16/07/08

A teia do ISCTE

Pedro Abrantes é um sociólogo que pertence ao Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do ISCTE. Hoje o Público dá à estampa uma carta sua onde se insurge contra a ineficácia, injustiça e anacronismo das reprovações escolares. Apoiado em estudos que tem desenvolvido, argumenta que o que está na base do desempenho negativo dos alunos não é a falta de estudo mas a sua origem sócio-cultural. Argumenta também que a reprovação apenas conduz a que o aluno estude cada vez menos. Adiciona a tudo isto os habituais dados da OCDE e os milhões de euros do erário público gastos no exercício.

Até aqui tudo bem. Esperemos que os estudos possuam fiabilidade científica, pelo menos aquela que se poderá esperar de uma área como a sociologia. Só há dois pormenores que tornam a coisa um pouco desagradável. Em primeiro lugar, há uma crítica aos críticos da escola “facilitista”, onde o sociólogo faz gala do seu purismo lexical e sublinha a incongruência de não só se usar um vocábulo inexistente, “facilitista”, como os dados apontarem que a escola portuguesa é a mais difícil da OCDE (onde há mais retenções). Veio tomar partido. Em segundo lugar, advoga aquilo que parece ser prática de outros países (não indica quais, nem que práticas) e que se percebe ser a intencionalidade do actual Ministério da Educação: «Diversos países europeus já chegaram a essa conclusão e têm substituído as reprovações por sistemas diversificados de acompanhamento e apoio aos alunos com menor aproveitamento, o que não conduziu a mais indisciplina nem a menos estudo. Pelo contrário.» Mais uma vez veio tomar partido.

De tudo isto, cabe dizer o seguinte: o problema não está no acompanhamento desses alunos, mas na eficácia desse acompanhamento e do empenho que alunos e famílias dão a esse esforço suplementar da instituição escola; também está em causa a ideia de um currículo idêntico para todos os alunos, pelo menos com a amplitude que existe neste momento; em terceiro lugar, há qualquer coisa de tenebroso neste tipo de discurso. Uma coisa é dizer que os estudos indicam a falência dos modelos usados relativamente à reprovação de alunos, bem como a das explicações das causas do insucesso. Outra coisa, porém, é a partir daí indicar o caminho político que se deve seguir. Como todos sabemos, com os mesmos estudos poderemos indicar várias políticas diferentes e todas elas fundadas nessa «objectividade científica». Poder-se-ia, por exemplo, argumentar que o trabalho com os alunos retidos não é o mais adequado, ou que o sistema não fornece alternativas reais ao equilíbrio da decisão dos professores em fazer transitar ou reter um aluno, etc. Depois, como o leitor mais atento não deixará de perceber, surge implícita a conexão ISCTE-ME a fazer-nos pensar numa teia de afinidades electivas, digamos assim. Bem, yo no creo en las brujas, pero que las hay, las hay…

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