível fazer zoom sobre eles. No entanto, esses livros, se não forem em imagem mas em texto, podem ser convertidos para linguagem que o Kindle lê normalmente, e por isso permite fazer zoom sobre eles. Também os jornais podem ser lidos no Kindle. O Público já está disponível por cerca de 14 dólares mensais.
Trabalho. Vantagens: podemos escrever anotações, colocar bookmarks, sublinhar. Podemos também pesquisar por palavras ou expressões. Esta é uma grande vantagem. Desvantagens: os livros comprados na Amazon.com para Kindle não permitem fazer scanner sobre eles para os trabalhar no computador (uma técnica que utilizo bastante em textos difíceis, para os analisar). Os outros livros disponíveis na internet, mesmo em linguagem legível por Kindle, permitem através de um programa denominado Calibre, fazer conversão para .pdf ou para .rtf e .txt, formatos que o Word lê. Depois é só trabalhar a parte que se quer e acompanhar a leitura no Kindle. Problemas: os livros comprados na Amazon.com não têm páginas idênticas aos livros em papel. Isto levanta um problema em trabalhos académicos, nomeadamente na localização de citações. No entanto, os ebooks têm aquilo que se chama “locations”. Por exemplo, o livro que estou a ler tem 2471 locations e vou na location 632-37. Isto permite referenciar a citação. Não sei, nem procurei, se existe já alguma norma de referência bibliográfica que contemple os ebooks.
Nota final. Um ebook é um óptimo instrumento de trabalho. Poupa a floresta, evita o crescimento desmesurado das estantes numa casa, é amigo do leitor. É possível, porém, que se esteja apenas no início de uma nova forma de conceber o livro.
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16/02/10
O livro do entardecer 40 - entardecer
não sei se o caminho é este
onde canto no silêncio
ou oiço a voz obscura da terra
a zunir num coro de cigarras
se é verão e transpiro de cansaço
não sei a porta por onde entrarás
vestida de vazio e dor
trazendo um vinho já amargo
a pele gasta pelo tempo
que te deixou ser rapariga
nada sei de caminhos e portas
nem de vozes a cantar no silêncio
sento-me na minha cadeira
e é tudo o que tenho para esperar
desde manhã até ao entardecer
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Thomas Tallis - Spem In Alium
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Vai começar a privatização das escolas
É assim que as coisas começam. O PS dá uns passos, abre umas portas. Quando chegar o PSD, e vai chegar relativamente em breve, fará o resto. Nessa altura, o PS protestará, muito de esquerda, muito ameaçador, mas escudado na maioria de direita que toma a decisão, e secretamente contente com o que ele começou. Enquanto não estiver destruído tudo na educação não estão descansados. Ou alguém imagina que a privatização das escolas públicas secundárias serve para outra coisa que não uns "empresários" da educação embolsarem uns dinheiros à conta do contribuinte e da proletarização dos professores? Haverá alguém tão ingénuo que pense que os alunos vão beneficiar alguma coisa?
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O retorno e a imaginação
Portugal estava (século no início do século XV), de facto, entalado entre o poderoso vizinho e o mar, confinado num espaço periférico, um finisterra não apenas em termos do Ocidente europeu, mas até da própria Península. Daí resultava o que chamámos o impasse ibérico do reino. À época, a única via possível para buscar um caminho próprio era o mar. E desde há muito que o mar ocupava um lugar de grande importância na vida do reino. A extensão da costa, a participação directa das populações do litoral em actividades marítimas como a pesca (em largas zonas da orla costeira), a extracção de sal (em Aveiro, no Baixo Mondego, no estuário do Tejo, no Sado) e até a familiarização com o vaivém de embarcações que faziam navegação de cabotagem ligando cidades e regiões costeiras (sendo esse, por vezes, o meio de transporte mais rápido e seguro), tudo concorria para uma relação de proximidade com os elementos marinhos, não só em termos físicos mas também ao nível das representações mentais. [Bernardo Vasconcelos e Sousa, (2009). "Idade Média", in Rui Ramos, Bernardo Vasconcelos e Sousa e Nuno Gonçalo Monteiro, História de Portugal. Lisboa: A Esfera dos Livros, pp. 172]
-------------------
Com o fecho do ciclo imperial, em 1974, Portugal volta a uma situação geopolítica idêntica àquela em que viveu até ao século XV, um finisterra europeu e ibérico. A diferença, porém, é que mesmo o mar deixou, com o fim da ideologia colonial e dos respectivos impérios, de ser caminho para o impasse político do país. A partir de 1974, Portugal está perante si mesmo, dolorosamente só. O apelo à razão, isto é, à confrontação com o que somos efectivamente, porém, é substituído, por duas vezes, pelas operações da imaginação que sublimam a nossa situação. A primeira vez que a imaginação opera é nos próprios acontecimentos de 74 e anos seguintes, no denominado processo revolucionário em curso (PREC). A crença utópica numa sociedade socialista, fora do mundo ocidental onde geográfica e culturalmente pertencemos, ocupou uma largo espaço imaginal nesses anos. Estamos ainda longe de poder compreender o efectivo significado colectivo dessa grande configuração imaginária dos anos setenta.
No entanto, para além de razões puramente fácticas - a longa ditadura, clivagens sociais humilhantes, etc., a figura imaginária da revolução surgiu como sublimação de duas feridas narcísicas insuportáveis. Em primeiro lugar, o país tornou-se efectivamente um pequeno país, reduzido a 90 mil km2 na península e a dois arquipélagos perdidos no mar e de dimensões irrelevantes. A história gloriosa e a pátria grandiosa reduziam-se a quase nada. O PREC foi um analgésico colectivo para a dor da perda. Isto dos dois lados da barricada.
Os que eram favoráveis a uma utópica continuação da guerra encontraram nos actores políticos da descolonização o bode expiatório, na figura da traição à pátria dos revolucionários de Abril, para o fim de uma política colonial sem saída. Mas aqueles que, dentro do PREC, tiveram de fazer a descolonização, ainda que ideologicamente favoráveis ao processo, encontraram no PREC um álibi para tranquilizar as consciências perante o que viria a seguir e para não pensar na nova situação do país reduzido à sua dimensão ibérica.
O PREC foi uma poderosa figura do imaginário colectivo que permitiu à direita e à esquerda, bem como à comunidade nacional no seu todo, evitar confrontar-se com a realidade da nova situação e sublimar as dores que efectivamente o fim do império colonial trouxeram para toda a sociedade. Um dos efeitos mais interessantes deste poderoso filtro da consciência foi a integração dos chamados retornados, portugueses que abandonam os novos países nascidos da descolonização. Por muito dolorosa que a partida de cada pessoa e família fosse individualmente sentida, a sua integração no todo nacional foi praticamente indolor.
Se a mitologia do PREC e da construção de uma sociedade socialista entra rapidamente em decadência, tornando-se obsoleta já nos finais da década de setenta, Portugal encontra uma nova mitologia, um novo trabalho imaginário que o vai dispensar de se confrontar com a sua realidade efectiva. A nova figura da imaginação portuguesa estava já pronta e era uma realidade bem racional na Europa. Essa figura é a CEE. A generalidade dos países que integram o projecto dos seis fazem-no racionalmente. Portugal fá-lo, porém, de uma forma imaginária. Seria interessante analisar os discursos dos vários protagonistas políticos no primeiro lustro dos anos oitenta. O inconsciente colectivo recebe a CEE como um novo espaço mítico que, por si mesmo, resolveria todos os nossos problemas. Seríamos europeus, coisa a que estávamos desabituados há cinco séculos, sem outra necessidade do que a da integração.
A triste história da integração, desde as narrativas delirantes do pelotão da frente até ao descalabro actual, passando pelo pântano, tornam evidentes à saciedade de que a nossa integração nunca correspondeu a um trabalho da razão, mas à sedução proveniente das figuras da imaginação. A CEE serviu para evitar a dor proveniente do confronto com a nossa pobreza ancestral, a falta de recursos, o desprezo pela inteligência, a fragilidade e egoísmo social das elites.
E tudo isto assenta de tal maneira em processos imaginários que o nosso elemento de referência, aquele que foi uma solução para a escassez endémica com que o país sempre se debateu, refiro-me ao mar, foi recalcado, esquecido, abandonado, fora do seu aproveitamento turístico. Com a adesão à CEE, a frota de pesca desapareceu. O que serviu a outros para racionalizar, a nós serviu para destruir, como se a relação com o mar não fosse mais do que um mero sonho. No século XV, o sonho levou-nos mar fora, para outras paragens. Hoje, o mar implica não a fuga, mas a razão, o trabalho, a diligência. Por isso o abandonámos, preferimos alugar camas e a servir refeições a quem passa por cá para olhar o mar com melancolia.
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15/02/10
O livro do entardecer 39 - carnaval
dançam dançam dançam
remadores do rio da morte
dançam braços pernas ao vento
à chuva pesada e fria
dançam na melancolia
dançam no inverno
corpos a baloiçar
a pender do patíbulo
enquanto a vida foge pelo mastro
de onde cristo algum ressuscitaria
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A Igreja e a sexualidade
Postado por Jorge Carreira Maia à(s) 20:31 4 comentários
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José Afonso - Moda do Entrudo
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Morrer de frio
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Carnaval
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14/02/10
O livro do entardecer 38 - nenhum sentido havia
nada sei desse nome soberano
sobre a vida se ergue
e um caminho de pedra rasga
onde tudo era água e areia
ou fogueira onde se aqueciam
as doces raparigas
junho as trazia no regaço
se era triste a tristeza
e o vento falava com a sua voz de sopro
nenhum sentido havia
a não ser o tempo a correr
enquanto o coração batia
aos frágeis indícios
de um inverno por anunciar
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Charles Aznavour - La Boèhme
É um retorno, julgo. Mas não cansa. Isto pertence a uma geração anterior à minha, mas ainda é do meu tempo, como se dizia.
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Uma educação liberal
Postado por Jorge Carreira Maia à(s) 10:17 2 comentários
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13/02/10
Desespero
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2. A lei da natureza e a virtude infeliz
Retomemos a leitura de Justine, de Marquês de Sade. No post anterior foi sublinhada a natureza totalitária dos universos descritos por Sade e referida a sua função arquetípica na história da Europa contemporânea. Esses universos são, por seu turno modelados, na caverna platónica. Em cada uma das situações onde Justine se vê envolvida, tanto as vítimas como os algozes libertinos estão, como os prisioneiros da caverna de Platão, presos, submetidos à força. As vítimas submetidas à violência da coacção física, os libertinos, à violência do desejo.
Que lei rege estas cavernas platónicas? O próprio texto a explicita claramente. Desde ladrões e valetes de quarto a aristocratas, passando por burgueses, religiosos e homens de ciência, como o médico incestuoso, pedófilo e assassino, todas enunciam a mesma legalidade, a de um universo social regulado pela lei da natureza. Esta ao fazer uns fracos e outros fortes estabelece o padrão do que cabe a cada um na vida social. A uns fez fracos e vítimas e a outros, fortes e carrascos. O desejo ou a luta entre desejos, num prolongamento da filosofia de Hobbes e antecipando Hegel e Freud, é crucial na visão de Sade. O desejo liga os homens à natureza e entre si, tornando uns senhores e outros escravos. O desejo é, contudo, a manifestação da razão. A razão natural que se inscreve na capacidade e poder, físicos e intelectuais, com que cada um se apresenta ao mundo. Um prolongamento de certos concepções sofísticas contra as quais pensaram Sócrates, Platão ou Aristóteles.
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Marcadores: Filosofia, Literatura, Pensar, Sociedade
12/02/10
Carinhoso (Pixinguinha/Braguinha) - Paulinho da Viola e Marisa Monte
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Marcadores: Música
Uma sociedade doente
Esta notícia mostra a insanidade a que se chegou em matéria de sexualidade e o tresloucamento que vai na cabeça do legisldor. O rapaz, de facto, portou-se mal ao fazer um filme de um acto sexual privado, uma felação, e o ceder a uns amigos, que fizeram o favor de o espalhar pela escola. Mereceu pagar a indemnização à parceira, mereceria ainda uns bons açoites. Mas a acusação que o levou ao banco dos réus, acusação de acordo com a lei em vigor, revela a doença mental que atravessa as nossas sociedades. O rapaz foi a julgamento, e condenado a uma multa, por crime de pornografia de menores. Ele tinha acabado de fazer 16 anos. Ela tinha 15. Quem faz estas leis? Uma sociedade que instiga, a partir do próprio poder, à sexualidade, à educação sexual nas escolas, que permite todo o tipo de exibição do sexual, depois acha que uma filmagem de um acto sexual consentido entre dois miúdos é pornografia de menores. Se o rapaz fosse condenado por violação da privacidade, seria compreensível. Isto mostra apenas que estamos intoleravelmente doentes. Diga-se, em abono da verdade, que a justiça foi, contrariamente a outras situações, até bastante responsável. Mas o legislador...
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Quem és tu romeiro?
Postado por Jorge Carreira Maia à(s) 22:44 0 comentários
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Jornal Torrejano, 12 de Fevereiro de 2010
Postado por Jorge Carreira Maia à(s) 13:20 0 comentários
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10/02/10
O livro do entardecer 37
a que distância ficam os teus olhos
se a noite cai
e tudo se cala
no fulgor da tempestade
a tardia luz
desce sobre ti
e os teus dedos
são uma colónia
de mágoa e esquecimento
Postado por Jorge Carreira Maia à(s) 23:30 0 comentários
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Elis Regina - Águas de Março
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Um discurso inteligente
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Mau sinal para Sócrates
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Um incómodo
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09/02/10
O livro do entardecer 36 - ave
desfigura-se a casa onde
o coração poisou
a janela aberta
vidro partido
e a ave que um dia chegou
tem nas asas a força do vento
imóvel é uma sombra na parede
o desejo à espera do momento
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