No princípio
Começar, no silêncio da noite, o caminho. Deixar leves vestígios dos interesses que foram tomando conta de mim: a literatura, a filosofia, a música, a arte, a política, a educação, talvez o heimat, essa estranha palavra alemã que, em sua equivocidade, tanto pode significar a pátria, como a terra natal. Continuar a conversa que todas as semanas começa no Jornal Torrejano. Do jornal para o blogue, do blogue para o jornal, sinal de um tempo de contaminação, onde os lugares fixos se desfazem, as peças se desarticulam e os homens fingem que não são mortais. Um blogue, talvez como uma coluna de jornal, é um exercício de solidão, de uma solidão que se mostra, para melhor se resguardar, enquanto vai semeando palavras, disseminando ideias, afivelando a máscara que oculta o que não tem rosto. Deixar vestígios no tempo, marcas cadenciadas pelos dias e as horas, mesmo se o jogo é o da dissimulação, é um compromisso com o mal. Com o mal? Sim, o estranho matrimónio da escrita, mesmo a de um blogue, com o tempo é uma forma de aceitação deste. E este, o Tempo, é apenas, no dizer de Cioran, o pseudónimo que o mal para si tomou. Não há inocência quando as palavras se seguem umas às outras, pontuando as horas, os minutos e os segundos. Nesse momento, já Adão foi seduzido por Eva, e o labirinto que nos arrasta para morte começou a ser trilhado. Comecemos, então.
1 comentário:
"Comecemos, então".
E "no princípio"...
"Um blogue (...) é um exercício de solidão, de uma solidão que se mostra, para melhor se resguardar" - isso sei eu, por experiência, própria e alheia. Parecendo-me que a comparação com a coluna do jornal não é a melhor. O colunista é levado pelo jornal/revista para as bancas, cafés. Para casa das pessoas. Os 5, 15, 70 mil leitores do jornal/revista não o lêem (o colunista), mas conhecem-no. E o número dos que o lêem vai crescendo.
Já o blogger (dá mais jeito que bloguista... Hábitos) é um eremita (prefiro a anacoreta... que me faz lembrar o outro!) autêntico. Ou vão ter com ele, ou ele não se revela (mesmo que se anuncie).
Numa pessoa com as virtualidades - e a profundidade - do Jorge, o difícil é o começo. Porque depois... Espere e logo vê: não vai ter mãos a medir. Nem descanso.
Eu?
Ora eu continuo um eremita. Nem algum dia deixarei de o ser (em termos bloguísticos, claro).
Costumo dizer que eu não escrevo... Escrevinho. Convenhamos que é diferente.
Não obstante este começo solitário, auguro-lhe um futuro promissor. O êxito que suponho já ter como colunista.
Que bem merece.
Saravá, meu irmão!
JLF
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