05/03/08

Educação, uma janela de oportunidade

Num post anterior comentámos o sentido da revolta dos professores do ponto de vista destes. Mas o que significará toda esta convulsão que abala o mundo da educação? Ele significa o derruir de um sistema que está há muito minado por amplas contradições. O igualitarismo ideológico que se confronta com a diversidade dos alunos, o currículo uniforme a par com a ideologia da diferenciação, um sistema centrado na produção de alunos para a universidade a emparelhar com um discurso da escola voltada para a vida activa, a necessidade de gerar gente mais bem preparada gémea da necessidade de passar o maior número possível (o chamado combate ao insucesso escolar). A estas contradições estruturais adicione-se a constante produção de reformas, de alterações curriculares e a contínua produção de uma legislação ciclópica. Alunos e professores foram as grandes vítimas dos equívocos ideológicos que, chegados do estrangeiro, começaram a ganhar substância com a reforma de Veiga Simão e que não pararam até hoje. É aqui que começa um desastre absolutamente inaudito.

As reformas educativas portuguesas sempre foram motivadas não pelas necessidades da sociedade portuguesa e da escola portuguesa, mas pelos modelos externos que enxameavam e enxameiam a imaginação dos detentores do poder educativo. A dinâmica reformista continuamente fez tábua rasa da realidade social portuguesa, dos alunos e das famílias existentes e dos próprios professores disponíveis. As reformas eram e são feitas para alunos, famílias e professores que não existem, para servir uma sociedade que ela mesmo não existe e não pode ser criada pela escola. Os modelos externos que sempre nos guiaram e que se apresentavam como ideais estavam também longe da perfeição que se pretendia com eles introduzir na educação portuguesa. Quarenta anos a projectar uma escola para uma realidade que não existe só pode desembocar numa explosão.

Esta explosão poderá ser rica para o país, se se conseguir discutir seriamente uma forma de dar coerência ao sistema educativo, adequando-o à realidade portuguesa. Uma maioria absoluta teria sido o momento para esse debate e essa clarificação. O que se viu, porém, foi mais do mesmo, agora revestido com uma autoridade quase sem pudor e um desprezo, que faz lembrar certo discurso populista de rua, pelos professores. Se houvesse talento político no Ministério da Educação, estávamos, com esta revolta, perante uma extraordinária «janela de oportunidade» para dar um caminho à educação em Portugal. O que todos suspeitam é que o talento político do ministério da educação se esgotou nos truques baratos que visaram dar uma péssima imagem dos professores como forma de legitimar socialmente o sacrifício de que estes foram vítimas. Pelo que assistimos nos últimos dias, o mais provável é que será esse comportamento de truques baratos que pautará, nos próximos tempos, a acção da actual equipa governativa. É uma pena.

1 comentário:

maria correia disse...

Pois, foi ver a invasão de cursos de Gestão de Empresas, a partir dos anos oitenta, por aí afora, qualquer escola escolinha instituto ou faculdade lá tinha o seu cursito de Gestor...a vaga vinha dos Estados Unidos, Management, management makes the world go round...acabou por haver mais gestores do que empresas, mas a gente não sabia disso, por cá, não sabia que Portugal era pequenino demais para tanto curso de gestão...