A virtude da honestidade
António Barreto escreveu, ontem, no Póblico o seguinte: «À honestidade aconteceu algo de parecido. A ponto de se considerar que uma pessoa honesta "é parva" e "não sabe da poda". Abundam os lugares-comuns que revelam que a honestidade não é um valor com muita saída. Quem defende a honestidade é considerado "ingénuo". De alguém que perde tempo a escrever sobre a necessidade da honestidade na vida pública se dirá simplesmente que perde tempo com "sermões". De um honesto se garante que nunca será rico nem irá muito longe na política. Um comerciante que não "mete a unha" é palerma. Um corretor de bolsa que não usa informação privilegiada e não manipula os concorrentes é um mau profissional. Um político que, antes das eleições, não esconde as dificuldades, para só as revelar depois de ganhar, é um "tonto" e deveria mudar de profissão. Um empresário que nada oculta aos trabalhadores é um "samaritano" sem killer instinct. Um estudante que copia ou plagia só merece condenação se for descoberto. Aliás, se for "apanhado", a complacência é de rigor.»
Por um acaso, numa das minhas aulas de hoje, a questão da honestidade na actividade escolar foi debatida. A necessidade de não copiar, de não plagiar, de não pedir aos primos licenciados que façam os trabalhos. Enfim a necessidade de evitar a batota, pois ela não só distorce a justiça entre alunos, como torna aquele que faz batota menos apto.
Houve duas coisas que me impressionaram. Em primeiro lugar, impressionou-me a complacência, para não dizer o desprezo, com que muitos alunos encaram o dever de honestidade e probidade intelectuais. Por mais que se explique, do ponto de vista ético e até do ponto de vista da utilidade pura e simples, eles não entendem a gravidade do acto de copiar, de entregar trabalhos feitos por outros, etc. Em segundo lugar, impressionou-me a intervenção de alguns alunos que subliminarmente deram a entender que percebiam muito bem as limitações dos professores para penalizar os alunos batoteiros.
As dificuldade de Portugal não são apenas económicas. As mais graves residem aqui, no desprezo pela honestidade. As escolas deveriam ser um lugar onde o desprezo que a comunidade tem pela virtude da honestidade seria duramente combatido. O que acontece, porém, é que a ideologia oficial manda abrir as escolas à comunidade, o que tem por consequência que a escola acabe por ser soterrada pela maneira como a comunidade vê o mundo e as relações sociais. O que este governo tem feito, ao nível do estatuto dos alunos, é acentuar as anteriores políticas de desresponsabilização das novas gerações, e por isso permitir que uma cultura, onde a honestidade não faz sentido, se solidifique cada vez mais no sistema de ensino.
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