Percy B. Shelley - Epitaph
Um pequeno poema de Percy Bysshe Shelley, EPITAPH (Epitáfio):
These are two friends whose lives were undivided;
So let their memory be, now they have glided
Under the grave; let not their bones be parted,
For their two hearts in life were single-hearted.
Agora, a tradução:
Estes são dois amigos cujas vidas foram indivisas;
Assim seja a sua memória, agora que deslizaram
Para a sepultura; não separem as suas ossadas,
Pois em vida fiéis foram os seus dois corações.
Nota: O último verso, For their two hearts in life were single-hearted, reclama uma tradução diferente da apresentada. O adjectivo single-hearted pode traduzir-se por fiel, sincero, honesto, etc. Mas podemos pensar de uma forma mais radical e ver nesse termo composto um processo de produção (como se, sublinho o como se, hearted fosse um particípio passado do hipotético verbo to heart, verbo que expressaria a acção de tornar-se coração) de um coração singular, único. É como se a fidelidade ou a sinceridade que se expressa em single-hearted, ambas de natureza dialógica e relacional, se fundassem na auto-produção de um coração único, singular. A fidelidade ou a sinceridade teriam assim o seu fundamento numa comunidade de coração, numa comunhão de afecções. Isto permite traduzir o verso final de Epitáfio assim: “Pois em vida de dois corações fizeram um.” Uma outra possibilidade , ainda mais interessante, seria esta: “Pois em vida os seus corações tornaram-se um.”
A opção por “Pois em vida de dois corações fizeram um” ou por “Pois em vida os seus corações tornaram-se um” liga-se àquilo que se valoriza na leitura poética. A última opção acentua o papel dinâmico da metonímia “hearts” (toma-se a parte, o coração, pelo todo, pelo indivíduo), dinamismo presente no texto de Shelley. São os corações que se tornam, durante a vida, num só. A primeira opção, “Pois em vida de dois corações fizeram apenas um”, introduz um jogo interpretativo onde a “metonímia” é transformada numa metáfora (corações, hearts, agora remeteria para o campo da afecção, para o domínio do sentimento) e são os sujeitos, subentendidos no verso, que operam (fizeram) a metamorfose dos dois corações num único.
Esta opção introduz uma dinâmica racional, uma espécie de razão prática que determina as metamorfoses do afecto, enquanto a manutenção da função metonímica de corações (hearts) liberta o acontecer da fusão dos corações de uma premeditação ou de uma representação racional a priori. Essa libertação é produzida pelo efeito de ocultação que reside na metonímia. Sabemos que a metonímia assenta numa relação de contiguidade entre o tropo expresso (hearts/corações) e o termo que ele substitui (os indivíduos que possuem aqueles corações). Essa contiguidade mantém a relação ao mesmo tempo que a oculta. Esta tensão produz um halo que des-racionaliza o verso, retira-lhe a alusão à vontade (a razão prática), criando uma atmosfera afectivamente dinâmica, que é, julgo, mais fiel ao espírito poético de Shelley.
Leia-se, então, toda a tradução com as duas possibilidades:
Estes são dois amigos cujas vidas foram indivisas;
Assim seja a sua memória, agora que deslizaram
Para a sepultura; não separem as suas ossadas,
Pois em vida os seus corações tornaram-se um.
ou:
Estes são dois amigos cujas vidas foram indivisas;
Assim seja a sua memória, agora que deslizaram
Para a sepultura; não separem as suas ossadas,
Pois em vida de dois corações fizeram um.
These are two friends whose lives were undivided;
So let their memory be, now they have glided
Under the grave; let not their bones be parted,
For their two hearts in life were single-hearted.
Agora, a tradução:
Estes são dois amigos cujas vidas foram indivisas;
Assim seja a sua memória, agora que deslizaram
Para a sepultura; não separem as suas ossadas,
Pois em vida fiéis foram os seus dois corações.
Nota: O último verso, For their two hearts in life were single-hearted, reclama uma tradução diferente da apresentada. O adjectivo single-hearted pode traduzir-se por fiel, sincero, honesto, etc. Mas podemos pensar de uma forma mais radical e ver nesse termo composto um processo de produção (como se, sublinho o como se, hearted fosse um particípio passado do hipotético verbo to heart, verbo que expressaria a acção de tornar-se coração) de um coração singular, único. É como se a fidelidade ou a sinceridade que se expressa em single-hearted, ambas de natureza dialógica e relacional, se fundassem na auto-produção de um coração único, singular. A fidelidade ou a sinceridade teriam assim o seu fundamento numa comunidade de coração, numa comunhão de afecções. Isto permite traduzir o verso final de Epitáfio assim: “Pois em vida de dois corações fizeram um.” Uma outra possibilidade , ainda mais interessante, seria esta: “Pois em vida os seus corações tornaram-se um.”
A opção por “Pois em vida de dois corações fizeram um” ou por “Pois em vida os seus corações tornaram-se um” liga-se àquilo que se valoriza na leitura poética. A última opção acentua o papel dinâmico da metonímia “hearts” (toma-se a parte, o coração, pelo todo, pelo indivíduo), dinamismo presente no texto de Shelley. São os corações que se tornam, durante a vida, num só. A primeira opção, “Pois em vida de dois corações fizeram apenas um”, introduz um jogo interpretativo onde a “metonímia” é transformada numa metáfora (corações, hearts, agora remeteria para o campo da afecção, para o domínio do sentimento) e são os sujeitos, subentendidos no verso, que operam (fizeram) a metamorfose dos dois corações num único.
Esta opção introduz uma dinâmica racional, uma espécie de razão prática que determina as metamorfoses do afecto, enquanto a manutenção da função metonímica de corações (hearts) liberta o acontecer da fusão dos corações de uma premeditação ou de uma representação racional a priori. Essa libertação é produzida pelo efeito de ocultação que reside na metonímia. Sabemos que a metonímia assenta numa relação de contiguidade entre o tropo expresso (hearts/corações) e o termo que ele substitui (os indivíduos que possuem aqueles corações). Essa contiguidade mantém a relação ao mesmo tempo que a oculta. Esta tensão produz um halo que des-racionaliza o verso, retira-lhe a alusão à vontade (a razão prática), criando uma atmosfera afectivamente dinâmica, que é, julgo, mais fiel ao espírito poético de Shelley.
Leia-se, então, toda a tradução com as duas possibilidades:
Estes são dois amigos cujas vidas foram indivisas;
Assim seja a sua memória, agora que deslizaram
Para a sepultura; não separem as suas ossadas,
Pois em vida os seus corações tornaram-se um.
ou:
Estes são dois amigos cujas vidas foram indivisas;
Assim seja a sua memória, agora que deslizaram
Para a sepultura; não separem as suas ossadas,
Pois em vida de dois corações fizeram um.
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