10/03/08

Insónia

Na insónia, descobre-se a estranha e radical alteridade do corpo. O espírito e a vontade ordenam o sono, mas o corpo em tumulto invade o pensamento e gera rios infinitos de pensamentos. São pensamentos insones, pensamentos não pensados, mas impostos pelo devir heraclitiano dos humores corporais. O corpo rola na cama, mas a cabeça não pára no atafulhamento que o corpo, esse grande inimigo dos santos, lhe impõe. A insónia vem, por norma, devagar, instala-se como quem não quer a coisa, sugere temas a merecer meditação ou urgente e clara resolução. Aqui já está tudo perdido e ao insone resta-lhe abdicar da sua vontade, agora manifesta em toda a fragilidade, e levantar-se e espreitar a noite que corre decidida para a manhã. Na insónia, descubro-me como dois e ao levantar-me confesso a minha incapacidade de soldar com firmeza essas partes de mim.

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