14/01/10

Terramotos e pensamento



O terramoto de 1755 em Lisboa, devido às suas funestas consequências, teve uma influência enorme sobre o pensamento filosófico europeu da altura. A desmesura do acontecimento dava que pensar e servia mesmo para abalar certos fundamentos de algumas filosofia então em voga. Não irá acontecer o mesmo com recente terramoto no Haiti, como aliás não aconteceu com outros anteriores. O terramoto do Haiti comove-nos e gera em nós compaixão, mas não abala a nossa maneira de pensar. Curiosamente, é a expansão e rapidez dos media bem como as explicações científicas que nos protegem desse acto de pensar.

Os media, ao mostrar continuamente as cruas imagens de todas as tragédias que se sucedem, evacuam o carácter excepcional de cada uma delas e transformam-nas no hábito e numa norma peculiar - o que acontece é aquilo que é natural acontecer. A ciência, por seu turno, ao explicar as causas materiais do acontecimento tranquiliza o espírito. A nossa comoção e a nossa compaixão não nos perturbam, nem levam ninguém a pensar, pois tudo era expectável, pelo menos é aquilo que sentimos quando ouvimos, a posteriori, as sábias palavras dos sismólogos. O espanto perante o acontecer, aquilo que leva ao pensamento, está morto, mesmo que a fotografia que apresentamos mais acima dê demasiado que pensar.

2 comentários:

estela disse...

o pior mesmo é vivermos ávidos dde tais rápidas compensações. ninguém aguenta tanto sofrimento. dantes imaginava-se a coisa, recebiam-se notícias más com imenso desfasamento temporal e a maioria dos desastres do mundo não eram enviados como informação em tempo real para todo o mundo. suponho que grande parte da avidez acima referida é também a necessidade de salvaguardar a própria existência (ainda que a custo de todas as outras): bastariam 24 de tais imagens de todo o sofrimento e toda a maldade do mundo enviadas em tempo real para o meu cérebro, para arderem no meu cérebo - e no meu coração - todos os fusíveis.

mau mesmo, é haver tanta gente que nem se dá conta disso.

ah, vim cá fazer uma visita, porque quem está a dar husserl merece uma atenção especial ;)

cumprimentos

Jorge Carreira Maia disse...

Estela, muito obrigado pela visita e pela atenção especial,

jcm