1 Porém Jesus se foi ao monte das Oliveiras. 2 E pela manhã cedo tornou ao Templo, e todo o povo veio a ele: e assentando-se, ensinava-os. E trouxeram-lhe os Escribas e Fariseus uma mulher tomada em adultério: 4 E pondo-a no meio, disseram-lhe: Mestre, esta mulher foi tomada no mesmo feito, adulterando. 5 E na Lei nos mandou Moisés, que as tais apedrejadas sejam; Tu pois que dizes? 6 E isto diziam eles, atentando-o, para que tivessem de que o acusar. Mas inclinando-se Jesus, escrevia com o dedo em terra. 7 E como perseverassem perguntando-lhe, endireitou-se, e disse-lhes: Aquele que de vosoutros sem pecado está, [seja] o primeiro que pedra contra ela atire. 8 E tornando-se a inclinar, escrevia em terra. 9 Porém ouvindo eles [isto,] e redarguidos da consciência, saíram-se um a um, começando dos mais velhos até os últimos; e ficou só Jesus, e a mulher que no meio estava. 10 E endireitando-se Jesus, e não vendo a ninguém mais que a mulher, disse-lhe: Mulher, aonde estão aqueles teus acusadores? Ninguém te condenou? 11 E disse ela: Ninguém, Senhor. E disse-lhe Jesus: Nem eu também te condeno; vai-te, e não peques mais. [Jo 8, 1-11]
Lembrei-me desta passagem de João, por causa de um texto de Henrique Raposo no Expresso de hoje:
Em “Desonrada” (Livros do Brasil), a paquistanesa Mukhtar Mai conta a sua história sinistra. Aldeia, começou a circular o seguinte boato: o irmão mais novo de Mai terá namoriscado, sem permissão, uma rapariga do clã superior. Em resposta, o tribunal da aldeia decretou que, para compensar o crime do irmão, Mai deveria ser violada pelos homens do clã superior. E assim foi.
Convém ter em atenção que esta misoginia bárbara não atinge apenas os cantos mais obscuros do Islão. Junto do chamado ‘Islão moderado’ também encontramos casos semelhantes. Em “Despedaçada” (Campo das Letras), a franco-marroquina Touria Tiouli descreve como foi presa por ter sido violada no Dubai. É isso mesmo cara leitora: Tiouli foi violada por três gandulos, e as autoridades, em vez de perseguirem os violadores, acusaram Tiouli de “relações sexuais fora do casamento” um crime gravíssimo no moderníssimo Dubai. A vida das mulheres muçulmanas é, de facto, um “monte de sarilhos”. [Henrique Raposo, Expresso, 24/01/2009 ]
Como se sabe, em certas zonas dominadas pelo Islão, o castigo, ainda hoje, para o adultério é a lapidação (o que mostra a filiação do islamismo na tradição judaica). Do ponto de vista da consciência dos direitos individuais, isso representa um atraso relativamente ao Cristianismo de cerca de dois mil anos. Nestas histórias edificantes, há duas coisas que me deixam perplexo. Em primeiro lugar, a obsessão das religiões, ou de certas religiões, com o sexo. Mesmo o catolicismo actual não deixa de viver obcecado com a sexualidade e as práticas sexuais das pessoas. Em segundo lugar, o olímpico desprezo de Cristo pelo assunto. Cristo pergunta à mulher: ninguém te condenou? E perante a resposta negativa, responde-lhe: Nem eu também te condeno; vai-te e não peques mais. Como se dissesse, não me aborreçam mais com histórias de sexo. Eu tenho mais que fazer do que tratar de psicanálise.