19/01/10

Cavaco e a fé na educação


Uma questão de fé ou de pura ideologia. O Presidente da República, no que deverá ser acompanhado por um séquito sem fim e de todas as cores, acha que a "educação é um dos maiores investimentos que nós podemos fazer na nossa juventude", e acrescenta: "É um investimento no progresso do nosso país e um dos investimentos mais rentáveis que uma nação pode fazer”.

Já em 1979, o historiador e crítico social Christopher Lasch escrevia, em The Culture of Narcissism: "A extensão da escolarização formal a grupos anteriormente dela excluídos é um dos desenvolvimentos mais surpreendentes na história moderna. A experiência da Europa Ocidental e dos Estados Unidos nos últimos 200 anos sugere que a educação de massas fornece um dos principais fundamentos do desenvolvimento económico, e por toda a parte, no resto da mundo, os modernizadores tentaram copiar a proeza ocidental, levando a educação às massas. A fé nos prodígios da educação provou ser uma das mais duráveis componentes da ideologia liberal, facilmente assimilada por ideologias no resto hostis ao liberalismo. No entanto, a democratização da educação pouco fez para justificar esta fé. Nem melhorou a compreensão popular da sociedade moderna, elevando a qualidade da cultura popular, nem reduziu a separação entre riqueza e pobreza, que permanece tão grande como sempre. Por outro lado, contribuiu para o declínio do pensamento crítico e para a erosão dos padrões intelectuais, forçando-nos a considerar a possibilidade de que a educação de massas, como os conservadores sempre argumentaram, é intrinsecamente incompatível com a manutenção da qualidade educacional." [Christopher Lasch (1991). The Culture of Narcissism - American Life in An Age of Dimishing Expectations. New York: Norton, pp. 125]

Embora, Lasch tenha uma aproximação ao problema menos ingénua do que os conservadores, não deixa de apontar um problema que ninguém, literalmente, quer ver e muito menos discutir. Será que há uma correlação entre o crescimento da escola de massas e o desenvolvimento civilizacional, nomeadamente o crescimento económico? Cavaco, como Sócrates e todos os outros que fremem e salivam quando se fala de educação, diz aquilo que o senso comum instalado diz e quer ouvir. Com isso, porém, evita-se enfrentar o problema real, aquele que está ligado à falência dos sistemas educativos, ao crescimento do abismo entre ricos e pobres, à morte do pensamento crítico e da alta cultura, isto é, à morte do espírito.

1 comentário:

Miguel e Rita Clara disse...

Perdoe a ingenuidade mas após 20 anos de projectos e contactos com crianças e jovens, acredito que a centelha dispara até entre as ervas daninha...
Passo a descontruir; não é certo que as classes abastadas possuam mais curiosidade ou mais capacidades, por isso permito-me continuar a achar que a educação deve ser ampla e destinar-se a incluir todos, mas incluir deveria querer dizer convidá-los a entrar num espaço especial, de cultura, engenho, saber e arte, infelizmente, a inclusão tem sido feita transportando para o lugar de culto o pior que o mundo vomita, assim,de facto, perpetuam-se as diferenças.
O tédio inerente ao sentimento de superioridade é doentio nalgumas camadas sociais supostamente mais diferenciadas.
Talvez pudéssemos também pensar acerca da relação entre poder, dinheiro e cultura. A iliteracia das classes dominantes não é novidade, e refiro-me numa perspectiva histórica, a novidade é terem aprisionado a educação, depois de supostamente a terem resgatado do domínio da Igreja, agora é do domínio do Estado...
A morte d alta cultura e do pensamento crítico foram consequência do barulho...
O ruído instalado dede a pop art elevou quase tudo á condição de o/abjecto cultural, a difusão da opinião individual (como faço agora aqui) transformou todos em pretensos "fazedores de opinião", acredito que se escutarmos o silêncio saberemos que o pensamento crítico não poderá estar morto, apenas refugiado e sem ligação á rede...