01/01/09

O estranho caso do estatuto dos Açores

O estranho caso do estatuto dos Açores é um bom indicador sobre uma série de coisas da nossa vida política. Em primeiro lugar, mostra que os partidos políticos da área da governação estão já, na sua generalidade, tomados por gente despida de qualquer sentido de Estado. A humilhação de Cavaco Silva e a satisfação dos baronatos ilhéus deveram-se a um puro e simples cálculo eleitoral. Sócrates e os profissionais da política que superintendem aos destinos do PS calcularam qual seria a menor perda eleitoral e agiram em conformidade. Que esse cálculo fira os fundamentos do Estado é indiferente a esta gente que governa ou pretende governar o país.

Que seja absurdo tornar mais complexa a dissolução de uma assembleia regional do que o parlamento nacional é uma coisa que não incomoda a generalidade dos nossos deputados e a totalidade dos governantes. Mas isso significa que aqueles a quem foi confiada a defesa do nosso Estado-Nação pouco ou nada já se preocupam com ele. Este episódio é mais um numa lenta caminhada que visa a destruição do Estado-Nação.

O episódio mostrou ainda uma outra coisa: a irrelevância política de Cavaco Silva. O Presidente da República está pura e simplesmente isolado, é uma espécie de alma-penada que habita ali para os lados de Belém. Não tem tropa de choque no terreno (o PSD, para além de não morrer de amores pelo seu antigo líder, está esfrangalhado), nem tem nada a oferecer a quem lhe possa arranjar alguma. Cavaco Silva poderia ter evitado a humilhação, calando-se e promulgando logo o diploma. Preferiu o papel de vítima sacrificial. Talvez o tempo lhe venha a dar razão.

Por fim, este acontecimento alerta-nos para o problema da regionalização. Eu já fui defensor do processo, mas os últimos anos têm-me mostrado que isso seria um desastre. Este episódio é lapidar quanto ao desastre que será a regionalização do país. As futuras regiões de autarquias passariam, através das manigâncias partidárias como a que está na base do novo estatuto dos Açores, a baronatos poderosos que devorariam a unidade nacional e rasgariam um dos mais velhos, se não o mais velho, Estado-Nação do mundo.

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