06/10/08

Afinal, a culpa é da moral

Tem-se assistido, devido à crise financeira mundial, a um certo retrocesso da louvação do capitalismo e uma crítica acerada às políticas económicas provenientes da era Reagan. Mas o capitalismo, aquele que está em crise, encontra os seus defensores. Henrique Raposo, no útimo Expresso, faz a apologia do que se tem passado, criticando a criação do bode expiatórios (sejam eles e cito «“os bandidos da Wall Street”, os políticos e as sociedades ocidentais»). O curioso é a lição maior que o articulista tira: «A maior lição desta crise não está ao nível da regulação institucional dos mercados, mas sim ao nível da auto-regulação que cada indivíduo deve possuir perante a tentação do crédito. Eis, portanto, a conclusão mais dolorosa: o capitalismo permanece de pé, mas estamos a descobrir que ter casa não é para toda a gente. Em 2008, morreu a democratização da propriedade através do empréstimo bancário.»

Extraordinária lição. Imagine o leitor que perante uma onda avassaladora de crimes, onde as instituições de segurança se impedissem de interferir e regular a segurança dos cidadãos, viesse alguém dizer que o principal problema estava ao nível, não da acção política, mas da auto-regulação que cada indivíduo deve possuir perante a tentação do crime. Isto é para levar a sério? Mas como é possível não responsabilizar todos aqueles que induziram, com interesses e ganhos evidentes, pessoas que não podiam cumprir os seus compromissos a comprar casa? Parece que os culpados de uma derrota militar são os cozinheiros. Os generais e a estrutura responsável é que não pode ser responsabilizada e muito menos a ideologia subjacente, ou a estratégia seguida. Pensar que o problema é moral (auto-regulação dos indivíduos) é querer iludir-se e iludir os outros. O mercado deixado a si-mesmo tal como aconteceu gerou a situação em que vivemos. Agora diabolizar os milhões de pobres que se deixaram tentar pelos cantos de sereia dos gestores inovadores parece ser, assim, um acto de profunda inteligência e compreensão da natureza dos homens e uma óptima solução para o que se está a passar. O melhor ser prendê-los a todos, aos que ficaram sem casa, por atentado à moralidade. Ao mesmo tempo deve-se gratificar infinitamente a gestão política ocidental por se ter demitido da fiscalização e regulação da economia e promover todas as administrações das instituições falidas.

1 comentário:

maria correia disse...

Essa análise do senhor Raposo é uma análise de bebé, não tem pés nem cabeça. AS pessoas foram marteladas anos e anos com «tome dinheiro», «compre», «cartão de crédito», «adquira a casa dos seus sonhos» com uma publicidade insistente até à exaustão, criando-se uma mentalidade, que a classe política fomentou também, de «quem não compra casa não é ninguém». O ataque aos bolsos do cidadão foi avassalador, mas não se deu por nada,pensava-se que o sistema capitalista estava a ser bonzinho...emprestava dinheiro a todos...Ah, a vã glória de possuir seja o que for, até um apartamentozeco nos subúrbios, construído com betão 70, o que significa que a casa terá uma duração de 70 anos...o sistema «obrigou» à compra. Aliás, o sistema obriga a quase tudo menos à felicidade e à liberdade.