13/01/10

Educação e a falácia de Vital Moreira


Como eu não frequento o blogue e sou um pouco retardatário em muitas coisas, só hoje, e por um mero acaso, descobri este post do Prof. Vital Moreira, no Causa Nossa. Confessa ele que está fora do coro que aprova o acordo entre a Ministra da Educação e os Sindicatos de Professores. Um direito inalienável, reconheço eu. Consta também, e isto não é ironia, que é um brilhante constitucionalista e professor de Direito. Será. No entanto, parece-me bem frágil no domínio da lógica. Diz ele: «Com o acordo, quase todos os professores chegam ao topo da carreira com o decurso do tempo, mesmo os que nunca passem do mediano e corriqueiro "bom" na avaliação, o que não tem paralelo em nenhuma outra carreira no sector público (muito menos no privado evidentemente). É como se todos os militares tivessem garantida a chegada a general, ou todos os funcionários públicos a subida a assessor principal.»

Quando se raciocina por analogia é necessário que aquilo que é comparado, e que funda a analogia, seja comparável. A falácia do Prof. Vital Moreira reside em estabelecer uma analogia entre a carreira de professor e a carreira da função pública ou a militar. Nestes casos, a diferenciação na carreira deve-se, efectivamente, a que essas pessoas vão desempenhando funções diferentes a que cabem responsabilidades diferentes e compensações diferentes. Na função docente, por muito estranho que pareça a um professor universitário, desempenha-se do início ao fim da carreira a mesma função. Sou professor há 25 anos e aquilo que me é distribuído como trabalho é praticamente o mesmo que me era atribuído quando comecei a leccionar. As diferenças que eventualmente existam não justificam uma carreira à parte. Estou desconfiado que o Prof. Vital Moreira deve ter alguma noção disto, e só por mera distracção se deixou envolver em tão grosseira falácia.

Por que razão existe uma carreira tão longa? Não deveriam todos ganhar o mesmo? Para além da compensação da experiência, o que determina essa espécie de evolução salarial, a que de forma infeliz se chama carreira docente, é os fracos recursos económicos do país. O que seria justo, dentro daquilo que se faz nas escolas, é que em vez de 10 patamares existissem uns 3, e que um professor atingisse o topo da carreira relativamente cedo.

Mas o Prof. Vital Moreira faz parte, ou parece, fazer parte daqueles que, muito preocupados com o défice orçamental, acham que são os professores do ensino não superior que o deverão pagar. Mas para que a sua preocupação com o défice tivesse sentido e pudesse ser escutada pelos professores do ensino inferior, ele deveria defender uma reorganização da carreira dos universitários com efeitos idênticos, embora proporcionais, àquela que, com o anterior governo, se abateu sobre os professores não superiores. E para ganhar credibilidade, deveria propor um corte do seu salário idêntico ao do primeiro-ministro irlandês. Assim, mesmo apesar da falácia no raciocínio analógico, eu seria capaz de entender o Prof. Vital Moreira. É desagradável ter de tratar de questões de mercearia, mas às vezes não pode deixar de ser.

1 comentário:

Anónimo disse...

Na realidade, quando se atinge o topo está-se na decadência. A não ser que consigamos ter a lucidez e a tranquilidade de um sábio ancião que soube acompanhar os tempos, o que duvido, pois há um desgaste específico que não se compadece com quem enveredou pelo ensino. Por outro lado, a geração ruidosa que temos criado vai acelerar essa decadência. Imagino que já se conte com isso no acordo das cotas. Todavia, para quem se empenhou por progredir na relação pedagógica, só pode dar vivas de felicidade a este acordo!!! No meu caso, se só precisava de uns 4 anitos para atingir o topo, agora só preciso de uns míseros, no mínimo, 16 anos!

Não se economizaria também na despesa pública se se revissem as carreiras dos senhores secretários de estado, ministros, assessores, directores departamentais, presidentes da câmara e toda respectiva logística, imóvel e móvel?