Exodus - XXI
Eram tecedeiras. No vagar teciam longas horas,
obscuras sombras tudo cobriam e na voz
rouca, voz era o que se ouvia, enchiam
os minutos de suspeitas, a lama
a crescer num inverno de dedos cruzados,
os olhos negros no fundo do rosto, a vida vendida
a retalho, a mercearia de tulhas já vazias.
Os cereais tinham acabado e nada restava
onde os braços pudessem mergulhar as mãos,
assim os terminavam. Pela noite, soltava-se
um instinto mortal e elas vogavam pelas casas,
cabelos soltos a tocar os seios descaídos,
uma ânsia de assassínio no canto da boca,
ou a solidão a aplanar o caminho do coração.
O que ferir alguém que morra, morrendo morrerá…
A noite avançava incólume na escuridão
sem estrelas, onde tudo abrandava, e a morte
cansada deixava a carne em frágil decomposição.
De olhos cerrados adormecia como se sonhasse
impérios desfeitos, camisas de seda,
ou o branco véu, à noiva no altar cobre.
Jorge Carreira Maia (2007). Exodus.
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