31/01/10

As minhas virtudes preconceituosas

(Imagem daqui)


Quando se é novo, e estamos convencidos de que não temos preconceitos, é a altura em que somos mais preconceituosos, pois julgamos os nossos preconceitos como se fossem evidências universais. Se temos a sorte de amadurecer, coisa que não acontece a muito boa gente, descobrimos que afinal essas evidências eram pouco evidentes e a sua universalidade, muito particular. Isto é meio caminho para eliminar um conjunto de preconceitos nefastos para a vida social e o respeito pelos outros, ao mesmo que tempo que se aprende a transformar outros preconceitos em virtudes individuais.


Ontem, por uma questão premente de horários, fui ver o filme de Michael Haneke, O Laço Branco, ao Corte Inglês. Quando vou ao cinema em Lisboa, por norma, vejo os filmes numa daquelas cadeias onde não existe possibilidade de comer pipocas. É um dos meus preconceitos virtuosos ou uma das minhas virtudes preconceituosas. Percebo que em muitos dos filmes que passam nas salas de cinema o melhor mesmo são as pipocas, mas o filme de Haneke não é entretenimento - horrível espanholismo -, mas um filme denso e duro, um filme que contrasta com a leveza das pipocas.


O que me surpreendeu ontem, eu que não estou habituado a salas com pop-corn, foi a idade dos pipoqueiros, gente que se aproxima perigosamente da minha idade. Não, não eram jovens modernos formatados na cultura americana. Era gente que estudou ainda no tempo em que a cultura francesa era o guia irremediável da nossa desgraça ou, quanto muito, a severa Inglaterra era o contraponto do acordeão parisiense. Como se vê, gente, ao contrário de mim, capaz de se adaptar aos novos tempos, gente despreconceituosa, capaz de aliar a leveza do que come ao peso do que vê. E eu saí do cinema, jurando que, fosse qual fosse o horário, não mais iria a uma sala pipoqueira. Por uma questão de preconceito estético.

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