Sobre pintura e desenho de Gustav Klimt - Um
Gustav Klimt - Allee im Park von Schloß Kammer, 1912 [Avenida no parque do palácio de Kammer]
Um
As janelas fechadas prenunciam o silêncio do Inverno
e sob os enlaçados ramos vejo-te caminhar
como uma promessa de primaveras, um dia chegarão;
e haverá crianças a correr pelo parque
e vendedoras de cerejas e pássaros poisados pela relva.
Até lá não saberei o teu nome nem aquele que me deste
quando me recostei no tronco carcomido,
abrigo de insectos e fungos e plantas parasitas,
e sonhei que te via passar na avenida
para entrar por aquela porta
e, no paraíso que então te cabia,
assomares à janela para agitar um lenço branco,
como se me despedisses antes de me saberes,
ou acenasses a alguém que fora do enquadramento
pelo olhar por ti chamasse.
Se me pudesses ouvir, ensinar-te-ia, um a um,
o rumor das cores, e deixar-te-ia aprender
em meus dedos o cálculo das horas,
a sombra a mim sempre o traz.
Por vezes, oiço ao longe pássaros, julgo,
mas apenas vejo cães de olhar raivoso,
presos em correntes de ferro, cães mutilados
que me entram pelos olhos
e me roubam a imagem que de ti
retenho, a branca imagem de um lenço
acenado à janela do paraíso.
Se o teu braço preso ao meu caminhasse
avenida fora, costas voltadas para a porta,
sairíamos os dois do quadro
e chegados ao mundo onde não há paraísos
nem janelas nem lenços brancos a acenar,
comprar-te-ia cerejas
para que na tua boca ficasse lento e
irremediável o sabor da minha.
Jorge Carreira Maia, Sobre pintura e desenho de Gustav Klimt, 2008
Um
As janelas fechadas prenunciam o silêncio do Inverno
e sob os enlaçados ramos vejo-te caminhar
como uma promessa de primaveras, um dia chegarão;
e haverá crianças a correr pelo parque
e vendedoras de cerejas e pássaros poisados pela relva.
Até lá não saberei o teu nome nem aquele que me deste
quando me recostei no tronco carcomido,
abrigo de insectos e fungos e plantas parasitas,
e sonhei que te via passar na avenida
para entrar por aquela porta
e, no paraíso que então te cabia,
assomares à janela para agitar um lenço branco,
como se me despedisses antes de me saberes,
ou acenasses a alguém que fora do enquadramento
pelo olhar por ti chamasse.
Se me pudesses ouvir, ensinar-te-ia, um a um,
o rumor das cores, e deixar-te-ia aprender
em meus dedos o cálculo das horas,
a sombra a mim sempre o traz.
Por vezes, oiço ao longe pássaros, julgo,
mas apenas vejo cães de olhar raivoso,
presos em correntes de ferro, cães mutilados
que me entram pelos olhos
e me roubam a imagem que de ti
retenho, a branca imagem de um lenço
acenado à janela do paraíso.
Se o teu braço preso ao meu caminhasse
avenida fora, costas voltadas para a porta,
sairíamos os dois do quadro
e chegados ao mundo onde não há paraísos
nem janelas nem lenços brancos a acenar,
comprar-te-ia cerejas
para que na tua boca ficasse lento e
irremediável o sabor da minha.
Jorge Carreira Maia, Sobre pintura e desenho de Gustav Klimt, 2008
1 comentário:
Que coisa maravilhosa, JCM! Bravo!
Uau!
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