Sobre pintura e desenho de Gustav Klimt - Quatro
04 - Gustav Klimt - Schloß Kammer am Attersee I, um 1908 [Palácio de Kammer, no Lago de Atter I]
Quatro
É num espelho de água que o mundo se revê
e no leve ondulado que o vento traz
tudo se torna belo como num conto de fadas.
Aí, nessas águas imaculadas, desceu o senhor
e tomou das mãos da terra um baptismo de água.
Todos os pecados lhe foram perdoados
e as árvores, como anjos, entoaram
no musgo da tarde canções de júbilo.
Se havia um mistério, não o sei,
oiço, porém, a voz do sino; na torre,
branca torre de igreja, repica chamando os fiéis,
que abandonam os campos,
largam os animais ao vento
e seguram em suas mãos os chapéus,
velhos chapéus de camponeses,
para entrar no sussurro da igreja.
Lá fora, fica apenas a luz do sol
a incendiar as águas, a vestir de cor
os arbustos delicados que escondem do olhar
a vida furtiva de quem no palácio
vê os dias como um rio que corre.
Ao longe, tão ao longe,
já fora do universo que o quadro mostra,
ouve-se o grasnar rouco dos corvos.
Anuncia a tarde e depois o crepúsculo
até que a noite se abata sobre o lago
e as águas, agora um poço fundo e negro,
deixem de reflectir o mundo,
tão pobre que assim se apaga.
Jorge Carreira Maia, Sobre pintura e desenho de Gustav Klimt, 2008
1 comentário:
interessante a ideia de um mundo que vive ao reflectir-se nas águas onde um dia um homem-deus se purificou, purificando esse mesmo mundo, em que o sol é uma estrela que o faz viver, a esse mundo. Pela noite, tudo se apaga. Bravo!
Enviar um comentário