13/11/08

Também outros sonharam assim o paraíso

George Pierre Seurat - Final Study for "A Sunday Afternoon on the Island of La Grande Jatte"

Também outros sonharam assim o paraíso
e viram na água uma prova de Deus
e nos barcos a esperança ondulada
de uma eterna felicidade.

Naqueles tardes de domingo,
onde uma angústia azeda
se inscreve na lentidão dos corpos,
vinham homens e mulheres e crianças
olhar de tão perto aquele lugar
e todos se julgavam já imortais,
mesmo se havia sombrinhas
nas mãos e cães por ali a farejar.

São assim, de água e sol, os nossos paraísos.
Ali vemos homens, e se os pintamos
como deuses, logo chegam os cães
a latir pela tarde dentro ou a rosnar
como se aquele jardim fosse o seu
e o nosso paraíso, não mais do que
um belo lugar onde pudessem urinar.

1 comentário:

maria correia disse...

Caro JCM, gosto bastante deste «Também outros sonharam assim o paraíso», com a ressalva de, embora entanda o que quer dizer com «cães», não consigo aceitar a palavra que representa este animal como um símbolo do mal...talvez chacais...é que, se há animal que melhor represente o que poderia ser a vida no paraíso, com homens e tudo, e mulheres e crianças, é o cão. Não há animal mais dócil e meigo, não há ninguém, ninguém, no mundo, que nos receba sempre com um sorriso sempre novo e deslumbrado, quando chegamos a casa, cansados da viagem, do que um cão. Não há animal mais compreensivo e fiel e amigo e companheiro. nem o cavalo, outra das maravilhas terrenas...sempre tive cães, tenho um cão, agora mesmo, aqui ao pé, que me observa com olhar amorável enquanto traduzo. Tudo perdoam. Tudo esqucem sempre prontos a demonstrar o amor que sentem pelo amigo. Morrem sobre a nossa sepultura, de tristeza. Procuram-nos até aos confins do mundo.

Permita que coloque aqui o poema que Byron dedicou ao seu cão Terra-NOva, que jaz a seu lado:


When some proud son of man returns to earth,
Unknown to glory, but upheld by birth,
The sculptor's art exhausts the pomp of woe
And storied urns record who rest below:
When all is done, upon the tomb is seen,
Not what he was, but what he should have been:
But the poor dog, in life the firmest friend,
The first to welcome, foremost to defend,
Whose honest heart is still his master's own,
Who labours, fights, lives, breathes for him alone,
Unhonour'd falls, unnoticed all his worth--
Denied in heaven the soul he held on earth:
While Man, vain insect! hopes to be forgiven,
And claims himself a sole exclusive Heaven.
Oh Man! thou feeble tenant of an hour,
Debased by slavery, or corrupt by power,
Who knows thee well must quit thee with disgust,
Degraded mass of animated dust!
Thy love is lust, thy friendship all a cheat,
Thy smiles hypocrisy, thy words deceit!
By nature vile, ennobled but by name,
Each kindred brute might bid thee blush for shame.
Ye! who perchance behold this simple urn,
Pass on--it honours none you wish to mourn:
To mark a Friend's remains these stones arise;
I never knew but one,--and here he lies.

e não esqueçamos o ditado: «quanto mais conheço os homens, mais gosto dos cães.» Além disso, não foram os cães que destruíram o Paraíso. Foi Adão e Eva e toda a humanidade.