Hannah Arendt e a crise no ensino
«A segunda ideia-base a tomar em consideração na presente crise tem a ver com o ensino. Sob influência da psicologia moderna e das doutrinas pragmáticas, a pedagogia tornou-se uma ciência do ensino em geral ao ponto de se desligar completamente da matéria a ensinar. O professor — assim nos é explicado — é aquele que é capaz de ensinar qualquer coisa. A formação que recebe é em ensino e não no domínio de um assunto particular. Como veremos adiante, esta atitude está, naturalmente, ligada a uma concepção elementar do que é aprender. Para além disso, esta atitude tem como consequência o facto de, no decurso dos últimos decénios, a formação dos professores na sua própria disciplina ter sido grandemente negligenciada, sobretudo nas escolas secundárias. Porque o professor não tem necessidade de conhecer a sua própria disciplina, acontece frequentemente que ele sabe pouco mais do que os seus alunos. O que daqui decorre é que, não somente os alunos são abandonados aos seus próprios meios, como ao professor é retirada a fonte mais legítima da sua autoridade enquanto professor. Pense-se o que se pensar, o professor é ainda aquele que sabe mais e que é mais competente. Em consequência, o professor não autoritário, aquele que, contando com a autoridade que a sua competência lhe poderia conferir, quereria abster-se de todo o autoritarismo, deixa de poder existir.»
Hannah Arendt, "A Crise na Educação". Tradução de Olga Pombo, in Olga Pombo (org.), Quatro Textos Excêntricos. Relógio d’Água (2000).
Isto foi escrito há 50 anos. Arendt referia-se à crise do ensino norte-americano. Nos anos 80, quando todo o descalabro provocado pela pedagogia, pela psicologia e pelas ciências da educação era coisa velha nos EUA, Portugal enviou um generoso grupo de professores para Boston, onde fizeram uma espécie de mestrado, que permitiu a esse grupo de pessoas, a pouco e pouco, assenhorear-se, ideológica, política e praticamente, da educação em Portugal. Foi assim que importámos todo o lixo que gerou a confusão enorme que é o sistema educativo português. Lixo, porque nos anos 50 já toda essa ideologia era vista como responsável pela crise do ensino americano. E essa gente é tão poderosa, os seus interesses são tão fortes, que só podemos esperar, a cada ano que passa, que tudo piore.
Hannah Arendt, "A Crise na Educação". Tradução de Olga Pombo, in Olga Pombo (org.), Quatro Textos Excêntricos. Relógio d’Água (2000).
Isto foi escrito há 50 anos. Arendt referia-se à crise do ensino norte-americano. Nos anos 80, quando todo o descalabro provocado pela pedagogia, pela psicologia e pelas ciências da educação era coisa velha nos EUA, Portugal enviou um generoso grupo de professores para Boston, onde fizeram uma espécie de mestrado, que permitiu a esse grupo de pessoas, a pouco e pouco, assenhorear-se, ideológica, política e praticamente, da educação em Portugal. Foi assim que importámos todo o lixo que gerou a confusão enorme que é o sistema educativo português. Lixo, porque nos anos 50 já toda essa ideologia era vista como responsável pela crise do ensino americano. E essa gente é tão poderosa, os seus interesses são tão fortes, que só podemos esperar, a cada ano que passa, que tudo piore.
2 comentários:
Uma bela introdução histórica. Aqui está a vassoura para limparmos o lixo educativo importado.
Creio que era isso.
No seu "saber" (na sua área) o professor (na escala antiga de 0/20) podia "valer" 3 ou 4. Mas feitas as "pedagógicas" (em síntese assim se chamava a cadeira, salvo erro), estava preparado para a sua função "em ensino"...
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