Sócrates, os professores e a delicadeza
Mas será que o engenheiro Sócrates acha que somos parvos? Veja-se a desfaçatez da personagem (Público): "talvez não tivesse havido suficiente delicadeza no tratamento com os professores". Delicadeza suficiente? Uma campanha verdadeiramente negra contra toda uma classe profissional, levada deliberadamente a efeito, uma campanha insultuosa e indigna que nunca se viu no país. Uma campanha que visava isolar os professores e mostrá-los como indigentes à opinião pública, em primeiro lugar, para lhes destruir a carreira que tinham, para proletarizar as novas gerações de professores, e, em segundo lugar, para criar uma escola pública miserável intelectual e cientificamente, uma escola pública destinada à plebe democrática, uma escola pública que assegure a continuação e o aprofundamento das desigualdades sociais. Sim, é isto que está em causa, proteger quem está nos colégios das elites da concorrência dos alunos da escola pública.
Não contente com isso, sem um pingo de vergonha na cara, diz: "Porventura falhámos aí nessa forma de nos explicarmos. Deixar criar a ideia de que nós fizemos isso contra os professores é tão infantil, nunca esteve no nosso espírito. Se isso aconteceu, farei tudo o que estiver ao meu alcance para corrigir isso". Já começo a ficar farto desta cassete, as medidas eram boas, não as soubemos foi explicar. É preciso dizer claramente a verdade: a generalidade das medidas eram efectivamente más e as boas foram mal realizadas. A política educativa foi toda ela um desastre executado num clima de arrogância e de ofensa ao professorado.
Mas as políticas de educação não foram apenas más para os professores. Para os alunos da escola pública elas são um desastre inominável. O Estatuto do Aluno é um hino à irresponsabilidade, as avaliações externas tornaram-se um momento de gargalhada nacional, a não revisão do currículo do 2.º e 3.º ciclos do ensino básico é uma ofensa à inteligência. O clima criado na escola com a avaliação de professores gerou ainda uma mais ampla complacência com a falta de trabalho dos alunos. Sim, os professores foram gravemente lesados por Sócrates e pela socióloga Rodrigues, mas os alunos foram-no ainda muito mais, embora eles e a família não percebam. Nós, professores, arcamos com o prejuízo já hoje, mas os alunos vão arcar com ele no futuro.
As políticas, contrariamente ao que Sócrates e os apaniguados cães-de-fila dizem, foram muito bem explicadas. Todos nós, professores ou não, entendemos o que se queria. O problema não está na explicação, nem no carácter do engenheiro Sócrates ou na idiossincrasia da socióloga Rodrigues. O problema é mesmo as políticas, a prática de engenharia social, o clima deliberadamente criado para isolar os professores, uma das classes mais bem vistas na opinião pública, do resto da população. O que foi feito contra os professores foi arquitectado e pensado. Só que o cálculo dos spin doctors governamentais saiu errado, e a bomba rebentou-lhes na mão. Até esses já não sabem calcular. Precisam de umas Novas Oportunidades, na oposição. Há muitos, muitos anos, que sou um fiel eleitor do Partido Socialista. Não tornarei a votar PS, enquanto persistir na memória um traço desta gente que nos governou nos últimos quatro anos.
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