04/10/08

A minha desrazão II

Num post anterior referi o sentimento desagradável que tinha perante a referência de Jean-Claude Trichet, a propósito da crise financeira, à II Guerra Mundial. O carácter desagradável do sentimento intensificou-se com as afirmações israelitas de que a Coreia do Norte teria fornecido meios a seis países do Médio Oriente para estes construírem armas de destruição em massa. Independentemente da parcialidade das afirmações dos israelitas, a verdade é que há vontade política no Médio Oriente para obtenção dessas armas e, por certo, também haverá vontade em fornecer-lhas, de forma mais ou menos discreta. Os sinais são preocupantes, muito preocupantes, desde há alguns anos. Mais, essa preocupação só pode aumentar quando esses sinais provêm de múltiplos lados e de diferentes patamares da realidade (economia, política, religião, cultura). Aquilo que pressinto mais do que vejo, na leitura dos acontecimentos mundiais, é uma erosão contínua do Ocidente, erosão essa que começou de forma muita lenta, mas que se tem vindo a tornar cada vez mais rápida. Não creio que o problema seja económico. A falta de vitalidade do Ocidente é a muitos níveis e aquilo que temos visto, ao nível dos desafios político-militares, até agora são apenas e só pequenos ensaios para testar a capacidade de resposta ocidental.

Houve um acontecimento decisivo que me levou, já há muitos anos, a dar atenção a alguns problemas inusitados e que pouco interessavam o comum dos mortais. Esse acontecimento foi a revolução iraniana de Khomeiny, nos anos 70, e a instauração de uma teocracia. Na altura, fiquei de boca aberta. E tentei perceber algum do pensamento que estava por trás do episódio. Aquilo que fui descobrindo, ao longo destes anos, está longe de me tranquilizar. A intranquilidade cresce à medida que o poder militar e económico do Ocidente entra em declínio (no outro dia Pulido Valente pediu desculpa a Mário Soares por o não ter levado a sério quando este começou a falar no declínio dos EUA). A intranquilidade intensifica-se quando muitas das políticas ocidentais têm contribuído para erosão do seu poder e atinge o paroxismo perante a descrença da opinião pública sobre a possibilidade de agravamento drástico da situação. Há muitos anos que percebi que o estado de guerra é a natureza das relações internacionais (obrigado Zé pelo Levinas). A paz - e toda a paz é uma paz particular (a paz ocidental ou a paz oriental ou… ou…), isto é, a paz sob condição de uma potência dominante - só se assegura pelo medo. Essa foi uma das lições, embora sem novidade, da Guerra-Fria. Eu creio, talvez por ser ocidental, que a paz ocidental é mais justa e mais pacífica e mais respeitadora das liberdades do que qualquer outra. Não faltará quem discorde de mim.

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