30/01/09

Modernidades, famílias e o Prof. Cavaco

O Professor Cavaco Silva é um homem probo, dedicado ao bem público, sensato e, entre as gentes da política, alguém que ainda possui crédito perante o país. Mas esta coisa de transformar um mero tesoureiro em monarca é coisa que não funciona. Na sua fronda contra a nova lei do divórcio, o Presidente diz: "Não é um sinal de modernidade a dissolução progressiva dos laços familiares". Isto é uma prova que um economista, professor universitário em Economia, não tem de perceber o que quer que seja da realidade social provocada pelo desenvolvimento económico. Alguém deveria explicar ao Professor Cavaco que não é a lei do divórcio que dissolve progressivamente os laços familiares. O que dissolve os laços familiares é o fim das sociedades tradicionais, a crescente autonomia dos indivíduos e, acima de tudo, o desenvolvimento económico moderno. A proletarização, que recomeçou, a precariedade laboral e a mobilidade exigida pela eficiência da empresa económica capitalista, bem como a necessidade dos membros da família trabalharem em espaços muito diferentes contribuem decisivamente para a "dissolução progressiva dos laços familiares". O que Cavaco Silva não consegue compreender é que aquilo que ele defende para a economia provoca necessariamente aquilo que ele não gosta ao nível da família. A lei do divórcio é apenas um produto superestrutural fundado na infra-estrutura da vida económica, para falarmos à maneira de Marx. E se este falhou rotundamente nos prognósticos sobre o futuro da história e a bondade do comunismo, não deixou de ser genial na análise do capitalismo. Umas leituras do Marx mais filosófico dariam, então, ao senhor Presidente alguns belos motivos de meditação e evitariam que dissesse, em público, aquelas coisas que ficam mal a um universitário, ainda por cima Presidente da República, dizer. De facto, a dissolução dos laços familiares é um sinal claro da modernidade tardia. A lei do divórcio, um subproduto da modernização económica.

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