30/09/07

Raiz de Maio - VI Uma raiz de silêncio

Uma raiz de silêncio
cavalga a espuma.

Uma raiz de morte
cresce no sulco da vida.

Uma raiz de névoa
incendeia o sol de bruma.

Uma raiz de Maio
é lua avara e desmedida.

Jorge Carreira Maia, A Raiz de Maio (1993)

Menezes, o debate político, a regionalização e o inferno

Ouvi as elucubrações de Marcelo Rebelo de Sousa sobre a vitória de Menezes no PSD. Há duas coisas que merecem referência. A primeira, a não existência, durante a campanha, de debate político. Marcelo evitou explicar porquê. Mas a resposta é fácil: Sócrates esgotou os temas que o centro-direita poderia discutir. Sócrates faz e faz à direita e faz melhor do que o PSD alguma vez fez, mesmo o de Cavaco. A segunda liga-se à sibilina referência ao bloco central de interesses. Aí vai acontecer uma coisa interessante: a regionalização. Menezes é um óptimo aliado de Sócrates para regionalizar o país. Eu, em abstracto e em princípio, nada tenho contra o facto, até votei a favor no último referendo. Agora, porém, que estou mais velho, a coisa não me cheira tão bem. Ver o país repartido por gente tipo Jardim, Menezes, etc., sejam de esquerda ou de direita, faz-me uma certa comichão. A tentação política de regionalizar é grande, pois é necessário dar ocupação à malta dos partidos. Se nós vivêssemos no centro da Europa eu aplaudia de pé a ideia, mas em Portugal... A eleição de Menezes, só por este facto, pode tornar-se um inferno para o país. Aguardemos.

No PSD, ganhou o Sporting

Cheguei de fim-de-semana e eis que descubro que o Luís Menezes é o chefe do PSD. Pronto, no PSD, ganhou o Sporting. Talvez daqui a pouco, depois de ouvir o professor Marcelo, me apeteça dizer mais alguma coisa. Não sei se Portugal me deprime, se me diverte.

Luz da Normandia - VI

28/09/07

Raiz de Maio - V De Maio o silêncio

De Maio o silêncio,
a voz surda ao cantar.
De Maio a dor,
o vento queima ao soprar.

De Maio a terra seca,
um olhar de cio e mágoa.
De Maio a morte e a raiz,
o metal ardente ao sair da frágua.

De Maio o gesto cansado,
o Verão iluminado e sem fim.
De Maio a terra e o sol,
o sílex a crescer no fundo de mim.

Jorge Carreira Maia, A Raiz de Maio (1993)

Falácias educacionais – 1. A abertura da escola à comunidade

Uma das ideias correntes, na vulgata educacional que corrói os sistemas educativos, é a da importância da abertura da escola à comunidade. Mas será a ideia virtuosa? O que acontece, por norma, com essa abertura é qualquer coisa de inesperado. A escola abandona o seu ethos e a sua deontologia para absorver os da comunidade em que existe e reproduzir, dentro do ambiente escolar, aquilo que é vivido fora da escola.

Sendo assim, o desiderato de a escola ser motor de mudança social e possibilitar a ascensão social dos mais desfavorecidos é uma ilusão. Pelo contrário, a escola torna-se mera reprodutora das desigualdades existentes na sociedade. Escolas em comunidades cultas e ricas reproduzirão esses ambientes, escolas em comunidade pobres económica e culturalmente reproduzirão essa indigência.

A teoria da abertura da escola à comunidade, na prática, tem por finalidade assegurar que os que têm vantagens sociais e culturais as mantenham. Não passa de um embuste, que uma governação decente deveria erradicar da escola pública.

Música para o fim-de-semana: Keith Jarrett - At The Blue Note

Para este fim-de-semana propõe-se uma longa viagem à música de um dos grandes pianistas de Jazz da actualidade, melhor de um dos grandes pianistas de Jazz de sempre: Keith Jarrett. O CD que se propõe é uma box de seis CD, com o título de Keith Jarrett at The Blue Note. O repertório é constituído por um conjunto de standards, mas não só. O trio é composto, para além de Jarrett, pelo baterista Jack DeJohnette e pelo Baixo Gary Peacock.

A box é editada pela ECM, claro, no ano da graça do Senhor de 1994. A gravação ocorreu entre 3 e 5 de Junho de 1998. Os seis cd’s oferecem 38 faixas, das quais não vale a pena fazer qualquer comentário.

No vídeo, um standard “Autumn Leaves”.



Jornal Torrejano, 28 de Setembro de 2007

Fora do plano quinquenal ou do plano de fomento fica a opinião, não planeada, do JT. O boxe de Hélder Dias, no cartoon semanal. José Ricardo Costa escreve O Internacional, Miguel Sentieiro, A senhora do elevador, Santana-Maia Leonardo, Política criminal ou criminosa, Carlos Nuno, Nova Dita-Dura, Carlos Henriques, Seis pontos, Pinto Correia, Assumo e este blogger com o artigo herético O retorno ao cristianismo.
Por hoje chega, que estou no intervalo de almoço.

Crónicas Normandas II - No cemitério alemão

É um cemitério quase vazio, pontuado apenas por alguns visitantes. Dos que perdem, a memória desvanece-se mais rapidamente. O silêncio da derrota, matizado pela luz da manhã e pela névoa sombria que do mar sempre vem, entranha-se no visitante, abre-lhe o espírito à angústia, dá-lhe uma sensação de compunção inexplicável. Há um estreito caminho de lajes rodeado de campos relvados, onde aos mortos foi dada a última casa. Assim se caminha em direcção a um monumento em louvor do soldado desconhecido, daqueles que, para além da vida, perderam também o nome, o segredo da identidade, o fio ténue que os ligava a uma história, a uma tradição, à terra longínqua onde nasceram, para virem morrer nos campos da Normandia.

Todo o cemitério está pensado segundo uma racionalidade geométrica, como se, depois da aventura da desrazão nazi, os alemães tivessem sentido a necessidade de voltar aos fundamentos da razão moderna, à natureza matemática que a habitava. É um cálculo vindo das trevas o que ali se encontra, o produto de uma ilusão, a transformação da violência do combate e do pânico da morte – sim, entre todos os que ali estão sepultados, haveria algum que, no mais fundo de si, não sentisse esse pânico? A falência da ordem normal da vida, que todo o combate traz, não acenderia nas suas almas uma angústia inexplicável, mesmo se esquecida na hora de mostrar a coragem? – numa paisagem de recolhimento meditativo, num jardim onde o visitante espera ver monges a passear, de espírito recolhido, enquanto aguardam a revelação do deus.

Por vezes, há uma flor deixada na campa que ostenta um nome, um nome que ainda alguém reconhece como sendo da família, talvez um amigo querido que por ali ficou, um companheiro de escola, um namorado que não chegou nunca ao tempo das núpcias. Mas tudo é tão raso, um mar de campas, muitas delas ocupadas por dois viajantes, que juntos, quem sabe se não se odiariam, entraram para a viagem eterna de onde não se retorna. O barqueiro que a todos recolhe não faz acepção de nomes, nem de ódios ou amores, junta movido pela lei do capricho que habita no frio coração que é o seu. Aqui e ali, segundo um obscuro desígnio arquitectural, erguem-se conjuntos de cruzes de Malta, cinco cruzes, sublinhando a esperança da ressurreição ou o mero anúncio do retorno silente dos alemães à casa da cristandades, esquecidas as pulsões heróicas da mitologia bárbara que os animava durante a guerra. Nem Odin, nem as valquírias, apenas a humilhante cruz do Cristo.
Quando saio, deparo com dois enormes livros. São, à maneira de um apocalipse judaico, suprema ironia, os livros dos mortos. Neles se inscreve o nome daqueles que ali estão sepultados e ainda lhes restaram os traços caligráficos da identidade. Namenbuch, o livro dos nomes, diz cada um deles. Tremo perante a visão e olho-os de longe. Tenho vontade de os folhear, acariciar as capas, mas a mão pára. Uma voz diz-me: e se lá estiver o teu nome?

Luz da Normandia - V

27/09/07

Raiz de Maio - IV Um animal transbordante nasce em tua mão

Um animal transbordante nasce em tua mão
e naquele sangue leve e antigo
abre-se uma ferida na raiz do coração.

Jorge Carreira Maia, A Raiz de Maio (1993)

D. Francisco Chimoio, a SIDA e o sexo

O arcebispo de Maputo, D. Francisco Chimoio, acusou dois países europeus de estarem a matar a população africana. Não só os anti-retrovirais para combate ao HIV estariam infectados, como os preservativos seriam fabricados propositadamente com o vírus da SIDA. Este delírio persecutório assenta na tradicional obsessão dos altos dignitário da Igreja Católica com o sexo fora e dentro do casamento. A única solução para a SIDA seria “casamento, maridos fiéis às suas mulheres… jovens que se abstêm de ter relações sexuais.” Mas tal preocupação, fundada numa mentira, da casta sacerdotal católica não parece ser mais do que um sintoma do mundo lúbrico que, recalcadamente, a habita. Depois queixam-se de que a Igreja perde influência.

A bravata de Santana Lopes

Anda, por essa blogosfera fora, muita gente alvoraçada com a «digna» e «corajosa» atitude de Santana Lopes, perante a interrupção de uma entrevista sua para dar um directo da chegada de Mourinho a Portugal. Recontextualizemos a coisa.

A atitude de Santana Lopes não pode ser lida no plano da honra pessoal, pois não é essa que está em causa, mas deverá sê-lo no plano político. Ora, neste plano, Santana Lopes tudo tinha a ganhar com a bravata. O povo, mesmo o povo da SIC-NOTÍCIAS, não gosta muito dos políticos, mas ainda gosta menos dos jornalistas. Santana Lopes age explorando esse sentimento com a finalidade de amealhar notoriedade política, que como se sabe anda pelas ruas da amargura. Basta ver as reacções, até em blogues de esquerda, para se perceber que a atitude foi eficaz. Santana Lopes de político desprezado e humilhado passou a D. Quixote da classe política, o único que os tem no sítio, blá, blá, blá, aquele que salva a honra dos condutores da polis. Grandeza na atitude? E se o vocábulo for eficácia política, não será a realidade melhor descrita?

Santana Lopes, por outro lado, é dos políticos que menos autoridade tem para fazer aquilo que fez. Mourinho é um homem do futebol, mas não serão a política e um ex-primeiro-ministro mais importantes do que a chegada de um treinador desempregado? Num país normal, eu diria que sim, mas em Portugal tenho dúvidas. Não foram os próprios políticos que contribuíram para a sobre-relevância do futebol? Não são eles que estão sempre à coca para se colarem aos feitos desportivos? Não os utilizam como forma de legitimação política? Não foi Santana Lopes que, com Fernando Seara, contribuiu, enquanto comentador das coisas da bola, para essa sobre-relevância? De facto, por acção dos homens políticos, incluindo aí Santana Lopes, a chegada do senhor Mourinho é mais importante do que aquilo que possa dizer um ex-primeiro-ministro sobre o caos que vai pelo seu partido. Se tivesse sido, por exemplo, Rui Rio, eu acreditaria na genuinidade da atitude.

As reacções favoráveis percebem-se bem. Ou são amigos do dr. Santana Lopes, ou são políticos despeitados com o poder dos media. O que aconteceu na SIC-NOTÍCIAS é o espelho do país. Mas nisso Santana Lopes e muitos outros não têm as mãos limpas. Foram eles que contribuíram para se chegar onde se está: a irrelevância da política, a sacralidade do futebol. Santana Lopes não passa de um sacerdote que perdeu os fiéis, enquanto Mourinho ainda é um profeta e um grande taumaturgo, por enquanto.

O caso Esmeralda e a razão jurídica

É provável que os juízes da Relação de Coimbra estejam dentro da razão jurídica. É provável que a sua palavra seja a mais pura interpretação da lei. É provável que o edifício jurídico se sinta descansado com o douto acórdão. A verdade, porém, é que a pequena Esmeralda, seja qual for o desfecho, já perdeu e perdeu num caso onde ela é parte passiva. O que este caso mostra é que a própria razão, neste caso a razão jurídica, pode ser habitada pela irracionalidade e que a força da razão pode ser contrária à própria razão. Onde reside essa irracionalidade? No facto do conhecimento jurídico ser meramente provável, mas a coacção que impõe ser absoluta.

Luz da Normandia - IV

26/09/07

Raiz de Maio - III Orlam os teus seios de luz

Orlam os teus seios de luz
os impérios do vento e da noite.
E se pela manhã tudo empalidece
é a névoa que pelos dedos
ainda em furor acontece.

Jorge Carreira Maia, A Raiz de Maio (1993)

Música às quartas - 12 Brad Mehldau - Introducing

Recuemos ao ano de 1995 para ouvir uma criação de um dos grandes pianistas de Jazz norte-americanos, Brad Mehldau. Nasceu em 1970 e começou a tocar piano aos 6 anos. Fez formação em piano clássico até aos 14, enveredando depois pelo Jazz. Na música de Mehldau, pelo menos na inicial, nota-se a influência de Bill Evans.

O CD escolhido é Introducing, editado pela Warner e é composto por 5 standards, entre ele Countdown, de John Coltrane, e Prelude to a Kiss, de Duke Ellington, e quatro originais do próprio pianista.

Neste disco, participam ainda dois bateristas, Brian Blade e Jordi Rossy, e dois baixos, Larry Grenadier e Christian McBride.

No vídeo, temos uma versão, que não a do CD, do original de Mehldau, London Blues. Com Jordi Rossy e Larry Grenadier



Brad Mehldau - London blues
Colocado por MrDrive

Um coro de primas-donnas

O PSD é o espelho da elite política portuguesa e aquilo que agora todos vemos por ali é o que acontece, de forma mais ou menos velada, nos outros partidos, talvez com a exclusão do PCP, onde tudo é mais dissimulado e decantado (oitenta anos sempre são oitenta anos). Nada de real separa Mendes de Menezes. Talvez Mendes seja ligeiramente mais sólido do que Menezes. Este, porém, julga-se carismático, como Sócrates se julga detentor de autoridade ou Portas de inteligência. No fundo, a política portuguesa, da esquerda à direita, é composta por um coro de primas-donas, o que, como se sabe, é uma contradição nos termos. Chilreiam muito, mas na cabeça apenas existe o vácuo.

Luz da Normandia - III

25/09/07

Raiz de Maio - II Como uma raiz, as mãos

Como uma raiz, as mãos
enterravam-se no alvoroço dos bolsos:
ali trazia pedras, ervas,
cordéis e pássaros mortos.

Das mãos voavam,
se lhes incendiava as asas,
se lhes afagava os pescoços.

Jorge Carreira Maia, A Raiz de Maio (1993)

Homossexuais no Irão

Claro que não, no Irão não há homossexuais como nos Estados Unidos. Os homossexuais que há no Irão são muito diferentes daqueles que existem nos EUA. Aliás nem se pode bem chamar-lhes homossexuais. Eles são como se fossem homossexuais, mas não o são. Escusam de sugerir que eles são gays, eles também o não são. Gays são os homossexuais que há nos EUA. Se soubesse iraniano saberia dizer qual o tipo de homossexuais que há por lá e são esses, que não são gays, nem maricas, nem homossexuais, que no Irão são perseguidos. Se eles fossem gays, ninguém por certo lá os perseguiria. Bravo, camarada Ahmadinejad.


Estado Civil de Pedro Mexia

Comecemos por uma falta imperdoável: nunca li qualquer livro de poesia de Pedro Mexia. E tenho a certeza que isto é uma perda real. Como o poderei saber, se nunca o li? Não tanto pelas referências críticas, mas pela leitura do seu blogue Estado Civil. Não trata de poesia. É um blogue de pequenos apontamentos pessoais, muitas vezes comentários triviais, outras reflexões em aparência despretensiosas. Há sempre, porém, uma experiência onde o sujeito se ri do mundo e de si mesmo e nesse rir há uma revelação do real, como por exemplo neste post intitulado Flexissegurança: “Que um homem deve ser «seguro». OK, não discuto com a jurisprudência. Mas ao menos que os homens tenham a flexibilidade de perceberam que são uns patetas. A segurança pura e simples é uma ilusão. Ao menos um bocadinho de flexissegurança.”

É por tudo isto que julgo estar a perder um grande poeta. Seja como for, aqui fica a referência de um dos meus blogues preferidos e a promessa a mim mesmo que quando for a Lisboa compro os livros de poesia do autor, os que encontrar.

Santana Castilho - "Quando tudo é permitido e nada acontece"

Mais do que mais uma consentida oportunidade para a ministra retomar o discurso plastificado, que conhecemos sobejamente, teríamos apreciado uma intervenção jornalística preparada e inteligente para a confrontar com o imenso contraditório a que nunca responde, senão com a demagogia que lhe toleram. Um exemplo? É aceitável que passe sem imediata correcção a afirmação falsa da ministra quando referiu, a propósito do desemprego dos professores, que nas duas últimas décadas se perdeu meio milhão de estudantes no primeiro ciclo do ensino básico, quando as estatísticas oficiais, que ela bem conhece, situam esse número nos 328.022 alunos? Outro exemplo? Em determinada altura, a ministra acusou os sindicatos de estarem contra uma série de medidas de política educativa, significativamente as mais populistas. Mário Nogueira, de forma incisiva, desmentiu, uma a uma, as afirmações de Lurdes Rodrigues. Para o telespectador seria expectável que esta diametral oposição fosse esclarecida. Mas a ministra arrumou a questão, cara lívida de ódio, com um "não tenho nada a dizer". E o programa prosseguiu como se o que aconteceu fosse de somenos e não merecesse aprofundamento e esclarecimento. [Público, 25 de Setembro de 2007]
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Eu não sou um particular adepto da FENPRPF ou de qualquer outros sindicato dos professores, mas reparei muito bem naquilo que o professor Santana Castilho também reparou: na clareza com que Mário Nogueira desmentiu as atoardas que foram postas a correr sobre as posições dos professores e dos sindicatos sobre algumas das medidas do Ministério da Educação. Reparei, ainda, na «cara lívida de ódio» e no «"não tenho nada a dizer"» da senhora Ministra. Mas reparei também na forma como a comunicação social e a sociedade civil está disposta a sacrificar os professores portugueses. É esta a verdadeira força da senhora Ministra. Mas esta força é a mesma que, no tempo de Salazar, fez com que a escolaridade obrigatória passasse de 4 para 3 anos. Quem está nas escolas sabe muito bem o esforço que é necessário para ensinar a uma quantidade incalculável de alunos que não quer aprender, mas é sem surpresa que assiste ao sacrifício público do professorado às mãos de elites de 3.ª e de demagogos sem princípios. No fundo, a única coisa importante é que se salvaguardem os alunos que frequentam os bons colégios de Lisboa e Porto. O resto é para fazer de conta.

Luz da Normandia - II

24/09/07

Raiz de Maio - I A planície debruada pela luz

A planície debruada pela luz
fulgura no abismo da tarde,
canta na sombra desolada
o vento que sopra e logo passa.

Ao longe desesperam os sinos,
barcos azuis no rio do silêncio,
mas o bronze desvanece-se
entre casas brancas e velhos quintais.

Jorge Carreira Maia, A Raiz de Maio (1993)

De Alberto Caeiro a Raiz de Maio

Ontem terminou um ciclo dedicado a Alberto Caeiro. Começa hoje um ciclo de seis poemas, da autoria deste blogger, denominado "Raiz de Maio".

Agora até querem conduzir…

Aquelas gentes exageram. Então não fizeram uma petição ao rei Abdulah, da Arábia Saudita, para que as mulheres sejam autorizadas a conduzir (cf. JN). Deixar as mulheres conduzir? Mas onde querem eles chegar? Cá para mim, tudo isto é uma conspiração dos machos sauditas. Como podem eles dizer, quando vêm uma manobra rodoviária menos ortodoxa, “vê-se mesmo que é uma gaja, porra [isto não está nos hábitos esmerados de educação que recebi, mas quando se trata de carros…], saiu-lhe a carta na farinha amparo!”?

Rititi e a lobotomização

Já falei aqui no blogue Rititi – o Blogue Rosa Cueca. É um sítio a que se deve voltar com frequência. Se quer uma análise lúcida da pouca lucidez que atingiu as instituições modernas – privadas ou públicas –, então leia o post com o título 24. Protesta a blogger com a lobotomização a que está sujeita e depois descreve todo o lixo lexical (eficiência, produção, maximização de recurso, eficácia) que é soprado por pulmões que pertencem a cabeças que tendem para o vazio absoluto, digo eu. A formação deixou de ser uma necessidade, para se tornar uma triste moda, um slogan, cuja finalidade é estoirar com a parca vidinha das pessoas. Não há Jack Bauer que valha.

Da amizade Soares - Cavaco

Anda tudo muito admirado (uns indignados, outros embevecidos com tanto respeito democrático) com o convite que Soares foi fazer a Cavaco, por causa de uma reunião do petróleo organizada pela fundação do primeiro. Mas não foi esta fundação a primeira a dar a unção a Cavaco para ser Presidente? E a finalidade da candidatura de Soares não foi mesmo fazer eleger Cavaco e evitar as alegres tropelias de Alegre? Poupem o sermonear.

Militante de honra do PSD

Ali, pelas bandas do PSD, vai uma confusão que nem ao rabudo lembraria. O PS inventou aquela história das directas, o PSD, para não ficar atrás, também quis as suas directinhas para a presidência do partido, que as rosas não são mais democratas que as laranjas. Agora é um não mais acabar de confusões com quem pode e não pode votar, quem pagou as quotas, quem se esqueceu e quem se lembrou pelos que não se lembraram. O PSD mais parece um clube de futebol: quem não pagou as quotas não vê o jogo. O Eng.º Sócrates, esse nem precisa de as pagar, o PSD elevou-o a militante de honra e está a trabalhar para o reeleger por mais quatro anos. O pessoal do Rato agradece, desvanecido.

O estranho caso do diplomata que confundiu pickles com antrax

Cheio de gentileza, um diplomata iraquiano, por altura do Ramadão, decide enviar a um colega malaio um presente especial, pickles doces. O pior foi o malaio julgar que se tratava de guerra biológica e pensar que o frasco não passaria de uma embalagem de antrax. Foi o cabo dos trabalhos, com pedidos diplomáticos de desculpas à mistura e tudo. Os tempos são de trevas, o mundo anda perturbado e o medo não é bom conselheiro. (Ler tudo no Sol)

Maddie e o detective

Consta que os McCann contrataram, desde Maio, uma empresa de detectives. Não confiavam na judiciária portuguesa, adianta a Lusa. Seja qual for a posição real do casal perante o desaparecimento da filha, uma coisa é certa: a polícia portuguesa parece um bando de anjinhos perante tanta iniciativa dos médicos ingleses. E aquilo que parece…

Luz da Normandia - I


23/09/07

Alberto Caeiro - O Guardador de Rebanhos I

Eu nunca guardei rebanhos,
Mas é como se os guardasse.
Minha alma é como um pastor,
Conhece o vento e o sol
E anda pela mão das Estações
A seguir e a olhar.
Toda a paz da Natureza sem gente
Vem sentar-se a meu lado.
Mas eu fico triste como um pôr de Sol
Para a nossa imaginação,
Quando esfria no fundo da planície
E se sente a noite entrada
Como uma borboleta pela janela.

Mas a minha tristeza é sossego
Porque é natural e justa
E é o que deve estar na alma
Quando já pensa que existe
E as mãos colhem flores sem ela dar por isso.

Como um ruído de chocalhos
Para além da curva da estrada,
Os meus pensamentos são contentes.
Só tenho pena de saber que eles são contentes,
Porque, se o não soubesse,
Em vez de serem contentes e tristes,
Seriam alegres e contentes.

Pensar incomoda como andar à chuva
Quando o vento cresce e parece que chove mais.

Não tenho ambições nem desejos
Ser poeta não é uma ambição minha
É a minha maneira de estar sozinho.

E se desejo às vezes
Por imaginar, ser cordeirinho
(Ou ser o rebanho todo
Para andar espalhado por toda a encosta
A ser muita coisa feliz ao mesmo tempo),
É só porque sinto o que escrevo ao pôr do Sol,
Ou quando uma nuvem passa a mão por cima da luz
E corre um silêncio pela erva fora.

Quando me sento a escrever versos
Ou, passeando pelos caminhos ou pelos atalhos,
Escrevo versos num papel que está no meu pensamento,
Sinto um cajado nas mãos
E vejo um recorte de mim
No cimo dum outeiro,
Olhando para o meu rebanho e vendo as minhas ideias,
Ou olhando para as minhas ideias e vendo o meu rebanho,
E sorrindo vagamente como quem não compreende o que se diz
E quer fingir que compreende.

Saúdo todos os que me lerem,
Tirando-lhes o chapéu largo
Quando me vêem à minha porta
Mal a diligência levanta no cimo do outeiro.
Saúdo-os e desejo-lhes sol,
E chuva, quando a chuva é precisa,
E que as suas casas tenham
Ao pé duma janela aberta
Uma cadeira predilecta
Onde se sentem, lendo os meus versos.
E ao lerem os meus versos pensem
Que sou qualquer coisa natural —
Por exemplo, a árvore antiga sombra da qual quando crianças
Se sentavam com um baque, cansados de brincar,
E limpavam o suor da testa quente
Com a manga do bibe riscado.

Alberto Caeiro, O Guardador de Rebanhos

Alexandre del Valle - 'La democracia frente al terrorismo'

Mão anónima fez chegar a este blogue o link de um vídeo de uma conferência do geopolitólogo francês, julgo que de origem argentina, Alexandre del Valle (para ver clicar aqui). Uma explicação clara do que está por detrás dos movimentos islamistas, radicais ou moderados. Para meditar, fundamentalmente por certa esquerda que, no seu ódio à tradição ocidental, objectivamente propõe uma capitulação perante o Islão. Para consultar o blogue de Alexandre del Valle clicar aqui.

Mendes e Menezes

Ando há tempos para escrever sobre essa intérmina eleição que opõe, dentro do partido mais português de Portugal, o PSD, Luís Mendes a Luís Menezes. A verdade é que não me ocorre nada. Eu bem quero ajudar algum leitor que vá votar, mas a única diferença absoluta e abissal entre os Luíses é que Mendes é do Benfica e Menezes, do Sporting. Espero que faça alguma diferença.

Espaço Público - XI

22/09/07

Alberto Caeiro - O Guardador de Rebanhos XI

Aquela senhora tem um piano
Que é agradável mas não é o correr dos rios
Nem o murmúrio que as árvores fazem...

Para que é preciso ter um piano?
O melhor é ter ouvidos
E amar a Natureza.

Alberto Caeiro, O Guardador de Rebanhos

Karajan - Beethoven Symphony No. 7

Celebrar Missa



Os padres deveriam celebrar Missa como Karajan dirigia a Filarmónica de Berlim.

Crónicas Normandas I - Crateras e destroços (Point du Hoc Ranger Memorial)

O mar ao fundo, não o de esmeralda da nossa costa, mas um mar de cinza e névoa, a lembrar, por instantes, o betão. O vento frio bate nas faces e há à minha frente um campo imenso de destroços e crateras. Um lugar quase inacessível a quem vem do mar, impossível de tomar, pensavam os alemães. Passados mais de 60 anos, a razão tenta adoçar o espaço, torná-lo visitável, recuperá-lo, em forma de memorial, para o turismo, para o insólito turismo de guerra.

Aproximo-me da falésia e espreito a praia, as águas escuras do mar normando e imagino o desembarque dos homens lá em baixo, 225 Rangers norte-americanos, e penso nos homens cá em cima. Tudo está já demasiado civilizado para se perceber a natureza militar da operação, o fogo dos alemães sobre os americanos, estes a escalar a falésia, aqueles sob o bombardeamento da aviação aliada. A respiração quase se suspende e caminho, vou campo fora. Aquilo não foi um filme. Os homens bateram-se até à morte, até à suspensão da respiração, ao explodir das entranhas. É um campo de crateras, vestígios dos bombardeamentos da aviação, um mapa lunar, como o imaginamos a partir dos nossos sonhos mais nocturnos. Estranhas covas cobertas de erva e, sabe-se lá por quê, atravessadas ao centro por um carreiro, como se os transeuntes seguissem os caminhos de uma geografia sagrada, pontuada por estações onde os crentes descem para se recolher no sítio onde a bomba explodiu. Lugares de hierofania, penso.

Entre crateras, há ruínas das instalações militares alemãs, bunkers destruídos pela força das bombas. Quantos alemães ali teriam morrido? Não digo nazis, custa-me, perante o espectáculo, pensar aqueles soldados como nazis. Quantos dos que aqui morreram seriam mais novos do que os meus filhos? O cimento armado permanece em silêncio. Sim, em silêncio, pois o memorial canta a glória dos Rangers vitoriosos. Inclino-me perante o feito desses homens, mas como poderei esquecer os outros, os que retrospectivamente sei que eram meus inimigos. Tinham corpo e alma como eu, e espírito e desejos e fantasias como eu. Vieram ali para morrer. No meu coração há um eterno reconhecimento aos americanos, mas que homem serei se esquecer os derrotados?

Fogo e aço terão caído por todo o lado. Um corpo dilacerado, um corpo incendiado, que diferença fará a língua que falou. A morte caiu sobre ele e roubou-o à glória dos dias. Olho a praia e o meu coração treme, é uma praia ambígua feita de luz e trevas. A luz normanda que incendiou a imaginação dos impressionistas e as trevas que habitam o coração desesperado dos homens. Lá em baixo há mar e areia e gaivotas. Não vejo homens, apenas as sombras do passado se erguem e estendem-me a mão. Oiço-as surpreso, estás aqui, dizem-me, porque morremos para que viesses. Olham-me com gratidão, toda a gratidão que lhes devo.

Vasco Pulido Valente - Uma vitória estratégica

A guerra de civilizações, que a "inteligência" ocidental persiste em pretender que não existe, entrou numa nova fase. Anteontem, o número 2 da Al-Qaeda, al-Zawahiri, proclamou que a "mais poderosa potência da humanidade está a ser derrotada pelas vanguardas muçulmanas da jihad" no Iraque e no Afeganistão. E está. Do Iraque, não vale a pena falar. No Afeganistão, de que pouco se fala, os produtores de ópio continuam a mandar e os taliban empurraram as forças da "Europa" e da América para uma posição mais do que precária. Pior ainda, a opinião pública já dá toda a aventura por perdida e só pensa em acabar com ela. O sucessor de Bush terá, tarde ou cedo, de sair do Iraque e, sem o Iraque, a presença de uns milhares de soldados no Afeganistão não serve de nada.

Esta vitória, uma vitória estratégica e não simplesmente táctica, fez passar a Al-Qaeda, como, de resto, é clássico, da defensiva para a ofensiva. Em primeiro lugar, contra o Paquistão, a única potência nuclear islâmica. Anteontem, solenemente, Bin Laden "declarou guerra" ao general Musharraf e ao "exército apóstata" que ele comanda. Vinda de um homem que vive escondido numa caverna, a declaração parece ridícula. Não é. Musharraf representa a odiada aliança americana, Bin Laden o ódio absoluto ao infiel; e a popularidade de Bin Laden excede hoje, no próprio Paquistão, a popularidade de Musharraf. Em véspera de eleições, o anátema da Al-Qaeda "marca" o general e talvez consiga impedir a formação de um Governo suficientemente forte para apoiar a América.

Depois do Paquistão, a Al-Qaeda também quer o Magrebe "limpo dos filhos da Espanha e da França". Não há, neste momento, muitos filhos da Espanha e da França no Magrebe, mas mesmo esses não são toleráveis para al-Zawahiri. Nem os filhos, por assim dizer, espirituais do Ocidente, que sustentam o Estado "laico" ou "semilaico", na Líbia, na Tunísia, na Argélia e em Marrocos. Contra esses, guerra santa. E guerra santa, enfim, contra os presentes proprietários do al-Andalus, por outras palavras, contra Portugal e a Espanha. Quem achar isto retórica, que se lembre de Madrid em 2004. Os políticos que se dedicam a louvar e a mimar os "moderados" do islão não percebem uma realidade básica: o extremismo é o único caminho para uma civilização falhada e o extremismo ganha. [Público, 22 de Setembro de 2007]
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Na passada 5.ª feira fez-se, neste blogue, um post sobre este mesmo assunto, focado fundamentalmente na questão da reconstrução do al-Andalus. Há muitos anos que esta questão me preocupa e perturba. Recordo-me de um insignificante episódio ocorrido há cerca de 20 anos na minha escola. Estava-se na euforia da entrada para a CEE e fez-se umas sessões sobre a Europa. Numa delas, fiz uma "conferência" sobre a Europa e a Filosofia. No fim, naquela conversa mole que acaba por ocorrer, afirmei a minha convicção de que Portugal deveria reforçar as suas forças armadas e a sua pertença à NATO. A mentalidade de esquerda ou pacifista reinante em muitos dos meus colegas fê-los olhar para mim com desprezo. Argumentaram que Portugal vivia num mundo seguro e que as nossas fronteiras eram absolutamente pacíficas. Respondi que não, que as fronteiras do Sul, isto é, com o mundo islâmico estavam longe de ser tão pacíficas quanto se imaginava. Olharam para mim com infinita piedade. Os olhos de alguns reflectiam a sua convicção de eu me encontrar em avançado estado de decomposição mental.

Não estava. Desde a Revolução iraniana que o mundo islâmico me interessa e desde, pelo menos, o início dos anos 80, ainda o mundo vivia em plena guerra-fria, que venho a "coleccionar" sintomas de um conflito que não nos deixa a nós, portugueses, de fora, pelo contrário. Há muito que sei da existência, em Marrocos, de sectores radicais que reivindicam o al-Andalus. Escrevo, no Jornal Torrejano, sobre a ameaça islâmica há já alguns anos. Mas eu sou eu. Agora que é o Vasco Pulido Valente a chamar a atenção para o problema, a coisa talvez comece a ser levada em consideração. Embora, a tendência seja a de enterrar a cabeça na areia, assobiar para o lado e fingir que não se está a passar nada. Está, e não é nada agradável o que lentamente se prepara.

Espaço Público - X

21/09/07

Alberto Caeiro - O Pastor Amoroso: "O pastor amoroso perdeu o cajado"

O pastor amoroso perdeu o cajado,
E as ovelhas tresmalharam-se pela encosta,
E, de tanto pensar, nem tocou a flauta que trouxe para tocar.
Ninguém lhe apareceu ou desapareceu. Nunca mais encontrou o cajado.
Outros, praguejando contra ele, recolheram-lhe as ovelhas.
Ninguém o tinha amado, afinal.

Quando se ergueu da encosta e da verdade falsa, viu tudo:
Os grandes vales cheios dos mesmos verdes de sempre,
As grandes montanhas longe, mais reais que qualquer sentimento,
A realidade toda, com o céu e o ar e os campos que existem, estão presentes.
(E de novo o ar, que lhe faltara tanto tempo, lhe entrou fresco nos pulmões)
E sentiu que de novo o ar lhe abria, mas com dor, uma liberdade no peito.

Alberto Caeiro, O Pastor Amoroso

Carla Bruni - Le toi du moi

Elevemos o nível e o interesse deste insípido blogue. Deixemo-nos de coisas sérias e voltemos para o essencial. Por uma luz vinda do céu, e do céu só vêm coisas boas, sejam luzes, sejam outras coisas, iluminou-se-me o cérebro com este nome. Digito-o no YouTube e lá aparece o que aqui deixo. Mas quem quiser apreciar a qualidade vocal da artista clique aqui e veja o vídeo. Há quem goste, há quem não goste. Eu recomendo.

Israel, a Síria e o mais que está para vir

O ataque israelita a instalações sírias (ver, por exemplo, o Guardian), fornece mais um traço do grande problema que é o médio-oriente. Se for verdade que os israelitas atacaram instalações nucleares, então o problema para o mundo ocidental engrossa. Não basta já o problema nuclear iraniano, agora há que considerar os silenciosos desejos dos sírios. Todas estas veleidades nascem de duas “vitórias” americanas: a destruição da União Soviética e a intervenção no Iraque. Com a primeira, ficou à deriva uma parte do arsenal nuclear soviético. Com a segunda, os americanos ataram-se de pés e mãos perante os lugares de onde vem realmente o perigo. No médio-oriente há muita gente a trabalhar para o armagedão.

O caso Maddie e Coleridge

Como numa narrativa literária, chegou a altura de introduzir um efeito surpresa. Parece que alguém se lembrou, agora, de ter visto, na altura, um homem misterioso a vaguear por aqueles sítios com o que parecia ser uma criança (ver o Sol). Isto faz-me lembrar a explicação que Coleridge dá para o facto de os seres humanos lerem histórias de ficção. Fazem-no porque suspendem a descrença.

Música para o fim-de-semana: Terje Rypdal - Lux Aeterna

O CD seleccionado para este fim-de-semana provém do inesgotável fundo que é a editora ECM. Como todos os CD dessa casa, este tem uma apresentação estética esmerada, o que o torna quase um objecto de culto e de colecção. Mas não é isso que aqui interessa.

Terje Rypdal é um músico com uma formação clássica na área do piano, mas que se tornou numa espécie de autodidacta na área da guitarra, influenciado por Jimi Hendrix. Improvisador, combina os estilos da new age, do rock e do jazz.

Lux Aeterna é uma peça em cinco movimentos (1. Luminous Galaxy; 2. Fjelldåpen; 3. Escalator; 4. Toccata; 5. Lux Aeterna), onde a música erudita e o jazz se contaminam. A obra, segundo informação constante do booklet, foi encomendada pelo Molde Jazz Festival para celebrar o magnífico órgão recentemente instalado na igreja de Molde.

Terje Rypdal, na guitarra, é acompanhado por Palle Mikkelborg, trompete, Iver Kleive, órgão. O Bergen Chamber Ensemble é dirigido por Kjell Seim. Participa ainda a soprano Åshild Stubø Gundersen. O CD, gravado ao vivo no Molde Jazz Festival de 2000, foi editado em 2002.

No vídeo, Terje Rypdal toca em trio uma composição que nada tem a ver com Lux Aeterna, podem crer, mas é o que estava à mão.


Jornal Torrejano, 21 de Setembro de 2007

Já on-line está a edição semanal do Jornal Torrejano. Na primeira página, referência para a reportagem com um «velho» barbeiro riachense. Para além da cadeira do barbeiro, refira-se também a Mostra gastronómica na Golegã, e a performance (isto é que é ser moderno) do Desportivo de Torres Novas.

Na famigerada opinião, há um nunca mais acabar de possibilidades. Hélder Dias ataca com o seu cartoon. José Ricardo Costa escreve O Milagre, Santana-Maia Leonardo, A Colheita, Miguel Sentieiro, Quando os homens também choram [ó Miguel, podias ter titulado Quando os lobos uivam], José Trincão Marques regressa com Geodiversidade, Carlos Henriques escreve O cabelinho, Vítor Lúcio Freire, Os jornais “desportivos” em Portugal e o autor deste blogue, Sobre o pessimismo.

Aqui fica a notícia das notícias. Quem mais quiser saber, só tem de clicar em Jornal Torrejano ou então comprar o jornal cá da terra e nunca esquecer o profundo pensamento heideggariano: quanto mais particular, mais universal, ou coisa que o valha. Então, se a isso o destino permitir, até para a semana.

Espaço Público - IX

20/09/07

Alberto Caeiro - Poemas Inconjuntos: “A noite desce, o calor...”

A noite desce, o calor soçobra um pouco.
Estou lúcido como se nunca tivesse pensado
E tivesse raiz, ligação directa com a terra
Não esta espécie de ligação de sentido secundário observado à noite.
À noite quando me separo das coisas,
E m'aproximo das estrelas ou constelações distantes -
Erro: porque o distante não é o próximo,
E aproximá-lo é enganar-me.

Alberto Caeiro, Poemas Inconjuntos

A reconstrução do Al-Andalus

Contrariamente ao que se pode pensar, Espanha e Portugal estão longe de ser territórios fora do conflito que opõe os radicais islâmicos ao mundo ocidental. O último vídeo do n.º 2 da Al-Qaeda (ler aqui) é claro sobre o assunto: expulse-se espanhóis e franceses do norte de África, primeiro passo para a reconstrução do Al-Andalus. Não se pense que o que está em causa é a mera Andaluzia. O que está em causa, na mente delirante dos ideólogos islamistas radicais, é a reocupação dos territórios peninsulares que um dia foram ocupados pelos muçulmanos. Uma brincadeira? Talvez, mas se Marrocos e a Argélia caírem em mãos de radicais, a coisa muda de figura. As nossas fronteiras do Sul estão longe de ser um lugar de paz.

Portugal, EUA e Iraque

Leio no Público on-line que PCP e BE exigem retirada total de portugueses do Iraque e acusam Sócrates de se encolher perante Bush. Se a invasão do Iraque por Bush e Blair pode ter-me causado algumas perplexidades, houve uma coisa que nunca me deixou dúvidas: a posição portuguesa. Portugal só podia apoiar o que os americanos decidissem. Era escusado o espalhafato que Durão Barroso, à boa maneira MRPP, fez, mas, contrariamente aos EUA, Portugal não tinha alternativa. É o preço que pagamos pela nossa dimensão e pela nossa independência. O resto é demagogia.

O recurso de Scolari

Compreendo que uma pessoa, no meio das emoções de um jogo de futebol, possa dar um soco num adversário. Acontece. O que não compreendo é que se recorra fria e racionalmente de um castigo que acaba por ser benévolo. Quatro jogos de suspensão e 12 000 € de multa não parecem pena grande pelo triste espectáculo dado e pelas responsabilidades universais de Scolari.

Espaço Público - VIII

19/09/07

Alberto Caeiro - Poemas Inconjuntos: “Tu, místico, vês...”

Tu, místico, vês uma significação em todas as coisas.
Para ti tudo tem um sentido velado.
Há uma coisa oculta em cada coisa que vês.
O que vês, vê-lo sempre para veres outra coisa.

Para mim, graças a ter olhos só para ver,
Eu vejo ausência de significação em todas as coisas;
Vejo-o e amo-me, porque ser uma coisa é não significar nada.
Ser uma coisa é não ser susceptível de interpretação.

Alberto Caeiro, Poemas Inconjuntos

Barbárie doce ou desrazão?

Nunca uma sociedade dispôs de tanta informação sobre si mesma, nunca uma sociedade fez até à exaustão o culto da performance em todos os domínios de actividade. Nunca os indivíduos foram tão avaliados e solicitados a comprometerem-se em projectos personalizados e a «projectar-se positivamente no futuro». Isto passa-se no momento mesmo em que a sociedade parece já não estar certa de saber para onde vai. Esta auscultação permanente e o culto da performance mascaram uma surda angústia face a questões que não se podem apagar: «a modernização serve para quê? A que preço, do ponto de vista dos ‘adquiridos’ sociais e das finalidades do ‘viver-juntos’? Para ir para que tipo de sociedade? [Jean-Pierre Le Goff, La barbárie douce]

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A reflexividade exaustiva do mundo contemporâneo, este constante escrutínio sobre tudo e sobre todos, a paranóia da avaliação contínua, são a confissão da impotência fundamental que as nossas sociedades sentem perante a realidade em geral, e a realidade humana, em particular. A imprevisibilidade da natureza e a falibilidade humana são inaceitáveis para uma consciência que se quer proprietária do real e de si mesma.

Como o controlo total da natureza é impossível, como a falibilidade dos homens é inultrapassável, resta apenas transformar a vida em sociedade num campo de concentração. Instituições públicas e privadas, onde os homens trabalham, são, hoje em dia, não a expressão da razão, mas de uma loucura cada vez menos dissimulada. Um exemplo a partir da minha experiência profissional: não é importante que um professor ensine, importante são os processos organizacionais das escolas, as avaliações a tudo e a todos, a criação de estruturas burocráticas que servem apenas para criar um clima de asfixia dos indivíduos e de morte das comunidades.

Jean-Pierre Le Goff fala de barbárie doce. É um facto que a violência física está muito dissimulada, mas a simbólica é crescente e está escorada, como todos sabemos, na violência física. Ora esta barbárie é fundamentalmente um estado paranóico em que vivemos. As actividades humanas perderam o sentido e a dimensão próprias do homem. O que se quer são performances dignas de deuses ou de super-homens. Note-se o papel modelar que constituem socialmente os atletas de alta competição, como se não fossem todos eles produtos artificiais e puras excepções. Peguemos nesta metáfora e expliquemos o que se está a viver: a vida dos homens, nos diversos campos de actividade, é regulada por um imperativo de desempenho que se poderia analogar à situação em que todos nós, novos e velhos, gordos e magros, homens e mulheres, fôssemos obrigados a correr os 100 metros em 9,75 segundos. Isto apenas pode vir de gente que enlouqueceu. A barbárie doce é a pura desrazão, a loucura mais atroz, o suprimir do que há de humano na extraviada humanidade, a produção exaustiva da irrelevância na vida das sociedades modernas.

Da idiotia do encómio

Um encómio idiota que certa gente de cultura democrática faz a Aquilino Ribeiro é o que sublinha a opinião de Salazar, que o achava um detestável oposicionista mas um grande escritor. Desde quando a opinião de Salazar sobre a literatura tem qualquer valor?

Aquilino Ribeiro e o panteão

É curiosa a reacção de certa direita, na blogosfera, à trasladação dos restos mortais de Aquilino Ribeiro para o Panteão Nacional. Espuma e esbraceja por tudo o que é blogue direitista e monárquico. Funda-se na obra de Rui Ramos sobre D. Carlos para ver em Aquilino o braço invisível que estaria do lado de Alfredo Costa e de Manuel Buiça, os regicidas. Há uma incapacidade democrática essencial: aceitar que as gentes de esquerda são tão portugueses como os de direita. Na verdade, o que muita dessa gente odeia, apesar de se dizer liberal, é a liberdade e Aquilino Ribeiro bateu-se por ela. O que é imperdoável. Há em Portugal uma fractura ainda longe de estar cerzida.

Espaço Público - VII


18/09/07

Alberto Caeiro - O Guardador de Rebanhos XLII

Passou a diligência pela estrada, e foi-se;
E a estrada não ficou mais bela, nem sequer mais feia.
Assim é a acção humana pelo mundo fora.
Nada tiramos e nada pomos; passamos e esquecemos;
E o Sol é sempre pontual todos os dias

Alberto Caeiro, O Guardador de Rebanhos

O jogging de Sócrates

Tinha vontade de comentar o jogging de Sócrates em Washington. Falece-me, porém, a força para tal. Resta-me apenas um rubor na face: é de vergonha por Portugal, com quase 900 anos, permitir este tipo de piroseiras.

O código penal e a paz social

A justiça é a instituição pública que tem por finalidade assegurar a paz social. Não se compreende como é que a introdução de uma reforma do código do processo penal possa gerar o burburinho que existe hoje em dia. Como noutras áreas, o governo não se preocupou com pormenores. Assim, aquilo que deveria ser o sustentáculo último da paz social é motivo de disputas públicas entre instituições. Os cidadãos não percebem o que se passa, mas sentem que se está perante mais uma grande trapalhada. Se fosse no tempo de Santana Lopes, o que o PS não diria. Talvez não ficasse mal ao governo alguma humildade perante o problema.

Actualité de Hannah Arendt

Hoje dois blogues em francês dedicados à grande pensadora Hannah Arendt. São complementares, estes blogues e pertencem ao mesmo autor: Thierry Ternisien d’Ouville. Os nomes explicam a essência da coisa: Actualité de Hannah Arendt, e que tem a seguinte epígrafe: «Identification, par l'étude d'Hannah Arendt, de chemins pour sortir du carcan de la raison économique et de la pensée binaire.»; Comprendre, agir et penser avec Hannah Arendt et …, com a epígrafe: «Apprenons à fréquenter l’oeuvre d’Hannah Arendt». Os títulos e as epígrafes explicam o programa do blogue. Quem se interessar pelo pensamento político, quem quiser encontrar vias para além do dualismo liberal/marxista, encontra aqui um primeiro passo, quase militante, para a obra da filósofa alemã, de origem judia. Um dos grande vultos intelectuais do século passado.

Espaço Público - VI

17/09/07

Alberto Caeiro - O Guardador de Rebanhos XXVII

Só a Natureza é divina, e ela não é divina...

Se falo dela como de um ente
É que para falar dela preciso usar da linguagem dos homens
Que dá personalidade às coisas,
E impõe nome às coisas.
Mas as coisas não têm nome nem personalidade:
Existem, e o céu é grande a terra larga,
E o nosso coração do tamanho de um punho fechado...

Bendito seja eu por tudo quanto sei.
Gozo tudo isso como quem sabe que há o Sol.

Alberto Caeiro, O Guardador de Rebanhos

Maracanazos

Maracanazo, segundo nuestros hermanos, é o termo que designa a derrota inesperada na final da equipa organizadora de um torneio. O termo liga-se à derrota, por 2 – 1, do Brasil, em 1950, na final do Campeonato do Mundo contra o Uruguai, no Maracanã. Os espanhóis também tiveram ontem o seu maracanazozito no basquetebol, contra a Rússia. Para ver fotos de 10 maracanazos, entre eles, o de Portugal perante a Grécia, clicar aqui.