25/04/09

História narrativa



Em consequência da Segunda Guerra Mundial, a perspectiva que a Europa oferecia era de miséria e desolação. As fotografias e os documentários da época mostram torrentes deploráveis de civis desamparados, viajando em carroças através de paisagens bombardeadas, por cidades devastadas e campos áridos. Crianças órfãs vagueiam desoladas à frente de grupos de mulheres exaustas, vasculhando destroços de casas em ruínas. Deportados com as cabeças rapadas e internados em campos de concentração, vestindo pijamas às riscas, olham apaticamente para a câmara, esfomeados e doentes. Até mesmo os eléctricos, seguindo irregularmente ao longo das linhas danificadas, movidos por uma corrente eléctrica intermitente, parecem traumatizados pelos rebentamentos das granadas. Tudo e todos - com a notável excepção das bem alimentadas forças de ocupação aliadas - parecem gastos, sem recursos, exaustos.

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Este é o primeiro parágrafo do livro Capítulo I, Legado de Guerra, do livro Pós-Guerra - História da Europa desde 1945 (Ed. 70). Um belíssimo começo a fazer jus ao título da colecção, "História Narrativa". Talvez as análises marxianas e estruturais tenham sentido, mas a História para falar aos homens, para falar à dimensão histórica dos homens, não pode perder a sua natureza narrativa. Dizer a história dos homens é modelar o tempo, e este só se deixa aperceber através das intrigas onde se manifestou. Um livro cujo primeiro capítulo começa assim, não dá vontade de pôr de lado.

1 comentário:

José Ricardo Costa disse...

As análises marxianas e estruturais da História terão sentido de acordo com uma visão superficial. Mas não é aí que entendemos a História. Esta explica-se nos poemas homéricos, nos dramas de Shakespeare, nos romances de Balzac.

JR