Exodus - XXIII
Quando a face lhe floriu estava rubra.
Um fogo consome, no cume do monte,
a caruma pela vida ali amontoada.
Inocente ainda era e desenhava fábulas
no papel pardo, noutros dias alguém o usava
para ensopar óleo e logo o deitar fora.
Quando na rua gritavam, se gritos
se ouviam, eram quimeras o que desenhava,
a cabeça de leão a urrar e do corpo
uma cabra descia, se da cauda um fogo
se desatava. Eram dias de fervor
e no jardim as rosas murchavam, enquanto
os caminhantes que caminham no caminho
semeavam luzes e terrores, folhas murchas
entre ervas secas pelo vento,
da serra caía, frio e invernoso mesmo se
quente era o verão. Não havia procissões,
nem touradas, nem gente a uivar pela estrada.
Apenas uma pele delicadíssima escondia os dedos,
e luzia, cobria de vozes a solidão.
Inocente ainda era e compunha palavras,
as sílabas delicadas e em cada letra punha
uma pedra de cinza e uma mágoa fatigada.
Jorge Carreira Maia (2007). Exodus.
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