A comédia do insucesso escolar
O Público de hoje traz uma reportagem sobre o flop dos chamados planos de recuperação dos alunos. A reportagem merece ser lida, não tanto pelo que diz, mas por aquilo que deixa suspeitar. É evidente que os planos são burocráticos e que os professores não estão preparados para lidar com o assunto, pois essa preparação nunca lhes foi dada como deve ser. Também é verdade que não existe uma tipificação das dificuldades de aprendizagem, nem se conhece medidas testadas que permitam obviar a essas dificuldades. No entanto, tudo isso apenas pode servir para ocultar uma outra realidade.
Essa outra realidade surge claramente expressa no editorial do Público. Cito:
«Por muito que haja planos, professores destacados e escolas com computadores Magalhães, a luta a que a anterior ministra da Educação se propôs dificilmente dará grandes resultados enquanto os pais não encararem a escola como um activo imprescindível. Ou enquanto as reprovações não forem vistas como um anátema social que merece censura. Agora, que se prepara uma reflexão sobre o que correu mal, talvez valha a pena reflectir sobre se a prioridade dos planos está na escola ou no meio que a envolve.»
Se há cinco anos tivessem perguntado aos professores onde se encontra o problema essencial do insucesso escolar, eles teriam explicado que era aqui mesmo, na importância que, efectivamente, famílias e alunos dão à escola. Se essa pergunta tivesse sido feita há 10, 15 ou 20 anos, a resposta teria sido exactamente a mesma. Há muito que os professores sabem onde se encontra o problema. Há muito que o Ministério da Educação, cheio de preconceitos, acha que não deve escutar os professores e continuar a lutar contra moinhos de vento, inventar uma burocracia inenarrável, cuja finalidade prática é desmotivar os professores e condenar milhões de alunos ao insucesso escolar e na vida.
Se este Ministério da Educação continuar a acreditar que a parte de leão do problema está dentro das escolas e não fora delas, coisa que me parece ser o que vai acontecer, os professores só podem esperar o pior. Novas ondas de burocracia, novas ilusões e novas acusações. Por muito que contrarie o eduquês instalado, a burocracia ministerial e os interesses que colonizam as escolas, o que, em primeiro lugar, tem de mudar é a relação da sociedade e dos alunos com a escola. A partir daí, tudo começaria a fazer sentido. Mas quem quererá afrontar uma parte dos eleitores dizendo claramente que a sua atitude é irresponsável? É preferível que a comédia continue.